As autoridades continuam a empenhar todos os meios disponíveis para tentar detetar o submersível Titan, numa altura em que se estima que a reserva de oxigénio disponível aos cinco tripulantes a bordo poderá já ter chegado ao fim. As equipas de regaste, compostas por membros de vários países, prosseguem as buscas em contrarrelógio e nas últimas horas juntaram-se ao esforço dois ROV (veículo controlado remotamente), incluindo o Victor 6000, um equipamento operado pelo navio francês Atalante e que é capaz de chegar até aos 6 mil metros de profundidade.
Quando o Titan começou a exploração continha uma reserva de oxigénio de 96 horas, prevendo-se que, tendo desaparecido no domingo de manhã, os níveis de oxigénio deveriam esgotar-se pelas 11h (hora portuguesa) desta quinta-feira. No entanto, alguns especialistas lançam dúvidas sobre este limite, apontando que, cientes da necessidade de poupar oxigénio, os tripulantes tenham tomado passos para poupar ao máximo a reserva de que dispunham.
Esta quinta-feira, o especialista em busca e recuperação de submarinos Frank Owen apontou que o valor da reserva de oxigénio é uma “marca” útil para as equipas de resgate, mas lembrou que tem por base um “quantidade nominal de consumo”. No mesmo sentido, o comandante Baptista Pereira, do esquadrão de subsuperfície da Marinha Portuguesa, sublinhou em declarações à Rádio Observador que as 96 horas de oxigénio são uma “referência”. Ao início da manhã dizia estar convencido que os tripulantes ainda teriam “mais 30 a 40 horas de oxigénio”. A estes fatores John Mauger, responsável da Guarda Costeira norte-americana, acrescenta um outro: “O desejo de sobreviver das pessoas também deve ser tido em consideração”.
Rear Adm. John Mauger of the U.S. Coast Guard speaks to TODAY about the latest efforts to rescue the five people on board the missing submersible Titan as it runs low on oxygen.
“People’s will to live really needs to be accounted for, as well,” he says. pic.twitter.com/6FJ3w1Z0Ty
— TODAY (@TODAYshow) June 22, 2023
Na quarta-feira, as autoridades viram motivos para esperança depois de aviões canadianos terem detetado sons subaquáticos perto da zona de buscas. Os ruídos ritmados, que terão registados em intervalos de 30 minutos, levaram a crer que são intencionais e provocados por algum dos passageiros numa tentativa de comunicar, no entanto ainda não foi possível determinar a sua origem.
Para já os especialistas dizem que não é claro se o submersível da empresa OceanGate Expeditions se encontra à superfície — na quarta-feira a área das buscas era do tamanho do estado norte-americano do Connecticut — ou no solo oceânico, junto aos destroços do Titanic. Os cenários implicam tempos de resposta diferentes, uma vez que a localização do submersível à superfície e consequente resgate seria mais fácil e rápido do que se este estiver junto do solo oceânico. Tendo em conta a localização do Titan, estes são os cenários que poderão seguir-se.
Cenário 1: Se as autoridades localizarem Titan à superfície do oceano
Ao longo da semanas as equipas de resgate analisaram uma vasta área à superfície do oceano em busca do Titan. Neste esforço, aviões canadianos P-3 Aurora têm usado sonares, capazes de detetar e identificar objetos que se movem na água e frequentemente usados para encontrar a posição de submarinos inimigos. Estes equipamentos são capazes de detetar os sons produzidos por hélices e máquinas, mas também de emitir pulsos sonoros que ao detetar um objeto retornam à fonte.
Para Frank Owen, do Instituto de Submarinos da Austrália, não restam muitas dúvidas de que os sons subaquáticos detetados por estes aviões provêm do Titan. “Se foram num intervalo de 30 minutos, é muito improvável que possam ter uma origem sem ser humana”, sublinhou em declarações à BBC. O especialista em busca e resgate de submarinos aponta que o facto de os sons subaquáticos terem sido detetados por um sonar próximo da superfície sugere que o submersível pode estar próximo ou mesmo à superfície.
“Abaixo de cerca de 180 metros, a temperatura da água desce muito rapidamente. Isso cria uma camada que o [sinal do sonar] rebate”, explicou Frank Owen, mostrando-se mais confiante num resgate bem-sucedido face à nova descoberta. O especialista lembra também que o facto de um dos cinco tripulantes ser o francês Paul-Henri Nargeolet, que chegou a ser mergulhador da marinha, aumenta as probabilidades de um desfecho positivo, uma vez que terá conhecimento de como alertar as forças que participam na operação de buscas.
Se o submersível estiver de facto à superfície, detetá-lo pode revelar-se um desafio. O Titan tem 6,7 metros, mas apenas uma pequena parte da estrutura ficará visível a cima do nível da água. Ao final da tarde desta quarta-feira, a área das buscas à superfície aumentou e, segundo as autoridades dos EUA, passou a duas vezes o tamanho da área do Connecticut — o estado norte-americano tem uma área de 13.023 km².
Apesar da expansão desta área, o comandante Baptista Pereira, da Esquadrilha da Subsuperfície da Marinha, descarta à partida a hipótese de o Titan vir a ser descoberto à superfície. “Depois de praticamente dois dias e meio de patrulha marítima feita por aviões militares — com gente muito treinada e habituada a detetar submarinos à superfície — não terem avistado o navio à superfície seria muito difícil”, aponta em declarações ao Observador.
