O presidente do Comité Olímpico de Portugal denunciou esta quarta-feira o desinteresse do primeiro-ministro relativamente ao olimpismo nacional, revelando que durante nove anos nunca reuniu com António Costa e estendendo as críticas à ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares.

“Tenho pedido aqui aos meus colaboradores, mas isto não é fácil de obter, uma avaliação sobre em que país europeu o primeiro-ministro, durante nove anos, não reúne com o presidente do respetivo Comité Olímpico para fazer uma avaliação da situação desportiva nacional. Porque acompanho os sites de muitos comités olímpicos europeus, e vejo as fotografias. O primeiro-ministro de Portugal não sente essa necessidade“, lamentou José Manuel Constantino.

O presidente do COP defende que ao longo da sua governação António Costa delegou funções nos ministros com a tutela do Desporto — Tiago Brandão Rodrigues, primeiro, e a Ana Catarina Mendes na atual legislatura — e nos secretários de Estados responsáveis pelo setor, nomeadamente João Paulo Rebelo e João Paulo Correia.

Nunca esteve presente numa iniciativa nossa, mas está presente nas iniciativas do Comité Paralímpico. É uma opção política. Claro, é um sinal que está a ser dado, que há uns que são mais importantes do que outros. Não posso ler isto de outra maneira. Eu creio que ele não faz isto por não apreciar muito o presidente do Comité Olímpico, ou achar que o nosso trabalho não é um trabalho que seja útil ao país, [mas] porque, do ponto de vista da hierarquia e da importância das suas opções políticas, isto não é prioridade. Como não é prioridade…”, defendeu.

José Manuel Constantino criticou o facto de António Costa recorrer a “uma rede social privada” para felicitar atletas e federações quando as missões portuguesas conquistam medalhas.

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“O Comité Olímpico, zero. E assim vamos convivendo, porque, de facto, não há sinais evidentes de que isto possa mudar. E, portanto, eu vou terminar os meus dias com a mágoa de não ter sido capaz de alterar este estado de coisas. Mas, pese embora o facto de estar doente e de estar cansado, não me resigno. E enquanto eu puder lutar, lutarei”, disse, visivelmente emocionado.

O dirigente olímpico detalhou que nos quase 10 anos de exercício de funções nunca recebeu “nenhum elogio ou nenhuma palavra de apreço da parte do primeiro-ministro, relativamente às conquistas que os atletas portugueses têm em eventos olímpicos”.

“No Rio de Janeiro [em 2016], eu estava à frente da missão, e a mensagem do senhor primeiro-ministro foi para a vice-presidente [Rosa Mota]. Tem como hábito comunicar e celebrar os feitos desportivos através de uma rede social privada, que não é propriamente, salvo melhor opinião, a escola em que eu fui preparado, do ponto de vista das relações institucionais. Mas, enfim, os tempos são o que são. Eu registo, mas tenho que conviver com esta situação”, reiterou.

José Manuel Constantino estendeu as críticas a Ana Catarina Mendes, a ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, que tutela o Desporto.

“É uma surpresa, porque é, no trato pessoal, uma pessoa muito simpática, muito afável, mas que, até à presente data, não acrescentou qualquer fator de novidade àquilo que são as políticas públicas desportivas. Está muito ligada às questões da igualdade, às questões da inclusão, às questões da paridade de sexos, que fazem um bocadinho parte da agenda neoliberal de muitos partidos políticos europeus, mas isso são questões transversais às políticas sociais”, alertou.

O presidente do COP reconheceu que a sua expectativa quanto a Ana Catarina Mendes “era mais elevada do que aquela que tem sido […] a prestação da ministra”.

Depois, relativamente ao Comité Olímpico, também é uma pessoa completamente afastada. Nós, em várias ocasiões, tivemos a oportunidade de convidar a ministra para os nossos eventos. Nunca aceitou, de tal modo que eu até dei orientações internas que, a partir deste momento, deixa de se enviar convites, porque, naturalmente, creio que há aqui um princípio de respeitabilidade para com o Comité Olímpico de Portugal, que não foi salvaguardado”, vincou.

