O Bloco de Esquerda assume a opção de limitar a comissão parlamentar de inquérito à TAP à gestão pública e ao caso de Alexandra Reis — cuja indemnização de meio milhão de euros que ninguém no Governo parceria saber (mas afinal alguns sabiam) foi o rastilho — “porque achamos que é a que faz mais sentido e a que mais resultados pode produzir no prazo disponível”, defendeu a deputada Mariana Mortágua esta quarta-feira.

As declarações foram feitas no debate parlamentar sobre as propostas de comissão de inquérito do Bloco de Esquerda do Chega. Ao contrário da proposta do Chega, que será chumbada pelos socialistas — um chumbo que foi reafirmado pelo deputado Carlos Pereira a uma pergunta direta de André Ventura e justificado por ser uma iniciativa do Chega —, a comissão de inquérito apresentada pelo Bloco será viabilizada pelos socialistas, através de uma abstenção.

A votação da primeira comissão de inquérito da maioria socialista vai ser votada esta sexta-feira e foi esta quarta-feira decidido que caberá precisamente ao PS a presidência.

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Durante o debate, Bruno Dias do PCP reafirmou que o partido vai propor um aditamento à proposta do Bloco para recuar até às consequências da privatização realizada nos últimos meses do Governo de Passos Coelho em 2015. Os comunistas querem ainda envolver as decisões da TAP desde novembro desse ano, com a gestão privada escolhida por David Neeleman e Humberto Pedrosa, em particular as que possam ter lesado o interesse público e a responsabilidade da tutela sobre essas decisões. Os aditamentos propostas pelos comunistas incluem ainda a decisão — do Governo — “que impôs uma reestruturação à TAP” e as consequências de uma possível privatização.

A deputada do Bloco respondeu que está aberta a outras propostas, mas avisa que uma comissão de inquérito que seja sobre tudo “é sobre nada”. Também André Ventura defendeu que transformar o inquérito à TAP numa comissão política é não investigar nada. As comissões de inquérito, alega, “não servem para discutir nacionalizações, servem para investigar”.

O Bloco tem “objetivos simples” com esta iniciativa. Quer “romper com o vício da negação e esquecimento, trazer mais transparência à gestão da TAP e reverter decisões que ofendem trabalhadores e lesam o interesse público. “Queremos respostas a todas as perguntas que os ministros nem quiseram fazer. E mais algumas”, avisou Mariana Mortágua que apresentou a iniciativa do Bloco, sublinhando que uma coisa “é um esquecimento, outra é o estado de negação a que chegou a maioria absoluta de António Costa”.

André Ventura defendeu um inquérito mais alargado, invocando os 3,2 mil milhões de euros dos dinheiros dos contribuintes, “mais do que recebeu a Lufthansa”, um “sorvedouro” que faz com que a TAP “seja o novo Novo Banco”. Ao mesmo tempo, lembrava os casos recentes sobre a gestão da TAP, dos BMW às indemnizações “milionárias”, mas também os mais antigos: como os “prémios pagos a quem não merecia” (e que foram distribuídos por diretores da TAP ainda na gestão privada que fica de fora do âmbito do inquérito proposto pelo Bloco. O inquérito proposto pelo Chega, diz, “não é para salvar ninguém”, é para investigar tudo.

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Mas para André Ventura há uma prioridade. “Não deixarmos passar em branco o papel de Fernando Medina neste processo. Tornou-se num ministro que não sabe nada. O seu tempo está a chegar ao fim”. Já sobre o outro ministro que tinha a tutela da TAP e que afinal não vai voltar tão cedo ao Parlamento depois de se demitir do Governo, o deputado Filipe Melo recordou as palavras ditas por Pedro Nuno Santos ao líder do Chega quando estava em funções.

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O ministro das Finanças, que foi o único membro do Governo a dar explicações ao Parlamento sobre o tema para garantir que desconhecia a indemnização, também será um alvo preferencial para o PSD que acusa o PS, através do deputado Hugo Carneiro de ter um único objetivo ao votar a favor da comissão de inquérito do Bloco:  “Salvar o que resta do ministro das Finanças”. “É mais um toca a foge” porque o PS não vai viabilizar todas as propostas.

O PSD apoia o inquérito “porque somos obrigados a recorre a uma comissão de inquérito” porque “enganam e escondem a verde”. Na gestão da TAP, diz Paulo Rios de Oliveira, “tudo é opaco”. “Nesta tragédia não há inocentes, nem na gestão da TAP, nem no Governo”, apontando na direção de Fernando Medina e Pedro Nuno Santos e concluindo que vários “protagonistas” deixaram de ter condições morais para exercer as suas funções.

Na resposta ao PSD, o socialista Carlos Pereira repete uma pergunta muitas vezes feita pelo ex-ministro Pedro Nuno Santos ao maior partido da oposição. O que teria o PSD feito à TAP durante a pandemia? O PSD, responde Paulo Rios de Oliveira, “daria a resposta a uma empresa privada, não nacionalizaria a TAP”.

Ao longo do debate, o deputado do PS foi recusando as acusações de falta de escrutínio na gestão política da transportadora área, sublinhando que o caso de Alexandra Reis está a ser investigado por iniciativa do Governo pela Inspeção-Geral das Finanças, para além do Tribunal de Contas e do Ministério Público. Os socialistas permitiram a ida de Fernando Medina ao Parlamento, mas a audição realizada à presidente executiva da TAP foi imposta pelo Chega de forma potestativa.

(Notícia atualizada às 23h15 depois do PS esclarecer que viabiliza a proposta do Bloco através de abstenção e não com voto a favor, como o deputado socialista Carlos Pereira referiu no debate. O PS esclareceu, depois, que o deputado queria dizer que viabilizaria, mas que foi um lapso a referência de que votaria a favor e que, por isso, não tinha havido qualquer mudança de opinião do PS)