Depois da hecatombe da Rússia, quando não passou da fase de grupos do Mundial pela primeira vez na história, a Alemanha surgia no Qatar com a vontade de mostrar que iniciou um novo capítulo com a saída de Joachim Löw e a escolha de Hansi Flick — o antigo adjunto que foi campeão do mundo em 2014 e que, oito anos depois, sonhava com um regresso alemão à glória.

O grupo não foi o mais simpático, com uma Espanha que irá sempre lutar pela liderança, um Japão muito característico e uma Costa Rica que pode sempre surpreender, mas esta é uma geração alemã que pretende voltar a ser uma potência europeia e mundial. Atualmente, contrariando uma lei que foi máxima ao longo de décadas, a Alemanha não ganha sempre que são 11 contra 11. E esse é um pormaior que fere o orgulho de um país inteiro.

Assim, esta quarta-feira e na estreia no Mundial, a Alemanha defrontava o Japão e procurava colocar desde logo alguma pressão sobre Espanha, que só defrontava a Costa Rica algumas horas mais tarde. Flick lançava um onze claramente ofensivo, com Gnabry, Musiala e Müller no apoio a Havertz e ainda deixava Adeyemi, Brandt e Sané no banco. Do outro lado, o leão Morita também começava como suplente depois de ter estado em dúvida, por motivos físicos, e o ex-Marítimo Maeda era a referência atacante da equipa de Hajime Moriyasu.

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Numa primeira parte de sentido único, que a Alemanha foi sempre melhor e sempre superior, uma grande penalidade de Gündoğan (33′) fez a diferença depois de Raum ser carregado em falta por Gonda na área japonesa. O Japão demonstrou capacidade para trocar a bola e chegou perto da baliza de Neuer já em cima do intervalo mas sempre de forma inconsequente, deixando como principal nota de destaque um lance ainda nos instantes iniciais em que Maeda marcou mas foi apanhado em fora de jogo (8′). Havertz também fez golo já no fim do primeiro tempo, num avolumar da vantagem que seria totalmente natural (45+4′), mas a jogada também não contou por posição irregular do avançado.

Moriyasu mexeu logo ao intervalo e trocou Kubo por Tomiyasu, reforçando a dinâmica defensiva, e a Alemanha poderia ter aumentado a vantagem logo nos primeiros minutos por intermédio de Gnabry (48′), Musiala (52′) ou Gündoğan (60′). Contudo, a partir da hora de jogo, a superioridade alemã esfumou-se e o Japão cresceu na partida para conquistar um ascendente que teria consequências práticas: Doan empatou ao desviar na sequência de uma defesa incompleta de Neuer a um remate de Minamimo (74′) e Asano, numa fase em que a equipa alemã já parecia algo desnorteada, atirou quase sem ângulo para carimbar a reviravolta (83′).

Assim, depois da derrota da Argentina com a Arábia Saudita, o Japão protagoniza a segunda grande surpresa do Mundial do Qatar e verga uma Alemanha que começa a ter a vida muito dificultada se os espanhóis vencerem os costa-riquenhos ainda esta quarta-feira. No fim, a seleção alemã começou de boca tapada, num protesto contra as violações da liberdade de expressão no país do Médio Oriente, e saiu sem piu.

A pérola

  • Nem poderia ser de outra maneira. Takuma Asano entrou para o lugar de Maeda à passagem da hora de jogo e assumiu o papel de figura maior da nação ao marcar um golo brilhante em que arrancou, aguentou a pressão e atirou quase sem ângulo para bater Neuer. Aos 28 anos, o avançado que atua precisamente na Alemanha e no Bochum é desde já uma das figuras do Mundial por ter proporcionado uma das principais surpresas da fase de grupos.

O joker

  • Entrou aos 73′, marcou aos 75′. Ritsu Doan, o jovem avançado do Friburgo, foi o primeiro herói japonês ao surgir no sítio certo à hora certa para fazer o empate depois de uma grande defesa de Neuer a remate de Minamino. Saltou do banco para fazer a diferença, potenciar o setor ofensivo japonês e dar eficácia a uma reação nipónica que, até aí, tinha caudal e fluxo atacante mas pecava na finalização e na busca por consequências.

A sentença

  • Sem que seja conhecido o resultado final da estreia de Espanha contra a Costa Rica mas antecipando-se uma provável vitória espanhola, a Alemanha colocou-se em caminhos apertados nas contas do apuramento para os oitavos de final. Mais: se os espanhóis derrotarem os costa-riquenhos e os alemães perderem com a Espanha já no próximo domingo, estão desde já afastados do Mundial do Qatar. Ou seja, são eliminados na fase de grupos de um Campeonato do Mundo pela segunda vez consecutiva.

A mentira

  • Ao contrário do que seria expectável — e até pelo que se viu na primeira parte, em que a Alemanha foi claramente superior –, esta seleção japonesa prima pela posse de bola e pelo ataque organizado e tem uma clarividência tática e estratégica acima da média. Nada é feito por acaso no Japão e todas as dinâmicas estão preparadas para que seja difícil sofrer golos e simples marcá-los. Contra os alemães, na segunda parte, tudo funcionou quase na perfeição.