Constantino disse esperar que “o futuro corrija estas situações” com Ana Catarina Mendes, de modo a que a entidade à qual preside possa ter “uma relação perfeitamente normalizada” com a ministra, da mesma forma que tem com o secretário de Estado, após um início ‘atribulado’.

“Houve aquilo que é conhecido. O senhor secretário de Estado entendeu iniciar o seu périplo pelas organizações desportivas, escolhendo parceiros que, do nosso ponto de vista, não deveriam ser os primeiros. Enfim, creio que o erro está reconhecido, está corrigido. E, portanto, é um assunto completamente encerrado“, declarou.

O dirigente deixou uma palavra de apreço a João Paulo Correia, enaltecendo a cooperação do atual secretário de Estado do Desporto com o COP.

“É uma pessoa que coopera com o Comité Olímpico, partilha com o Comité Olímpico aquilo que entende dever partilhar com o Comité Olímpico, e procura construir as decisões naquilo que diz respeito ao Comité Olímpico, consensualizando com o Comité Olímpico. E, portanto, a avaliação que eu faço, do ponto de vista da relação do atual secretário de Estado com o Comité Olímpico, é positiva”, finalizou.

Constantino responsabiliza Moedas por construção do Museu Olímpico estar parada

Mas não foi apenas António Costa que esteve debaixo das críticas de José Manuel Constantino. O presidente do COP também responsabilizou o presidente da Câmara de Lisboa pelo atraso na construção do Museu Olímpico, revelando esperar que Carlos Moedas encontre tempo para o receber.

[O Museu Olímpico] está parado. Nós pedimos uma reunião ao presidente da Câmara Municipal de Lisboa, o engenheiro Carlos Moedas, que nos remeteu para um vereador. O presidente do Comité Olímpico de Portugal não é recebido por vereadores. Ou é recebido pelo presidente ou não é recebido”, argumentou.

José Manuel Constantino lembrou que o presidente da autarquia lisboeta “quando recebe o Sporting, ou o Benfica, ou o futebol, não manda o vereador recebê-los”.

“Ora, o presidente do COP, no plano protocolar, não está ao mesmo nível, está acima. E, portanto, há aqui uma questão de respeitabilidade. E das duas, uma. Ou há tempo para receber o presidente do Comité Olímpico, e eu terei todo o gosto de falar com o engenheiro Carlos Moedas, ou não há. Se não há, quem perde é Lisboa. Porque acho que isto acrescentava, até pelo espaço museológico em que estamos integrados, valor à própria cidade”, defendeu.

A construção do Museu Olímpico/Casa do olimpismo, ao lado do COP, foi uma das três prioridades elencadas por José Manuel Constantino, em março do ano passado, para o seu último mandato à frente da instituição, notando, na altura, à Lusa, que tinha menos de três anos para concretizar o projeto.

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Estou na expectativa de que um dia haja tempo, haja hora, para tratar o presidente do Comité Olímpico, do ponto de vista protocolar, como aquilo que acontece em qualquer país europeu. Não estou a pedir nenhuma exceção relativamente a Portugal. Enfim, eu não sou propriamente presidente de um clube desportivo, ou de uma federação. E, portanto, o tratamento protocolar que é devido ao presidente do Comité Olímpico de Portugal tem que estar de acordo com aquilo que é o seu estatuto”, vincou.

Constantino ressalvou, no entanto, poder estar a ser injusto com Carlos Moedas, que, “porventura, nem saberá” que o presidente do COP solicitou uma reunião.

“Quer dizer, é lá [com] os serviços, embora eu tenha esclarecido os serviços porque é que lá não ia. E, portanto, em princípio, salvo melhor a opinião, pela experiência que eu tenho destas situações, os serviços deveriam reportar: ‘Está aqui um tipo mal disposto, que diz que não vem, porque o seu presidente não o recebe. Quem é esse tipo? É o presidente do Comité Olímpico de Portugal’. Não sei se isto se passou ou não passou”, concedeu.