As autoridades federais norte-americanas revelaram esta sexta-feira a acusação formal contra o ex-presidente dos EUA Donald Trump no caso dos documentos confidenciais que Trump terá levado para a sua residência pessoal após deixar a Casa Branca.
Na quinta-feira, Trump já tinha recorrido à sua rede social, a Truth Social, para revelar que tinha sido informado pela “administração corrupta de Biden” de que tinha sido formalmente indiciado no “caso do embuste das caixas” — referindo-se às caixas de arquivamento nas quais os documentos terão sido transportados da Casa Branca para a sua residência de Mar-a-Lago, na Flórida.
Na próxima terça-feira, às 15h locais (20h em Lisboa), Donald Trump deverá apresentar-se no tribunal federal, em Miami, para ser formalmente acusado — algo semelhante ao que aconteceu em abril em Nova Iorque, no caso dos pagamentos à atriz pornográfica Stormy Daniels. É a segunda vez em dois meses que o ex-presidente norte-americano estará sob custódia das autoridades para responder às perguntas de um juiz.
A acusação, um documento de 49 páginas que pode ler aqui na íntegra, inclui um total de 37 crimes dos quais Trump é acusado.
O ex-presidente é acusado de 31 crimes de retenção intencional de informação de defesa nacional, que dizem respeito a 31 documentos encontrados pelas autoridades federais na mansão de Trump na Flórida. “Donald J. Trump, tendo posse, acesso e controlo não autorizados sobre documentos relacionados com a defesa nacional, reteve os documentos intencionalmente e não os entregou ao gabinete ou agente dos EUA habilitado a recebê-los”, lê-se na acusação.
Antes, o documento recorda que “às 12h00 do dia 20 de janeiro de 2023, Trump deixou de ser Presidente” e que, “quando saiu da Casa Branca, Trump mandou que várias caixas, muitas delas contendo documentos classificados, fossem transportadas para o clube Mar-a-Lago, em Palm Beach, na Flórida, onde ele mantinha a sua residência”, sendo que “Trump não estava autorizado a possuir ou a reter aqueles documentos classificados”.
De acordo com a lista apresentada, entre os documentos recolhidos da mansão de Trump encontravam-se múltiplos documentos sobre capacidades militares dos EUA e de outros países, e até documentos sobre o armamento nuclear norte-americano, sobre as vulnerabilidades da defesa norte-americana e sobre planos para retaliações a eventuais ataques estrangeiros o território dos EUA.
“Sou inocente”: Donald Trump revela ter sido acusado no caso dos documentos confidenciais
Segundo a acusação, os documentos ficaram guardados em caixas de cartão em diferentes zonas da sua mansão de Mar-a-Lago, incluindo um salão de baile, uma casa de banho, um chuveiro, um escritório, o seu quarto e um armazém.
Além daqueles 31 crimes, Trump é ainda acusado de um crime de conspiração para obstruir a justiça (por ter, entre outras coisas, mudado os documentos de sítio para impedir que fossem encontrados pelo FBI e prestado falsas declarações), um crime de retenção de documento ou registo, um crime de esconder um documento ou registo, um crime de esconder um documento uma investigação federal, um crime de esquema para esconder, e dois crimes de falsas declarações.
Além de Trump, Waltine Nauta, um dos assistentes pessoais do antigo Presidente dos EUA, também é visado na acusação.
O ex-presidente norte-americano enfrenta, neste momento, múltiplos processos na justiça dos EUA. Além deste caso, que envolve os documentos classificados que levou da Casa Branca quando abandonou a presidência, Trump também está a braços com um processo relacionado com o pagamento feito à atriz pornográfica Stormy Daniels para comprar o seu silêncio sobre uma alegada relação sexual entre os dois, e com investigações sobre o papel que desempenhou no incentivo à invasão do Capitólio depois da eleição de Joe Biden.
“Temos um conjunto de leis neste país e elas aplicam-se a toda a gente”
Já depois de o documento ter sido revelado, o procurador Jack Smith, deu uma breve conferência de imprensa em que apelou ao público que leia a acusação na íntegra, para compreender a “gravidade” dos crimes. “Temos um conjunto de leis neste país e elas aplicam-se a toda a gente”, disse Smith.
“A acusação foi votada por um grande júri de cidadãos do distrito sul da Flórida e convido todos a lê-la na íntegra para compreender a abrangência e a gravidade dos crimes. Os homens e mulheres da comunidade de informações dos EUA e das nossas forças armadas dedicam as suas vidas a proteger a nossa nação e o seu povo”, disse o procurador.
“As nossas leis que protegem a informação de defesa nacional são críticas para a segurança dos EUA e têm de ser aplicadas. Violar essas leis coloca o nosso país em risco.”
Trump ataca procurador e diz que Jack Smith o odeia
Durante toda a tarde, o próprio Donald Trump tem publicado dezenas de mensagens na sua conta do TruthSocial — a rede social que criou depois de ser banido do Twitter —, classificando as autoridades americanas como “bandidos” e acusando diretamente o procurador Jack Smith de o “odiar”.
O Presidente Trump atacou também Joe Biden, garantiu que tinha todo o direito a manter documentos do seu tempo na Casa Branca e sublinhou que a descoberta das caixas tinha sido encenada pelo FBI.
Além destas mensagens, Trump partilhou também um conjunto de publicações de apoiantes seus, figuras do Partido Republicano, com um aspeto em comum: o argumento de que a posse de documentos confidenciais por parte de um ex-presidente não é regulada pela Lei da Espionagem (aquela que Trump é acusado de violar), mas sim pela Lei dos Registos Presidenciais.
Nota: artigo corrigido às 23h32 para emendar o número de crimes de que Trump é acusado. São 37, e não 38, como surge na versão inicial deste artigo. É verdade que acusação inclui 38 crimes, mas o 38.º visa apenas o assistente de Trump Waltine Nauta.