O comandante, que soma quase duas décadas e meia de experiência em submarinos, acredita que o mais provável é que o submersível tenha ficado preso no mastro do Titanic e não consiga subir pelos próprios meios. Admite, porém, que se o Titan estiver realmente à superfície, o tempo de resgate será relativamente rápido a partir do momento em que for detetado, apesar de mencionar que é difícil prever uma janela de tempo para o resgate.
Cenário 2: Se as autoridades localizarem o Titan junto ao solo oceânico
Ainda não foi possível determinar a origem dos sons subaquáticos e, para já, ainda é possível que o Titan se encontre junto ao solo oceânico. Neste cenário, e se o submersível não conseguir chegar à superfície pelos próprios meios, as opções são “limitadas”, aponta o professor Alistair Greig, um especialista em submarinos da University College London.
“Apesar de ser possível que o submersível ainda esteja intacto, se estiver a mais de 200 metros de profundidade, há muito poucos navios que possam chegar tão longe, e certamente nenhum mergulhador chegará”, explicou em declarações à BBC. Assim, a forma mais provável para se conseguir levar a cabo a operação em profundidade seria através do uso de cabos, para o puxar.
Nesse sentido, já está na área das buscas o navio Horizon Arctic, que contém um equipamento norte-americano que poderá revelar-se importante: o Flyaway Deep Ocean Salvage System (FADOSS), um sistema de elevação que a Marinha dos EUA ser capaz de carregar até 27.200 Kg — o Titan pesa 10.432 kg — e chegar até profundidades de 6096 m. Com este sistema foi possível, em 2021, recuperar um helicóptero MH-60S que se despenhou no Oceano Pacífico e foi encontrado na costa de Okinawa, no Japão. Mas para colocar este sistema ao serviço é necessário primeiro descobrir a posição do Titan.
As operações de busca e resgate no mar dependem de muitos fatores, entre os quais as condições climatéricas, o estado do mar e a temperatura da água. Certo é que os resgates em profundidade são muito mais complexos do que à superfície. A expectativa é que, se o submersível estiver realmente no solo oceânico, possa ser detetado por um ROV e posteriormente resgatado a tempo. Não seria inédito, uma vez que os EUA já usaram estes equipamentos em missões a profundidades semelhantes. No ano passado, por exemplo, a marinha norte-americana conseguiu recuperar um caça F-35C que se encontrava a uma profundidade de cerca de 12,400 pés (cerca de 3,780 metros) no fundo do Mar do Sul da China, como noticiou na altura o Instituto Naval dos EUA. Na operação foi usado um ROV modelo CURV-21, que prendeu equipamentos especializados e linhas de elevação à aeronave. A operação, porém, não tinha a urgência do resgate do Titan, onde seguem cinco passageiros.
Se o submersível estiver junto ao Titanic, há um meio no local que pode fazer toda a diferença para o detetar: o Atalante, um navio do Instituto Francês de Investigação para a Exploração do Mar (Ifremer) que chegou está quinta-feira ao local e que já colocou ao serviço o ROV Victor 6000, capaz de chegar até aos 6 mil metros de profundidade. É na chegada deste equipamento à área das buscas que o comandante Baptista Pereira deposita grande esperança. Mas “o tic-tac não para”, sublinha, acrescentando que este equipamento vai operar sem pausas.
O robô, que está ligado ao navio Atalante por um cabo de 8,5 km, “não é capaz de erguê-lo sozinho”, segundo explicou o líder das operações navais do Ifremer, que opera a embarcação. Em declarações à Reuters, Olivier Lefort apontou, no entanto, que o robô pode prender o submergível a um navio que tenha a capacidade de o trazer à superfície. É aqui que poderá então entrar em ação o Flyaway Deep Ocean Salvage System, operado pelo navio Horizon Arctic.
O tempo está a esgotar-se. Se o Titan for detetado no fundo do mar, trazê-lo até à superfície será uma operação demorada, uma vez que os destroços do Titanic estão a uma grande profundidade (3.800 metros). “Não sei quanto tempo levaria, mas num cenário operacional normal, acho que leva cerca de duas horas para descer à profundidade e cerca de duas horas novamente [para subir]”, explicou o professor Alistair Greig, da University College London, citado pelo The Guardian. Por outro lado, o especialista David Gallo sublinhou em declarações ao Good Morning Britain que as autoridades devem estar bem preparadas para avançar assim que o submersível for encontrado.
Uma outra dificuldade será o estado em que o Titan será encontrado. Segundo o comandante Batista Pereira, é possível que esteja preso aos destroços do Titanic e que por isso não tenha conseguido subir, uma vez que o submersível tem um sistema para largar pesos que lhe permitia regressar à superfície.
Apesar da possibilidade das reservas de oxigénio já terem acabado, as equipas de resgate prosseguem os esforços num dia “crítico”, como o descreve Guillermo Sohnlein, co-fundador da OceanGate Expeditions que deixou a empresa em 2013. Para já as autoridades garantem que se trata de um cenário de “busca e resgate ativo”.