O Ministério Público (MP) e cinco dos 17 arguidos recorreram da separação do processo Operação Lex decidida em março pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ), considerando que todos os arguidos e crimes devem ser julgados no STJ.

Em causa está a decisão de 10 de março do juiz conselheiro António Latas, que considerou que o STJ “apenas é competente” para julgar uma parte dos crimes em coautoria, envolvendo o juiz desembargador e ex-presidente do Tribunal da Relação de Lisboa Luís Vaz das Neves, o ex-juiz desembargador Rui Rangel, o funcionário judicial Octávio Correia, o advogado José Santos Martins (alegado testa de ferro de Rui Rangel) e o empresário José Veiga.

A separação do processo para dois julgamentos que é agora alvo de recurso do MP e das defesas dos arguidos Rui Rangel, Fátima Galante, Octávio Correia e Elsa Correia, e Bruna Amaral replicou uma anterior decisão do juiz conselheiro Sénio Alves, em julho de 2021, que tinha ordenado a cessação da conexão processual, deixando apenas Vaz das Neves para ser julgado no STJ. Contudo, esta separação já tinha sido revogada pela 5.ª Secção do próprio STJ em fevereiro de 2022, mantendo todo o processo nesta instância.

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O recurso do MP, a que a Lusa teve acesso, questiona “a declaração de incompetência do STJ para conhecer de uma parte do objeto do processo”, sublinhando que a decisão de voltar a separar o caso para dois julgamentos (um no STJ e outro em primeira instância) “integra uma nulidade insanável”, argumentando igualmente com uma violação do princípio constitucional do juiz natural. Por isso, defende que a decisão de março “deve ser revogada/declarada nula”.

“Questiona-se também da violação do caso julgado (formal) de matéria que mereceu acórdão (…) neste mesmo processo, a 24 de fevereiro de 2022”, refere o MP, colocando também em causa a competência do juiz de julgamento para reconfigurar o objeto do processo conforme vinha do despacho de pronúncia da decisão instrutória: “O juiz que os recebe conforma-se com a delimitação do objeto fixado pela pronúncia, não lhe sendo legítimo alterá-lo”.

A generalidade dos argumentos é partilhada pelos arguidos nos respectivos recursos – aos quais a Lusa teve acesso – contra a decisão do conselheiro António Latas.

A defesa de Rui Rangel aponta à “inevitável revogação da presente decisão, devendo manter-se a competência para a realização do julgamento nos presentes autos no Supremo Tribunal de Justiça”, enquanto o recurso de Fátima Galante pede a substituição do despacho “por outro que, declarando o STJ competente para o julgamento de todos os crimes imputados aos arguidos no despacho de pronúncia, ordene o prosseguimento dos autos para julgamento”.

No mesmo sentido, a defesa dos arguidos Octávio Correia e Elsa Correia invoca violação do caso julgado formal e do princípio do juiz natural, além de normas do Código de Processo Penal e da Convenção Europeia dos Direitos Humanos. Já a defesa de Bruna Amaral (ex-namorada de Rui Rangel) conclui que o despacho “está ferido de inconstitucionalidade”.

Em dezembro passado, o juiz conselheiro Sénio Alves decidiu validar nos “exatos termos” a acusação do Ministério Público contra os 17 arguidos do processo, levando os ex-desembargadores Vaz das Neves, Rui Rangel e Fátima Galante a julgamento, pronunciados por corrupção e outros crimes e o ex-presidente do Benfica Luís Filipe Vieira pelo crime de recebimento indevido de vantagem.

Supremo divide Operação Lex e decide que processo terá dois julgamentos

Em causa neste processo estão ainda crimes de abuso de poder, usurpação de funções, falsificação de documento, fraude fiscal e branqueamento de capitais.

A investigação da Operação Lex, que foi efetuada pela procuradora-geral adjunta junto do STJ Maria José Morgado (entretanto jubilada), centrou-se na atividade desenvolvida por Rui Rangel, Fátima Galante e Luis Vaz das Neves – que, segundo a acusação, utilizaram as suas funções na Relação de Lisboa para obterem vantagens indevidas, para si ou para terceiros.

O processo Operação Lex foi conhecido a 30 de janeiro de 2018, quando foram detidas cinco pessoas e realizadas mais de 30 buscas e teve origem numa certidão extraída do caso Operação Rota do Atlântico, que envolveu o empresário de futebol José Veiga, suspeito de crimes de corrupção no comércio internacional, branqueamento de capitais, fraude fiscal e tráfico de influências.