Na época 2020/2021, a ucraniana Olga Kharlan ficou no primeiro lugar do ranking mundial de esgrima na vertente de sabre. No seu encalço, além da francesa Manon Apithy-Brunet, estavam três russas, Sofia Lokhanova, Sofia Velikaya e Olga Nikita. Os países em conflito na guerra que dura há mais de um ano têm tradição na modalidade – nos últimos Jogos, em Tóquio, o Comité Olímpico Russo conquistou oito medalhas –, mas as sanções impediram que todos os atletas provenientes da Rússia e da Bielorrússia (país aliado do Kremlin) pudessem participar nas competições sob a tutela da Federação Internacional de Esgrima (FIE), organismo que deixou de ser presidido pelo oligarca russo Alisher Usmanov.

No entanto, a FIE anunciou o levantamento das sanções que recaíam sobre russos e bielorrussos, o que vai permitir aos atletas participarem na primeira grande prova do calendário internacional deste ano, o Campeonato do Mundo Feminino de sabre, e nas próximas competições de apuramento olímpico ainda que sem símbolos nacionais. A decisão foi tomada em Conselho Executivo com 91 votos a favor e 46 contra e vai ao encontro das indicações dadas pelo Comité Olímpico Internacional (COI) que está a explorar maneiras dos atletas russos e bielorrussos poderem competir em Paris sem bandeira nem hino.

A seguir ao judo e ao ténis, a esgrima tomou uma posição que permanece sujeita a indicações superiores. Ainda assim, o presidente do COI, Thomas Bach, também ele um antigo esgrimista alemão, disse ser “demasiado cedo” para tomar uma decisão em relação à participação dos dois países nas próximas olimpíadas. Também a Ministra do Desporto e dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos francesa, Amélie Oudéa-Castéra, não adianta uma posição.

“A situação hoje é clara: estamos num momento em que nenhuma decisão foi tomada para Paris-2024. O Presidente da República [Emmanuel Macron] disse que vai expressar a sua visão sobre o assunto no verão junto do COI, decidindo no final. Respeitamos a soberania do COI, a autonomia do movimento desportivo, mas, ao mesmo tempo, temos uma posição sobre o assunto. Neste contexto de agressão russa, é necessário continuar e intensificar as sanções. Em segundo lugar, temos que apoiar a Ucrânia, incluindo os atletas ucranianos para que tenham a melhor delegação possível nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos no verão de 2024. Depois, há um princípio que é defendido pelas Nações Unidas, que é o da não discriminação de atletas russos e bielorrussos com base apenas na posse de um passaporte e de uma nacionalidade que pode levar o COI a refletir sobre um sistema de neutralidade, pelo menos para atletas individuais”, disse a governante.

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A posição de Amélie Oudéa-Castéra surge depois da carta assinada pelos responsáveis da pasta do desporto de 30 países – tais como Portugal, Grécia, Japão, Itália, EUA, Canadá, Alemanha e o Reino Unido – dirigida ao COI, em que é pedido que seja clarificada a neutralidade que se sugere que seja aplicada a Rússia e Bielorrússia e onde é reiterado o “apoio em curso a que atletas russos e bielorrussos sejam banidos de competir em provas internacionais enquanto durar a guerra na Ucrânia”. Apesar de o Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, João Paulo Correia, ser subscritor da carta, o Comité Olímpico de Portugal (COP) assumiu uma posição distinta, sendo favorável à reintegração dos atletas russo e bielorrussos. “O desporto deve ser um fator de pacificação e aproximação entre as partes desavindas”, disse o presidente do COP, José Manuel Constantino. Também os Comités Olímpicos Africanos se mostraram a favor da participação russa, ao contrário do que fizeram Dinamarca, Noruega, Suécia, Finlândia e Islândia.

A Ucrânia, que ameaça boicotar os Jogos Olímpicos, no caso de ser permitida a participação de atletas russos, criticou a posição do COI, nas palavras do assessor da presidência ucraniana, Mykhaïlo Podoliak. “O COI é um promotor de guerra, assassinato e destruição. O COI assiste com prazer à Rússia a destruir a Ucrânia e oferece aos russos uma plataforma para promover o genocídio e encorajar novas mortes. Óbvio que o dinheiro russo que compra a hipocrisia olímpica não tem cheiro a sangue ucraniano. Certo, Sr. Bach ?”, questionou o político, dirigindo-se ao presidente do COI.

O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, também condena a eventual participação de russos nos Jogos Olímpicos. “Enquanto a Rússia mata e aterroriza os representantes deste Estado terrorista não podem ter lugar no desporto e nas competições olímpicas. A mera presença de representantes do Estado terrorista é uma manifestação de violência e impunidade. Isso não pode ser encoberto por uma pretensa neutralidade ou bandeira branca”. A resposta de Moscovo chegou pelo Ministro dos Desportos, Oleg Matytsin. “A tentativa de ditar as condições para a participação de atletas em competições internacionais é absolutamente inaceitável. Atualmente, vemos uma vontade indisfarçável de destruir a unidade do desporto internacional e de usar o desporto como meio de pressão para resolver problemas políticos. Faziam melhor em cuidar do desporto nos seus próprios países e fazer de tudo para que o desporto fosse um embaixador da paz e que ajuda a construir pontes entre os povos”, referiu numa opinião oposta à ucraniana.

A Federação Internacional de Remo (FISA) já iniciou o processo de consulta dos membros tendo em vista tomar uma posição sobre o levantamento de sanções a atletas russos e bielorrussos. Em abril, é a vez da Federação Internacional de Basquetebol (FIBA) analisar a situação com a condicionante da qualificação olímpica para este desporto já ter começado.

Além da participação russa, os Jogos Olímpicos de Paris têm outras questões para resolver. Começando pelo início, a cerimónia de abertura, que, segundo os planos da organização se vai realizar junto ao Rio Sena, com a Torre Eiffel como pano de fundo, está a causar preocupação junto das forças de segurança que estão com dificuldades em recrutar agentes para o serviço. Deste modo, está a ser ponderado o recurso a membros do exército. São esperadas 600.000 pessoas ao longo das margens e 200 barcos, onde os atletas vão ser transportados durante o cortejo. Vão estar 35.000 agentes de segurança pública e 3.000 de segurança privada na rua.

Do ponto de vista organizacional, a rede de transportes também causa transtornos. A extensão do metro até à Aldeia Olímpica ainda não está concluída e não há previsão quanto ao término das obras, o que, aliado à existência de poucos autocarros, provoca problemas relacionados com a circulação de milhares de pessoas. Também a rede de comboios precisa de intervenções. Assim, o Estado francês contratou 6.600 pessoas numa “campanha de recrutamento sem precedentes”, como classificou, em comunicado, a RATP, operadora de transportes públicos francesa, e que inclui condutores de autocarro e metro, operadores de estação, trabalhadores ligados à manutenção de infraestruturas e seguranças.

O orçamento de 8,8 mil milhões de euros tem sido criticado pelos políticos locais que classificam o valor como exagerado. O investimento reflete-se no custo dos bilhetes que o público tem considerado elevado. Os preços variam entre os 24 euros até quase aos 700 euros.