Dezenas de milhares de pessoas manifestaram-se esta quarta-feira em Espanha, 40 mil delas em Barcelona e 27 mil em Madrid, a propósito do Dia Internacional da Mulher, em defesa da igualdade de género e contra o machismo.

Em Espanha, a igualdade de género e o feminismo são um dos protagonistas do debate político e público e este ano, o Dia Internacional da Mulher volta a viver-se sem as restrições da pandemia de Covid-19, sendo uma data em que tradicionalmente milhares de pessoas saem às ruas em cidades de todo o país.

Segundo as autoridades policiais, a maior manifestação deste ano foi em Barcelona e juntou 40 mil pessoas (60 mil segundo os organizadores).

Os números das autoridades dizem que nas duas grandes manifestações de Madrid estiveram 27 mil pessoas (17 mil numa marcha e 10 mil noutra).

Já as plataformas que convocaram as manifestações de Madrid afirmaram que estiveram 700 mil pessoas numa e 35 mil noutra.

No último ano sem Covid-19, em 2019, só em Madrid saíram à rua 375.000 pessoas, segundo as autoridades policiais. No ano anterior, em 2018, além das manifestações, realizou-se no 8 de março uma “greve geral” em defesa da igualdade de género, considerada hoje um marco no movimento feminista espanhol, que se reivindica de grandes conquistas desde a década de 1970.

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Espanha é considerada uma referência internacional na igualdade de género, com leis pioneiras nesta área.

Duas dessas leis foram aprovadas no mês passado: a nova regulamentação do aborto e da saúde sexual, que instituiu o direito a baixas por menstruações dolorosas e incapacitantes, e a designada “lei trans”, que passou a permitir a mudança de género no registo civil sem necessidade de pareceres ou tratamentos médicos.

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As duas leis foram elogiadas por instituições internacionais, como várias agências das Nações Unidas ligadas aos Direitos Humanos, que as consideraram exemplos que deviam ser seguidos por outros países.

No ano passado, Espanha aprovou também uma nova tipificação dos crimes de violação, com o objetivo de estabelecer que aquilo que define uma agressão sexual é a não existência de consentimento para uma relação — e já não se houve violência ou intimidação ou se a vítima resistiu.

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Esta mudança no Código Penal — conhecida como “lei do só sim é sim” — foi uma reivindicação dos movimentos feministas e de milhares de pessoas que saíram às ruas em Espanha na sequência de uma sentença do caso conhecido como “La manada”, em que um tribunal não considerou agressão sexual, mas abuso sexual (um delito menos grave) a violação de uma rapariga por um grupo de homens por não ter ficado provada a resistência da vítima.

Por causa de um efeito não previsto e indesejado desta lei — a revisão em baixa de penas de mais de 700 violadores condenados — o Governo espanhol, que se assume como “um governo feminista”, chegou ao Dia Internacional da Mulher deste ano no meio da maior crise que já viveu nesta legislatura, que termina em dezembro.

Os dois partidos na coligação no Governo — PSOE (socialista) e Unidas Podemos — não se entendem em relação à necessidade de rever a lei do “só sim é sim” e sucedem-se há semanas trocas de acusações públicas entre ministros e ministras das duas alas do executivo.

Na terça-feira, os respetivos grupos parlamentares votaram separados no parlamento a proposta para alterar a legislação, que saiu do Conselho de Ministros.

Também a “lei trans” provocou divisões no PSOE e no movimento feminista, por haver grupos que consideram que pode prejudicar os avanços alcançados pelas mulheres na luta pela igualdade de direitos.

Para estes movimentos, ser mulher não é uma identidade subjetiva e o feminismo é a luta contra a discriminação de uma identidade objetiva, baseada no género biológico.

Embora sem a unidade de anos anteriores, os movimentos feministas espanhóis voltaram a sair à rua, esta quarta-feira, em manifestações em todo o país, convocadas por plataformas e associações que vão desde sindicatos a grupos estudantis e a que se somaram políticos da esquerda e da direita.

Na maior manifestação de Madrid, apesar das divisões, estiveram várias ministras do Governo espanhol, tanto do PSOE como da Unidas Podemos, embora seguindo em grupos separados.

A ministra das Finanças e ‘número dois’ do PSOE, Maria Jesús Montero, disse que “a rivalidade não está dentro das mulheres, mas fora, naqueles que negam que existe machismo estrutural”.

A ministra da Igualdade e dirigente do Podemos, Irene Montero, garantiu que não haverá “passos atrás” em Espanha na conquista de direitos para todas as mulheres, incluindo as transexuais.

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A manifestação encheu artérias centrais de Madrid, com milhares de pessoas vestidas com roupas violeta, a cor do movimento feminista internacional.

Os cartazes diziam que “Sobran los motivos” (“Há motivos de sobra”, na tradução em português) para assinalar o 8 de março, como as reivindicações de “igualdade salarial” e de “mais educação sexual” ou a denúncia da “violência machista” e da situação das mulheres no Afeganistão.