O presidente da comissão parlamentar de inquérito à tutela política da gestão pública da TAP vai voltar a pedir ao Governo a fundamentação jurídica e eventuais pareceres que sustentem a decisão de demitir a presidente executiva da companhia. Para o socialista Jorge Seguro Sanches, estes documentos pedidos pelo PSD estão dentro do âmbito do inquérito parlamentar, contrariando assim a argumentação dada pelos ministros das Finanças e das Infraestruturas para recusar a entrega da referida fundamentação jurídica.
O Governo invocou que a entrada de tal documentação estaria a extravasar o objeto da comissão de inquérito — porque a demissão de Christine Ourmières-Widener ocorreu em 2023 e o âmbito da comissão ocorre entre 2020 e 2022. “O que não me parece ocorrer de maneira nenhuma”, afirmou o presidente da CPI durante a reunião de emergência pedida pelo PSD.
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No entanto, e tendo em conta a argumentação dada já esta terça-feira por outros membros do Executivo (ministras dos Assuntos Parlamentares e da Presidência), Jorge Seguro Sanches chegou a apelar à ponderação dos deputados para que seja solicitado ao Governo que fundamente o interesse público, que segundo Ana Catarina Mendes e Mariana Vieira da Silva, estaria em causa devido à litigância (contestação judicial por parte dos gestores da TAP da decisão do Governo que os demitiu). “Sabemos que há uma litigância e que envolve o interesse público que temos uma obrigação de o proteger”.
O PSD defendia que a comissão parlamentar de inquérito devia insistir no pedido ao Governo, mas queria que a nega dos ministros das Infraestruturas e Finanças, sustentada no argumento de que o pedido estaria fora do âmbito, fosse levada ao Presidente da Assembleia da República (PAR) para ser este responsável a fazer o pedido e avaliar uma eventual participação ao Ministério Público por desobediência qualificada, ao abrigo do regime jurídico das comissões de inquérito.
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A recusa de prestação de informação é um crime e o presidente da CPI tem de comunicar ao PAR para participação ao Ministério Público, defendeu o deputado Paulo Moniz. O Chega chegou a avançar com a intenção de avançar com um requerimento no mesmo sentido, considerando Filipe Melo que a resposta dada pelo Governo “não faz sentido nenhum”, lembrando que a resolução que aprova a CPI “abre uma janela para o ano de 2023”, porque não diz que os trabalhos se devem focar apenas neste período.
O que é o mais importante? A queixa ou o documento?
Para o deputado, o segundo pedido deve ir acompanhado da indicação expressa de que o Chega avançará com uma participação criminal se o Governo insistir em não entregar a documentação. No entanto, o Chega acabou por se virar contra o PSD que insistiu contra o resto dos deputados na posição de exigir que seja o Presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, a pedir o documento ao Governo e avaliar as consequências da recusa do Governo em responder. E não o presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito a fazer a diligência. Hugo Carneiro manifestou discordância do PSD com a posição manifestada pelos deputados dos outros partidos e apresenta um recurso da decisão de Jorge Seguro Sanches (de ser da CPI o reforço do pedido ao Governo) que foi recusado depois de mais uma hora de discussão e que atrasou o arranque da audição do presidente da comissão de vencimento da TAP.
Os sociais-democratas acabaram isolados nesta pretensão de envolver o Presidente da AR neste pedido. Bernardo Blanco, da Iniciativa Liberal, lembrou que a lei prevê justificações para não enviar documentos e que quando a comissão discorda volta a pedir e existe um prazo legal de dez dias para que a documentação seja enviada.
“Os Srs. querem a queixa ou o documento?”
Na mesma linha, também o comunista Bruno Dias afirmou, deixando o desabafo: “Temos mais que fazer. Precisamos do documento. Os senhores querem a queixa ou o documento? Então venha o documento”. Bruno Dias acabou por acusar o PSD de ter como prioridade a questão processual e não o documento.
Também Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, fez a pergunta: “O que é mais importante? A batalha política contra o Governo ou o acesso ao documento? Eu acho que é o documento”.
Para a deputada, a CPI deve fazer o que todas as comissões de inquérito fazem quando uma entidade recusa entregar documentos. Esclarecer qual é o âmbito da CPI e se a entidade não cumprir, então sim apresentar uma participação criminal. A deputada do Bloco diz ainda que a apreciação do Governo sobre o que é o interesse publico é irrelevante. “Se o Governo demitiu os gestores da TAP sem fundamentação jurídica, o que lesa o interesse público? Que o tenha feito ou que se saiba que o tenha feito”. O Governo, insiste, deve enviar a documentação e cada deputado é responsável de usar essa informação, sabendo que ela pode ser usada num litígio contra o Estado.
O socialista Bruno Aragão pediu que seja o presidente da comissão de inquérito junto do Governo a manifestar a pretensão de obter documentos, sem prejuízo da classificação que vier a ser dada aos referidos documentos. “Devemos fazer o apelo e aguardar a resposta que o Governo volte a dar”, defendeu o coordenador do PS que substituiu Carlos Pereira (que ainda está na reunião desta quarta-feira até ser substituído) na função.
Dos cumprimentos à estupefação
A discussão começou até de forma cordata com Paulo Moniz a dar os parabéns pelos 50 anos do PS, “partido de referência dos valores da ética republicana e da democracia que o PSD partilha.” O que Bruno Aragão agradece. Mas logo o coordenador do PSD manifesta: “Recebemos estupefactos as resposta do Governo”. (ministérios das Infraestruturas e Finanças) e sublinha é absolutamente fundamental saber qual é a fundamentação jurídica. Se não tiver sido feito com segurança jurídica, está a comprometer o país e os contribuintes com indemnizações de grande monta”.
O deputado do PSD afirma que nem sequer é claro se existe algum parecer jurídico a fundamentar o despedimento dos gestores, descrito como sendo com “justa causa” (sem indemnização). “Ficamos com a sensação de que o despedimento em tempo real feito pelos ministros só se encontra respaldo num parecer da IGF (Inspeção-Geral de Finanças) que não ouviu presencialmente a demitida”. IGF que depende funcional e hierarquicamente do ministro das Finanças. Logo, considera, a certeza jurídica baseia-se exclusivamente no relatório que padece destes erros graves”.