Quarto dia de debate instrutório do processo GES/BES e o assunto volta a ser o mesmo do primeiro dia: o estado de saúde de Ricardo Salgado. Adriano Squilacce, que representa o antigo presidente do Grupo Espírito Santo (GES), fechou a tarde desta sexta-feira com a referência à perícia médica independente pedida esta terça-feira pela defesa e que foi recusada pelo tribunal. “Os tribunais penais fogem a uma perícia médica ao arguido”, começou por dizer o advogado.

Na terça-feira, primeiro dia de debate instrutório, que deverá continuar ainda na próxima semana, Adriano Squilacce pediu, pela segunda vez nesta fase, uma perícia médica e revelou que o Tribunal Cível de Cascais deu, de forma inédita, luz verde ao pedido da defesa de Salgado para realizar uma perícia médica e ordenou ao Instituto de Medicina Legal que reunisse uma equipa de especialistas para atestar a doença do ex-banqueiro. E foi também mencionado um relatório pedido pela defesa, que indica que o estado de saúde de Ricardo Salgado está a degradar-se, apontando o agravamento de memória, alteração do comportamento e da marcha.

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E esta tarde, depois da recusa deste tribunal para avaliar o estado de saúde o ex-banqueiro, o advogado de Ricardo Salgado questionou: “Pretendia o tribunal que o arguido viesse para aqui sem perceber o que estava a ser discutido e com episódios de incontinência? Queria o tribunal ver a queda do arguido nesta audiência? Só não está verificado por perícia, porque o tribunal não quis. Como é que um arguido com Alzheimer se defende na instrução?”.

“Houve e há medo de fazer uma perícia médica independente por parte do estado e imparcial do ora arguido”, acrescentou Squilacce. E aproveitou para citar um testemunho que consta no site de uma associação que luta pelos direitos e dignidade de quem sofre da doença de Alzheimer: “Nunca me tratem como uma coisa, mas sempre como uma pessoa”.

A defesa de Salgado criticou ainda Pedro Santos Correia, o juiz de instrução que herdou o caso BES de Ivo Rosa em setembro do ano passado. “Nem quem criou o monstro conhece o monstro”, disse este advogado, explicando que em pouco mais de oito meses é impossível conhecer todo o processo GES/BES, que envolve 26 arguidos — 22 pessoas e quatro empresas –, acusados dos crimes de corrupção ativa e passiva, burla, associação criminosa, falsificação de documento, manipulação de mercado, branqueamento de capital e infidelidade. E lançou a crítica ao Conselho Superior da Magistratura: “O CSM encomendou que uma acusação fosse carimbada”.

Como é que uma instrução poderá ser devidamente ponderada nestas condições? Se dividíssemos isto por 360 dias, daria 138 ficheiros por hora, incluindo os tais que têm 300 ou 400 páginas.”

MP mantém todos os arguidos e acusações

Logo no primeiro dia de debate instrutório, o Ministério Público anunciou que, após a fase de instrução, mantém todos os crimes que constam na acusação e pediu assim que todos os arguidos deste processo sejam julgados. “Podemos concluir que existem indícios suficientes para que todos os arguidos sejam sujeitos a julgamentos nos exatos termos da acusação”, sublinhou a procuradora Olga Barata.

Já no segundo dia de debate instrutório, falaram os representantes dos assistentes. E o primeiro foi o advogado Nuno Vieira, que representa mais de 1300 lesados no processo BES/GES, e pediu que os bens arrestados fossem “imediatamente vendidos” para indemnizar os lesados. Num elogio, o advogado disse que a acusação do Ministério Público era “tecnicamente irrepreensível”, referiu Nuno Vieira. Mas o advogado não deixou passar as críticas, pelo facto de o Ministério Público ter recusado o estatuto de vítima aos mais de 1300 lesados. E “os lesados ficaram ainda mais chocados com a decisão do Ministério Público, após serem diferidos mais de 1200 estatutos de vítima (diferidos pelo tribunal, com a oposição do MP)”. Durante a fase de instrução, em que o tribunal decide se os arguidos vão a julgamento, ou não, “o Ministério Público não usou, em nenhum momento, a expressão vítima, nem indemnizações”, acrescentou. E continuou: “O Ministério Público nunca mostrou estar preocupado com certos assuntos e concentrou-se apenas em defender a sua acusação”.