A Direção Geral do Tesouro e Finanças (DGTF) recebeu a 7 de março (no dia seguinte à conferência de imprensa que anunciou a demissão dos dois presidentes da TAP) às 22 horas um despacho do Ministério das Finanças para, “com caráter de urgência”, iniciar um procedimento para a saída de Christine Ourmières-Widener e Manuel Beja. Maria João Araújo, diretora-geral do Tesouro e Finanças, que está a ser ouvida na comissão parlamentar de inquérito (CPI) sobre a TAP, garante que não houve qualquer diligência anterior a essa data para esse efeito.
E, segundo revelou a deputada do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, a DGTF produz duas propostas para uma deliberação unânime no dia seguinte (8 de março) às 15 horas. “Foi um primeiro draft, um esqueleto, para ser completado. Não pretendiam ser as finais. Era um primeiro draft, as finais não têm a ver”, garantiu. A JurisApp deu apoio, a pedido do Ministério, assumiu. Mas garante que a DGTF não tem acesso aos pareceres jurídicos da JurisApp nem de outros pareceres jurídicos.
Não foi Maria João Araújo, mas sim Carlos Santos Pinto a assinar, pela DGTF, a assinar a deliberação unânime por escrito (DUE) final, porque, explicou, são normalmente os técnicos que acompanham as respetivas empresas a assinar as deliberações no registo, além disso a diretora-geral estava, nesse momento, de férias.
Maria João Araújo assume que, no final, “a DGTF foi mandatada para assinar uma deliberação, que não foi preparada pela DGTF. A DGTF foi mandatada para a assinar”. Acrescenta que “a DGTF foi mandatada para assinar aquela declaração, já que enquanto serviço integrado operacionaliza a decisão tomada pelo Governo”, uma decisão que, concretiza, foi recebida do gabinete do ministro das Finanças.
Confrontada com o facto de a deliberação ter pontos “que não são verdade”, pelo deputado da IL Bernardo Blanco, voltou a referir que “recebemos para assinar, bastante em cima da hora” e assinaram “com base no que tinha sido preparado pela Jurisapp, e não pretendemos mudar. Não assinei mas teria seguido o mesmo procedimento”.
Algumas questões sobre a deliberação unânime, a diretora-geral recusou-se responder por não saber se o documento era classificado. “E não sei o que posso dizer em público”. Mas garantiu que “não reuni nos últimos dias com nenhum governante, não recebi indicação do que tinha de dizer, mas também não sabia o que me ia ser perguntado”.
Escusa-se a fazer comentários sobre o facto de Christine Ourmières-Widener não ter sido ouvida pela IGF, no âmbito da auditoria, dizendo que cabe a essa entidade de auditoria decidir quem ouve e em que termos. Sobre o relatório diz que “é a posição da IGF, não há nada que não concordemos, nem nos cabia a nós não concordar”. Aliás, Maria João Araújo recusa avaliar a auditoria. “A IGF terá as razões para ouvir as pessoas que ouviu, não debati nem falei com o senhor inspetor para a justificação de quem foi ouvido que foi considerado adequado para elaboração do relatório. Uma vez mais, competia à IGF elaborar o relatório e criar condições para elaborar esse relatório, a DGTF não é uma entidade de auditoria”.
Quanto a Alexandra Reis, garante que desconhecia que estava a ser preparado um acordo de saída, e não lhe competia duvidar o que tinha sido comunicado sobre a renúncia. E só conheceu a saída pelo comunicado da CMVM. Nunca foi falado de acordo nem acompanhou processo de saída. E deixa a frase de que os gestores da TAP deviam conhecer o estatuto do gestor público (EGP). “São gestores públicos deviam conhecer”, atirou, e reafirma: “quem é gestor público deve conhecer o EGP”. E sobre a indemnização que Alexandra Reis tem de devolver, a DGTF diz que disse à TAP que lhe competia fazer os cálculos. E, com a devolução, “esta parte da indemnização fica resolvida”, atirou.
Sobre a passagem de Alexandra Reis da TAP para a NAV e desta para a secretaria de Estado do Tesouro, e a possibilidade de existir uma “porta giratória”, Maria João Araújo disse não lhe competir avaliar essas mudanças, apesar da insistência do Chega.
Também diz desconhecer o contrato de Christine Ourmières-Widener para a presidência executiva da TAP e como tal não conhece os objetivos que podem determinar o pagamento de prémios à CEO demitida. “Não conheço o contrato da CEO. Não posso dizer como estavam definidos. Não participámos nem conhecemos os contratos subjacentes”.
Maria João Araújo referiu até nunca ter tido qualquer contacto com a ex-CEO da TAP e de ter tido um único contacto com o chairman, Manuel Beja, “para se apresentar”. “Não lembro de ter recebido recentemente contactos da TAP”, assegurou.
Nos contratos de gestão que não estavam assinados com os gestores da TAP, a DGTF reafirma que só demonstrou a sua oposição sobre a pretensão de ser a TAP a pagar danos eventuais através de seguros. Mas a diretora-geral diz que cabia à UTAM fazer os contratos de gestão. “Não é habitual os contratos de gestão terem seguros”. Mas cabe ao ministro ou sob delegação a ao secretário de Estado assinar os contratos de gestão. Não à DGTF, disse, garantindo que não teve acesso ao parecer da Linklaters dos gestores sobre os contratos de gestão.
Questionada sobre uma “estratégia deliberada” de transferir o capital da TAP da Parpública para a DGTF, a diretora-geral diz “não saber” qual era a intenção, porque a DGTF não esteve nas negociações. “Foram dadas orientações para a DGTF entrar no capital, necessariamente a Parpública saía, não sei se foi deliberado, não estivemos nas negociações”. A Parpública, propriamente dita, “tem autonomia de gestão, vai sendo acompanhada quando precisa” e nestas alturas “pede à DGTF”.
Maria João Araújo adiantou que a DGTF não estava “muito envolvida” nas questões estratégicas da TAP, e que não se lembra de falar com o ministro das Finanças da altura, João Leão, sobre a TAP. Com o secretário de Estado Miguel Cruz “falámos de muitos assuntos, alguns eram as orientações que me dava sobre a TAP para concretizar alguma operação”, justificando as conversas com o facto de a DGTF estar “fisicamente próxima” do ministério das Finanças, por estar no mesmo edifício.