O Presidente timorense manifestou esta terça-feira preocupação pelo facto de o Governo estar a concretizar a compra da participação da brasileira Oi na Timor Telecom, por a operação estar a ocorrer no final do mandato do executivo.

“Fiquei surpreendido quando li sobre esta aquisição por parte do governo. Espero que o Tribunal de Contas não aprove”, disse José Ramos-Horta em declarações à Lusa.

É por esta e outras situações é que governos em fim de mandato não deveriam assumir compromissos que podem lesar o país. Eu vou exigir uma auditoria muito aprofundada de muitos atos, projetos, contratos, etc”, sublinhou.

O chefe de Estado falava à Lusa na véspera da assinatura em Díli do contrato de compra pelo Governo de Timor-Leste da participação da Oi na Timor Telecom, o que tornará o Estado acionista maioritário na empresa.

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Governo timorense confirma compra de participação da Oi na Timor Telecom

O ministro das Finanças, Rui Gomes, disse à Lusa que o investimento de 21,1 milhões de dólares, que tem ainda que passar o visto da Câmara de Contas, implica comprar tanto as ações na Timor Telecom como os créditos sobre a mesma à empresa TPT – Telecomunicações Públicas de Timor, S.A., à empresa PT Participações, SGPS, S.A., e à empresa Portugal Telecom International Finance BV.

“As negociações estão fechadas e por isso avançamos com este valor. Com esta compra, o Estado passa de uma participação de 20,59% para 67,5% do capital da Timor Telecom”, afirmou.

“Os fundos vão ser transferidos para uma conta ‘escrow’ [caução] enquanto o processo segue para a Câmara de Contas, que tem que dar o visto prévio. Só depois disso será assinado o contrato e os fundos serão libertados apenas depois da concretização das ações e demais”, referiu.

O valor final da operação é mais elevado do que os 14,5 milhões de dólares (13,2 milhões de euros) inicialmente previstos no Orçamento Geral do Estado para este ano.

Ramos-Horta explicou à Lusa ser a favor da compra e de uma maior intervenção do Estado na área das telecomunicações, mas questiona em particular o valor desta operação.

“Sou a favor de uma maior intervenção do Estado na área das telecomunicações, mas avançar com mais de 21 milhões para engordar uma empresa brasileira que não investiu um cêntimo em telecomunicações em Timor-Leste é péssimo negócio. Tem que ser travado”, disse.

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Um grupo de investidores portugueses que pretendia investir até 85 milhões de dólares na operadora timorense Timor Telecom, questionou o valor que o Estado timorense aceitou pagar à Oi.

O ex-presidente do Grupo Marconi e responsável da Partis Consulting, Gonçalo Sequeira Braga, disse à Lusa que o valor que o Estado timorense anunciou que vai pagar pela participação da Oi, cerca de 21 milhões de dólares (19,11 milhões de euros), é “excessivo” face ao valor de mercado da empresa.

“A compra pelo Estado de Timor-Leste da participação da Oi na Timor Telecom por 21 milhões de dólares é uma aquisição particularmente generosa, baseada numa valorização de 10 vezes o EBITDA [resultados operacionais reais antes de provisões, impostos e amortizações] de seis milhões de dólares e desconto de uma divida de 22,6 milhões de dólares [20,6 milhões de euros)”, disse à Lusa.

“É uma destruição de dinheiro. Ao comprar por 21 milhões, o Estado, no fundo, está a valorizar a empresa em cerca de 40 milhões porque está a pagar 21 milhões por 57%”, disse.

Na autorização de despesa, a que a Lusa teve acesso, o Governo considera a Timor Telecom “uma empresa estratégica no setor das telecomunicações” no país, sendo líder do mercado, notando que a situação de insolvência da Oi “coloca em causa a viabilidade e existência” da operadora timorense.

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Em concreto, a compra implica comprar uma participação atualmente na sociedade Telecomunicações Públicas de Timor (TPT) e outra detida pela Participações SGPS de 3,05%.

A funcionar em Timor-Leste desde 2003, a Timor Telecom é atualmente maioritariamente (54,01%) controlada pela TPT, onde a Oi controla 76% do capital, diretamente, e mais 3,05% através da Participações SGPS.

Os restantes acionistas da TPT são a Fundação Harii – Sociedade para o Desenvolvimento de Timor-Leste (ligada à diocese de Baucau), que controla 18%, e a Fundação Oriente (6%). O resto do capital da Timor Telecom está entregue ao Estado timorense (20,59%), à empresa com sede em Macau VDT Operator Holdings (17,86%) e ao empresário timorense Júlio Alfaro (4,49%).

A questão do futuro da Timor Telecom arrasta-se desde meados da década passada, com sucessivos anúncios e propostas que nunca chegaram a avançar, com, inclusive, no passado, membros do Governo a defenderem o aumento da participação do Estado.

Com um monopólio de vários anos – mediante um contrato de concessão com o Estado timorense que começou em 2002 e durou até 2012 (quando o setor foi liberalizado) -, a Timor Telecom era, inicialmente, controlada pela PT, uma posição posteriormente assumida pela brasileira Oi.