A ministra Ana Mendes Godinho e a Caixa Geral de Aposentações (CGA) estão a esconder os valores atualizados da subvenção mensal vitalícia atribuída a 298 ex-titulares de cargos políticos, noticia o jornal Correio da Manhã.

Após queixa de um jornalista do Correio da Manhã, a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), um órgão independente que emite pareceres não vinculativos sobre o acesso aos documentos da administração, declarou que tal informação não deve ter o estatuto de “acesso reservado” imposto. Porquê? Porque se trata de um apoio social “auferido pelo exercício de funções públicas” e que é pago com “dinheiros públicos”.

Contudo, a ministra da Segurança Social seguiu o entendimento da CGA e manteve a recusa no acesso a tal informação por parte da comunicação social.

A posição da ministra da Segurança Social contrasta com a decisão do seu antecessor. Confrontado com um anterior parecer da CADA, Vieira da Silva disponibilizou a informação em agosto de 2016, segundo o Correio da Manhã.

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A CGA, a quem a ministra remeteu o parecer da CADA, defende só pode divulgar os dados, que diz conterem “dados pessoais”, após o “consentimento dos seus titulares”.

Por outro lado, alega ainda aquela entidade pública que não possui nenhum “documento que contenha” os nomes e os valores atualizados pagos a título da subvenção mensal vitalícia. Tal lista, conclui a CGA, terá de ser criada através de “desenvolvimentos informáticos” que não estão previstos no “plano de actividades da entidade.

Os últimos dados disponíveis sobre a lista dos beneficiários e dos respetivos valores indicam a existência de 298 beneficiários. Entre eles estão Armando Vara e José Sócrates. O ponto do valor atualizado é fundamental nesta questão porque a lei estabelece que o valor da subvenção mensal vitalícia pode duplicar quando o beneficiário faz 60 anos.

O caso de Vara, que já cumpriu pena de prisão no processo Face Oculta, é um dos casos em que o valor da subvenção duplicou: de um valor inicial de 2.014 euros passou, após o ex-ministro ter feito 60 anos, para os 4.590 euros.

Ana Mendes Godinho emite comunicado para refutar qualquer ilegalidade

A ministra Ana Mendes Godinho, contudo, refuta qualquer ilegalidade. Através de comunicado enviado ao Observador ao final da tarde deste domingo, fonte oficial do seu gabinete garante que, “desde 2019”, que “a “informação referida vem sendo disponibilizada pela CGA no seu site”.

Isto é, o primeiro Governo de António Costa (no qual Vieira da Silva era o ministro da Segurança Social e Ana Mendes Godinho era secretária de Estado do Turismo) publicou uma nova lei que permite que a CGA não tenha de publicar o valor atualizado da subvenção mensal vitalícia.

A mesma fonte garante igualmente que o parecer n.º 415/2022 da CADA, que analisou a queixa do jornalista do Correio da Manhã, “está em conformidade com o que está estabelecido na lei e que tem sido observado pela CGA.”.

O que diz o parecer da CADA

Contudo, o parecer da CADA (que pode ser lido aqui) contraria uma parte importante da interpretação que a CGA tem vindo a fazer da lei para esconder o valor atualizado por várias razões:

  • Em primeiro lugar, a CADA estabelece de forma clara que a informação sobre o valor atualizado da subvenção mensal vitalícia “não é reservada” e mantém o seu entendimento manifestado em 2016 (no parecer n.º 217/2016) em que defendeu que tal informação deve ser pública;
  • Mais: a CADA deixa claro que a lei que regula o acesso a essa documentação é a Lei de Acesso aos Documentos Administrativos — e não o decreto-lei n.º 117/2019 de 21 de agosto aprovado pelo Governo de António Costa que desobrigou a CGA de publicar o valor atualizado;
  • Logo, “detendo a entidade [a CGA] que contenha a informação solicitada [o valor atualizado da subvenção mensal vitalícia], deve a entidade requerida facultá-la”, lê-se no parecer da CADA.

A CADA deu parcialmente razão à CGA no que diz respeito à obrigação de fazer uma lista com o valor atualizado das pensões recebidas pelos 298 ex-titulares de cargos políticos que são os beneficiários de tal subvenção.

Tudo porque uma das últimas alterações da lei de acesso aos documentos administrativos (a LADA) permitiu que as entidades públicas não tenham o dever de criar documentos (uma lista com o valor atualizado da pensão vitalícia, neste caso), “caso isso envolva um esforço desproporcionado que ultrapasse a simples manipulação dos mesmos”. O dever de criar tais documentos era claramente permitido pela versão original da LADA.

No entanto, “a título de esclarecimento para alguma situação futura, se vier a ser solicitado o acesso a informação respeitante a algum titular em concreto, com certeza que não se colocará aí” o problema de fazer uma lista, “pelo que deverá ser facultada” a informação sobre valor atualizado da pensão, lê-se no parecer.

Notícia atualizada às 19h23m com a posição oficial do gabinete da ministra Ana Mendes Godinho e com o conteúdo do parecer n.º 415/2022 da CADA. Foi igualmente clarificado que o centro do que está em causa é o valor atualizado da subvenção vitalícia mensal.