O advogado de Paulo Lalanda e Castro, acusado no processo “O Negativo”, considerou esta sexta-feira “muito importante” que o tribunal não tenha pronunciado o seu constituinte pelos crimes mais graves, incluindo corrupção e branqueamento de capitais.

Raul Soares da Veiga falava aos jornalistas à saída do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), em Lisboa, após o juiz de instrução criminal Ivo Rosa ter decidido suspender a decisão instrutória do processo “O-Negativo”, depois de o Ministério Público pedir um prazo para analisar os pedidos de suspensão do processo solicitado pelos três arguidos pronunciados: Lalanda e Castro, antigo presidente da empresa Octapharma, Cunha Ribeiro, antigo presidente da Administração Regional de Saúde (ARS) de Lisboa e do INEM e da médica Manuela Carvalho.

Para nós, hoje houve coisas muito importantes. Desde logo, a não pronúncia relativamente a todas aquelas coisas mais graves de que o próprio Ministério Público (MP) já tinha renunciado, tendo o juiz (Ivo Rosa) concordado com o MP que não há sequer vontade de promoção de julgamento nesse sentido”, declarou Soares da Veiga, classificando este aspeto de “fundamental”.

O advogado de Lalanda e Castro disse que ficou claro nas considerações do juiz Ivo Rosa que “não houve prejuízo nenhum causado ao Estado”, bem como “não houve ato nenhum praticado nos concursos que prove ato indevido”.

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Tudo isto são questões cruciais”, enfatizou Soares da Veiga, observando que, em relação ao seu constituinte, restaram apenas os crimes de falsificação de documento na forma tentada e a questão da entrega de uns “cabazes de Natal aos médicos”.

O advogado de Lalanda e Castro desvalorizou esta entrega de cabazes de Natal (alegada concessão indevida de vantagem), ironizando que “não eram cabazes de Natal com ouro lá dentro, pois eram aquelas coisas comuns, uns doces, queijo, vinho”.

Soares da Veiga reiterou que também estes crimes menores imputados a Lalanda e Castro são rejeitados pela defesa, o que faria o processo ficar reduzido a nada.

A defesa de Lalanda e Castro, que anteriormente no debate instrutório tinha proposto a suspensão provisória do processo ao seu constituinte mediante o pagamento de uma injunção de 500 mil euros, isto antes de caírem os crimes de corrupção e branqueamento de capitais, entende agora que aquele valor então proposto se tornou desproporcionado em relação aos crimes que sobraram, admitindo que o mesmo possa vir a repensado pela defesa.

O valor dos cabazes de Natal não é de certeza de 500 mil euros”, voltou a ironizar Soares da Veiga.

Em relação ao facto de o juiz de instrução Ivo Rosa aguardar agora a resposta do MP ao pedido de suspensão do processo, após terem caído os crimes com moldura superior a cinco anos, o advogado de Lalanda e Castro explicou que é normal que o MP queira apreciar com tempo a questão, uma vez que existem “nuances” jurídicas entre o que as procuradoras pediram de pronúncia no debate instrutório e aquilo que o juiz Ivo Rosa entendeu existir para levar a julgamento.

O advogado lembrou ainda que este processo, que teve acusação em 2019, surgiu em 2015, mas imputando factos ocorridos em 1988, observando que “se calhar, pelo decurso do tempo, já não fazia sentido” ter prosseguido.

Além disso, fizeram uma acusação com indícios tão fracos que até o MP no debate instrutório considerou não existirem”, criticou ainda Soares da Veiga.

Por seu lado, Ricardo Sá Fernandes, advogado de Helena Lalanda e Castro (irmã do antigo presidente da Octapharma) e da empresa CONVIDA, congratulou-se pela não pronúncia dos seus constituintes, dizendo que tal desfecho “já era esperado” da sua parte.

O assunto [processo] termina aqui, a não ser que haja recurso do MP [contra a absolvição] e o mesmo venha a ter provimento”, conclui Sá Fernandes.

Esta sexta-feira, o juiz Ivo Rosa deixou cair os crimes de corrupção por prescrição, bem como o crime de branqueamento, mas pronunciou Lalanda de Castro por um crime de falsificação de documento na forma tentada e três crimes de concessão de vantagem, sob a forma de cabazes de Natal.

O magistrado pronunciou também o arguido Cunha Ribeiro por um crime de falsificação de documento na forma tentada e dois de recebimento indevido de vantagem, ficando pelo caminho os crimes de abuso de poder, corrupção e branqueamento. Por sua vez, a médica Manuela Carvalho foi pronunciada apenas por um crime de recebimento indevido de vantagem.

Tendo em conta que os crimes em causa são passíveis de suspensão provisória do processo por terem molduras penais até cinco anos, e uma vez que a defesa dos arguidos já tinha proposto esta solução antes da decisão instrutória mediante o pagamento de certas quantias monetárias, os advogados solicitaram que o juiz aplicasse este mecanismo (injunção) em alternativa ao julgamento, tendo sido pedida uma posição às procuradoras do MP.

Já durante a sessão da tarde, a equipa do MP pediu um prazo de 10 dias para se pronunciar sobre a matéria, prazo esse a que os advogados dos arguidos não se opuseram. De imediato, o juiz decidiu dar tempo ao MP para analisar a questão, informando que, assim “não é possível concluir a decisão de pronúncia”.

A decisão instrutória ainda não está encerrada”, reiterou, declarando ficar agora a aguardar a resposta do MP.

No processo O-negativo, cuja acusação data de novembro de 2019 e no qual foi investigado o negócio do plasma sanguíneo, foram acusados sete arguidos.

Em causa está a alegada prática de atos de corrupção ativa e passiva, recebimento indevido de vantagem, falsificação de documentos, abuso de poder e branqueamento de capitais em negócios através do fornecimento de plasma e derivados de sangue, num esquema que terá permitido beneficiar a empresa farmacêutica Octapharma em vários concursos públicos.