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Tomás Wallenstein sozinho entre as canções: "Só voz e piano, ao primeiro take"

Este artigo tem mais de 1 ano

A pandemia trouxe-lhe tempo para fazer versões ao piano de José Afonso, José Mário Branco, B Fachada e Cartola, entre outros. Canções que gostava de ter composto e que agora foram gravadas em disco.

"O que junta estas canções aparentemente tão distintas foi aperceber-me da vontade que tinha de ter sido eu a fazê-las, que encaixavam na minha voz. De certa forma, acabei por me sentir dentro de cada uma delas", diz Tomás Wallenstein
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"O que junta estas canções aparentemente tão distintas foi aperceber-me da vontade que tinha de ter sido eu a fazê-las, que encaixavam na minha voz. De certa forma, acabei por me sentir dentro de cada uma delas", diz Tomás Wallenstein

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

"O que junta estas canções aparentemente tão distintas foi aperceber-me da vontade que tinha de ter sido eu a fazê-las, que encaixavam na minha voz. De certa forma, acabei por me sentir dentro de cada uma delas", diz Tomás Wallenstein

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Estamos habituados a vê-lo no palco, de guitarra ao peito, a divertir-se com os restantes Capitão Fausto. Quase a completar 34 anos, Tomás Wallenstein já não canta debaixo das saias da mãe. Aproveitou a pandemia para se dedicar ao piano e tocar canções que ouviu quase toda a vida, feitas por compositores que, em princípio, estão fora do seu espaço contemporâneo e de conforto. Este que agora se revela não é um disco de rock, é uma incursão melancólica através de nove faixas de diferentes compositores, com o título Vida Antiga.

Em conversa com o Observador, o músico português conta como foi preparar o novo registo, mais intimista e amadurecido pelo tempo. Mas há mais: fala-nos sobre a sua paixão por Lisboa, as dificuldades que a guerra trouxe e o meio cultural onde se movimenta.

[“Vida Antiga”, por Tomás Wallenstein:]

Como foi chegar a esta seleção de canções?
Na verdade foi um caminho inverso ao que estou habituado a fazer. Normalmente, com Capitão Fausto e nos outros projetos, as canções surgem na sala de ensaios e depois vamos para estúdio gravar. Aqui foi o inverso, dedicando muitas horas a um bom piano que tenho em casa.

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Mas porquê aprender estas canções em particular?
São canções que já ouvia, outras foram surgindo, porque queria aprender a tocá-las, sem grande critério. O que junta estas canções aparentemente tão distintas foi aperceber-me da vontade que tinha de ter sido eu a fazê-las, que encaixavam na minha voz. De certa forma, acabei por me sentir dentro de cada uma delas.

Algumas já tinham sido tocadas ao vivo.
Sim, no ano passado fiz uma tour só de piano e voz, onde experimentei muitas destas canções e outras que acabaram por não entrar no disco. Foram surgindo oportunidades quando, a meio de 2022, pensei que devia passar para disco estas que não são minhas, mas que eu gentilmente roubei.

Mas o piano não é o seu instrumento de raiz?
Não. Comecei a tocar violino e a certa altura da minha formação tive aulas de piano. Sempre fui muito curioso com os instrumentos e sempre tive um piano em casa. Quando comecei com Capitão Fausto, em 2009, então com 20 anos, dediquei-me totalmente à guitarra. Era a minha ferramenta de composição, harmonia e melodia. Mas nestes últimos anos dediquei-me mais ao piano.

Capitão Fausto começou quando eram muito novos e no disco Capitão Fausto têm os dias contados dá a sensação que foi o assumir da idade adulta. Nessa época chegaram até a viver todos juntos.
Sim, é verdade que vivemos juntos entre 2016 e 2019. Foi uma fase que terminou quando o contrato dessa casa acabou. A vida tem desafios cada vez mais de vida de adulto, mas a aprendizagem e as dores de crescimento não são fenómenos apenas dos 30. Estamos constantemente a crescer e a aprender, somos confrontados com o que não conhecemos, o que nos obriga  a adaptar e a fazer o nosso exame de consciência.

