O sociólogo Boaventura Sousa Santos publicou este domingo um artigo de opinião no Expresso em que reconhece que “em determinados momentos” pode “ter sido protagonista” de “comportamentos que antigamente não eram vistos como inapropriados”.

Por isso mesmo, o professor universitário lamenta que “algumas pessoas possam ter sofrido ou sentido desconforto” e admite que lhes deve “uma retratação.”

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Sem nunca referir os nomes das mulheres que o acusaram publicamente de assédio sexual e moral (a ativista argentina Moira Millan e a deputada brasileira Bella Gonçalves), Boaventura Sousa Santos diz que “não é sempre fácil perceber conscientemente comportamentos que antigamente não eram vistos como inapropriados”.

Seja como for, faz questão de escrever, a “retratação” não implica “de modo algum” o assumir da “prática de atos graves” que lhe foram “imputados”. Boaventura promete continuar a “defender a dignidade e a integridade” que diz ter construido “ao longo de mais de 50 anos de esforço e dedicação.”

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Apesar de dizer que não está a tentar “justificar comportamentos passados, apenas de verificar algo que pode acontecer e redundar em acções pouco construtivas”, o sociólogo explica que nasceu em 1940, logo é de uma “geração em que comportamentos inapropriados, se não mesmo machistas, quer se trate da convivência ou da linguagem, eram aceites pela sociedade.”

Aludindo ao seu passado de ativista dos “direitos humanos, sobretudo os direitos das mulheres, dos povos indígenas e das minorias mais desfavorecidas no contexto social, cultural, económico ou qualquer outro”, Boaventura diz que reconheceu “há muito” que “umas das dimensões da dominação nas sociedades contemporâneas é o heteropatriarcado”, além de outros “modos de dominação moderna” como o “capitalismo e o colonialismo (racialização dos corpos e das culturas ou de práticas que se desviam da cultura eurocêntrica dominante)”.

Daí que assuma que os intelectuais, como o próprio Boaventura, tenham uma “obrigação especial de vigilância, não só epistemológica como também prática, emocional e interpessoal, de não cair em contradição entre o que defendem teoricamente e as suas atuações concretas nas relações interpessoais e institucionais.”

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E promete “dedicar todos” os seus “esforços” a essa luta. Mas consciente de que, “como em todos os processos interpessoais, há complexidade e excepções” e que “devem ser evitados processos de linchamento e de cancelamento, garantindo os direitos amplamente reconhecidos da justiça democrática.”