O Presidente chinês, Xi Jinping, e vários outros altos quadros do Partido Comunista (PCC) prestaram esta terça-feira homenagem ao ex-líder Jiang Zemin, que morreu na semana passada, numa demonstração de unidade face ao crescente descontentamento popular.

Jiang Zemin morreu aos 96 anos. A sua liderança ficou marcada por reformas económicas e pela abertura da China ao exterior, que culminou com a adesão do país à Organização Mundial do Comércio e a vitória de Pequim na candidatura para acolher os Jogos Olímpicos de 2008. O ex-líder chinês era também uma figura exuberante, que tocava piano, cantava em público e falava inglês com entusiasmo, contrastando com a formalidade dos seus antecessores e sucessores.

Morreu o antigo Presidente chinês, Jiang Zemin, o rosto do “boom” económico da China

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Alguns chineses usaram a morte de Jiang Zemin para criticar Xi Jinping, que devolveu ao PCC o papel de líder político, económico e social da China, em detrimento do setor privado e sociedade civil – uma reversão da trajetória do país desde que, em 1978, o ex-líder Deng Xiaoping lançou o período de “reforma e abertura”, que foi cimentado por Jiang Zemin.

“Com a morte do “avô” Jiang foi-se a última esperança numa alteração do rumo político”, diz à agência Lusa uma chinesa natural de Pequim. “Quem é que aguenta isto por mais cinco anos”, questiona. “Estamos rapidamente a converter-nos numa espécie de Coreia do Norte”.

Xi Jinping sairá do Congresso do PCC com liderança reforçada e sem sucessor

Na rede social WeChat, internautas partilharam ligações para canções intituladas “Pena que não és tu” e “Não foi a pessoa certa”, após a morte de Jiang, numa referência a Xi Jinping.

Xi obteve, em outubro passado, um terceiro mandato de cinco anos como secretário-geral do PCC, durante o 20º Congresso da organização, quebrando com a tradição política das últimas décadas.

Durante o memorial realizado esta terça-feira no Grande Palácio do Povo, Xi Jinping descreveu Jiang Zemin como um “líder de prestígio e um grande marxista, diplomata e guerrilheiro comunista”, que liderou a China em “desafios sem precedentes”.

O evento contou com a presença da viúva de Jiang, Wang Yeping. O braço direito de Jiang durante parte da sua liderança, o antigo primeiro-ministro Zhu Rongji, e o seu sucessor Hu Jintao, não foram vistos durante a transmissão da homenagem, feita pela televisão estatal CCTV.

Hu, que foi expulso em frente às câmaras, durante o 20º Congresso do PCC, esteve presente na segunda-feira, na cremação de Jiang.

Xi Jinping com poderes reforçados no congresso que afastou Li Keqiang da liderança do PC chinês. Hu Jintao escoltado para fora do congresso

Três minutos de silêncio precederam o início do evento, seguidos por sirenes e buzinas em Pequim e outras cidades chinesas, ao longo de 180 segundos.

Xi enfatizou a persistência de Jiang em prosseguir com o processo de “abertura e reforma económica” e elogiou o seu papel no retorno à China da soberania de Macau e Hong Kong, outrora sob domínio de Portugal e do Reino Unido, respetivamente.

O atual líder destacou a “visão” de Jiang para a “construção de um país próspero”.

Xi, que usou uma pulseira preta durante a cerimónia, agradeceu ao falecido ex-presidente por “esclarecer a relação entre o socialismo, a estabilidade e o desenvolvimento económico”.

“Desejo glória eterna ao camarada Jiang Zemin”, proclamou.

Os participantes curvaram-se então três vezes e ouviram a Internacional comunista.

Xi fez o discurso ao lado de um enorme retrato de Jiang, instalado na tribuna, onde os restos mortais do ex-presidente foram cobertos com uma bandeira com a foice e o martelo.

A morte de Jiang, em 30 de novembro, devido a leucemia e falência múltipla de órgãos, coincidiu com protestos em larga escala em todo o país, contra as medidas altamente restritivas de prevenção epidémica, no âmbito da estratégia “zero Covid”. Vários manifestantes pediram também a destituição de Xi Jinping, numa demonstração pública de descontentamento muito rara no país.

Críticas ao regime na China são restritas a locais privados e entre pessoas de confiança. Os tribunais chineses condenam frequentemente à prisão ativistas ou dissidentes por “perturbação da ordem pública” ou “subversão do poder do Estado”.

Engenheiro de formação e ex-secretário do PCC em Xangai, a maior cidade da China, Jiang liderou a China entre 1989 e 2002. Jiang ascendeu ao poder um dia depois de tanques do exército terem posto fim ao movimento pró-democracia da Praça Tiananmen, na noite de 03 para 04 de junho de 1989.