"Foram surgindo oportunidades quando, a meio de 2022, pensei que devia passar para disco estas que não são minhas, mas que eu gentilmente roubei"

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

A mudança será sempre necessária. Como se sente em relação a tudo o que tem acontecido na sua vida desde que começou como músico?
Sinto que tenho muita dificuldade em confrontar-me com a mudança. Por vezes passamos por momentos fortes e marcantes difíceis de ultrapassar. Mas, com boa vontade, temos sempre a capacidade de seguir em frente. As fases da vida são infinitas.

Tocavam muito em casa, compunham, qual era a ideia?
Na altura, como tínhamos o nosso estúdio em Alvalade, a casa era mais um lugar de descanso, do que trabalho. O estúdio de Alvalade acabou em 2021, e agora estamos com um projeto para nos mudarmos para a Junta de Alvalade, para um espaço que que estava ao abandono.

Como é o seu dia-a-dia atualmente?
Os últimos três anos foram muito atípicos. Estive fechado durante a pandemia, depois estivemos muitos meses a saltar de sala de ensaio em sala de ensaio. Houve muitos meses que foram de mudança e a fazer planos. Agora, para o futuro, o que antevejo é que tenhamos um horário diário, das 9 às 5, horário de expediente, e quando temos de trabalhar coisas em separado, como escrever, que é mais da minha responsabilidade, foco-me mais sozinho. Em todo o caso, estou envolvido em muita coisa, a editora [Cuca Monga] dá muito trabalho. Neste momento não tenho uma vida rotineira.

Muitas das letras que escreve têm referências a Lisboa. É a sua cidade de sempre?
Nunca vivi fora de Lisboa, não fiz intercâmbios nem Erasmus. Já estive mais encantado pela cidade. Fui estudante de arquitetura e andava muito atento à cidade, à sua morfologia e vida ativa. Lisboa tem sofrido uma enorme transformação. Mas as mudanças devem ser para melhor.

Isso é uma crítica?
Acho que as mudanças trazem novos desafios e outros problemas. Neste momento o preço da cidade é incomportável para a maioria dos lisboetas. É preciso encarar esse problema, mas eu não o personifico na cidade em si. Não é por isso que gosto menos da cidade. Na verdade, quando passo tempo fora daqui, regressar sabe sempre bem, é uma cidade efervescente, com charme e encanto.

[ouça o álbum “Vida Antiga” na íntegra através do Spotify:]

Segue a atualidade política? Como olha para a guerra e o impacto que está a ter nas nossas vidas?
Vejo, vou acompanhando, e estou bastante dentro dos acontecimentos. Normalmente não gosto muito de manifestar as minhas opiniões a esse aspeto.

E relativamente à Cultura em Portugal?
Acho que o país tem uma cultura muito forte, no sentido em que a produção artística define também o modo de vida das pessoas que vivem neste sítio. Acho que espontaneamente a cultura é muito rica, há muita vontade de fazer coisas. No entanto, as políticas culturais que permitem incentivar e ajudar essas manifestações a florescer ficam muito aquém. Não acompanham a qualidade da matéria prima que aqui existe.

É difícil viver da música em Portugal?
Acredito que seja possível fazermos um caminho, com melhores condições para se viver da música, para se fazer cinema, poesia, ou outras artes. Mas mais do que sermos criativos, precisamos de um espírito construtivo. Só assim conseguimos produzir coisas mais sólidas e que sirvam melhor toda a gente. Não apenas para quem vive e trabalha, mas para quem a consome. Os espetáculos e a arte são um modo de os artistas existirem, mas destinam-se sobretudo para quem consome essa arte.

Falando em espetáculos, como vai ser tocar este disco em palco? Tem estado a preparar os primeiros concertos do ano?
Vou fazê-lo exatamente como o gravei: só voz e piano, ao primeiro take. A apresentação vai ser em Lisboa, dia 24, Albergaria, dia 3 de março em Castelo Branco, e dia 4 em Famalicão.

É muito meticuloso na preparação dos concertos?
É sempre importante preparar e gosto sempre de inventar qualquer coisa porque cada espetáculo tem a sua identidade. Neste registo é sempre importante saber como vai começar ou acabar. Mas tenho sempre liberdade para tocar outras músicas. A preparação é muito mental, mas não me escapo a muitas horas sentado ao piano a repetir as músicas que vou tocar.

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