A cimeira das Nações Unidas sobre biodiversidade (COP15) será positiva se for aprovada a proteção de 30% do planeta até 2030 e houver uma moratória da mineração em mar profundo, considera Ana Matias, da organização Sciaena.
A propósito da COP15, que teve uma primeira parte no ano passado na China e que se conclui em Montreal, no Canadá, de 7 a 19 de dezembro, Ana Matias disse à Lusa que há sempre “expectativas altas” sobre resultados, mas lamentou que neste tipo de conferências os oceanos fiquem quase sempre “em segundo plano”.
Ana Matias faz parte da Sciaena, uma associação ambientalista que defende a melhoria do ambiente marinho e formas de exploração dos oceanos que sejam sustentáveis, e por isso lamenta que para muitos decisores ainda não pareça claro que as crises climática e de biodiversidade não se podem separar do que se passa no mar.
O oceano e o clima têm “uma ligação muito, muito forte” e têm essencialmente sido feitos esforços em terra para resolver a crise climática, quando são os oceanos que têm absorvido muitos dos impactos dos humanos, diz.
“Apesar disso, os oceanos parecem postos de parte. Mas o relógio está a contar”, avisa Ana Matias, lembrando a poluição, a sobrepesca, a destruição de habitats, a acidificação, a perda de biomassa e o aquecimento como alguns dos problemas. E não se julgue, acrescenta, que os oceanos não se estejam a queixar.
“Não se vê diretamente o que se passa no oceano, e se for no mar profundo então ainda menos, mas o oceano tem dado muitas indicações de que as coisas estão a acontecer”, diz a ambientalista, afirmando que de alguma forma entende a pouca importância que se dá à perda de biodiversidade oceânica. “Não é fácil mobilizar-nos para algo que possa estar a acontecer no meio do Pacífico”.
Mas, não sendo fácil, é fundamental porque é o mar que tem absorvido grande parte do excesso de calor gerado pela atividade humana, porque é o mar “o amigo silencioso” que permite que em terra se tenha uma qualidade de vida aceitável, diz.
Por tudo isto, Ana Matias considera que da conferência de Montreal deve sair a decisão de proteger 30% do planeta, em terra e no mar, até 2030, sublinhando a importância de as áreas serem de facto eficazmente protegidas. E que tal não signifique, alerta também, que os outros 70% de superfície do planeta sejam sujeitos a “exploração selvagem”.
E a conferência deve ainda tomar outra decisão, que a Sciaena considera fundamental: “que seja dado um sinal muito forte quanto à mineração em mar profundo. É fundamental que seja dado um sinal claríssimo”.
A possibilidade de se começar a fazer mineração no fundo do mar na procura de metais raros, já admitida por países e empresas, está a suscitar preocupações, nomeadamente das organizações ambientalistas.
Ana Matias admite que não haja ameaças à biodiversidade tão grandes como a mineração em mar profundo, lembrando que alguns países se mostraram contra, assinando uma moratória até haver mais informação e acrescentando que Portugal deve dizer “por agora não”, o que ainda não aconteceu.
Sempre com esperança de que “a urgência se sobreponha aos interesses privados”, lamentando que as decisões sejam “demasiado lentas”, a ambientalista teme que o facto de não estar prevista a presença de qualquer líder mundial na COP15 seja “sintomático da falta de interesse e de sensibilidade para estas questões”.
“Tenho pena que Portugal, que tem em matéria de oceanos mais responsabilidade do que muitos outros países, não se faça representar ao mais alto nível”, afirmou.
A COP15 deve adotar um quadro global de proteção da biodiversidade pós-2020, com uma estratégia e um roteiro global de conservação, proteção, restauração e gestão sustentável da biodiversidade e dos ecossistemas para a próxima década.