Portugal estava de cotovelos, punhos, joelhos e pés esmurrados por ter abalroado uma parede. Os jogadores apagaram da memória a qualidade que possuem e que podia ter sido útil para a contornarem e garantirem a passagem aos quarto de final do Europeu Sub-21 com menos sofrimento. No fim da fase de grupos, que superaram com muita sorte à mistura, perceberam que estava ali ao pé uma porta que bastava abrir para terem acesso ao lado de lá. Foi sofrido, mas, pelo menos, a seleção nacional ganhou experiência para o que teria que fazer no primeiro jogo a eliminar na competição.

A Inglaterra ia ser um novo obstáculo hercúleo. A seleção dos Três Leões conseguiu uma fase de grupos perfeita: seis golos marcados, nenhum golo sofrido e venceu todos os jogos — contra Alemanha, Israel e Chéquia — por 2-0, conseguindo o primeiro lugar do grupo C. Portugal, apesar de já haver quem compare esta seleção Sub-21 à seleção A que venceu o Euro 2016, acabou por garantir, nos minutos finais, contra a Bélgica, o segundo lugar do grupo A, beneficiando do empate a um entre Geórgia e Países Baixos.

Uma vitória com apuramento caída (literalmente) do céu: Portugal bate Bélgica e está nos quartos do Europeu Sub-21

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“Os Sub-21 têm posto a fasquia muito alta em termos de qualidade”, disse o selecionador nacional, Rui Jorge, antes da partida onde um triunfo dava não só a possibilidade de acesso às meias-finais, como também valia a qualificação para os Jogos Olímpicos 2024 — assim a França vencesse a Ucrânia. “Se calhar, é por isso que, nesta altura, as opiniões estão um pouquinho condicionadas. Penso que isso tem penalizado os jogadores em relação à sua prestação. Eles têm sido bravos e altamente solidários. A equipa tem lutado imenso e com muito coração, mas, efetivamente, não tem atingido a qualidade de jogo que outrora conseguimos. Não é justo penalizá-los da forma como estão a ser penalizados por isso”.

Nas bancadas do Ramaz Shengelia Stadioni, na Geórgia, os Sub-21 iam contar com a presença de Roberto Martínez. O selecionador nacional A ia assistir a um encontro que não se adivinhava nada fácil para Portugal. “A Inglaterra é uma equipa fantástica e está recheada de excelentes jogadores, que têm funcionado muito bem coletivamente. Tem sido bastante sólida em termos defensivos e muito acutilante em termos ofensivos. Espero defrontar uma grande seleção. Há alguma incógnita sobre o domínio do jogo, mas acredito que seja equilibrado e tenha transições, que podem ser perigosas para cada lado. Pode ser um belíssimo espetáculo”, explicou Rui Jorge.

Portugal manteve o onze que venceu a Bélgica. Na Inglaterra, o treinador Lee Carsley segurou apenas três jogadores (Jacob Ramsey, Noni Madueke e James Trafford) em relação à partida com a Alemanha. Harvey Elliott, do Liverpool, ficou de fora da convocatória devido a um problema familiar.

A exibição da Inglaterra começou por ser estonteante com combinações bem conseguidas ao nível do corredor central que até deixavam o árbitro sem saber onde se posicionar, atrapalhando mais as ações dos jogadores britânicos do que a defesa portuguesa. Um jogador com nacionalidade lusa, mas que joga pela congénere inglesa, Angel Gomes, espalhava elegância na construção. Apesar do domínio da seleção dos Três Leões, João Neves inventou um lance na direita e tirou o cruzamento. Pedro Neto, desenquadrado, finalizou com algum perigo.

Se os jogadores portugueses foram para o Europeu sob efeito de doses reduzidas de vontade, Pedro Neto foi uma necessária injeção de adrenalina. Mesmo que Rui Jorge tenha tomado opções que promovem a anarquia na frente de ataque, tornando-o inconsequente, o jogador do Wolverhampton foi o elemento diferenciador ao longo de toda a competição, o que também não era difícil dada a desinspiração dos outros dois homens que o foram acompanhando em zonas adiantadas.

Defensivamente, a equipa das quinas ia-se fazendo valer da concentração de jogadores numa zona recuada do terreno para travar a Inglaterra. A verdade é que Portugal só sofreu o primeiro remate aos 22 minutos. Os ingleses mostravam paciência e os portugueses davam-lhes tempo para pensarem. Madueke parou, olhou e libertou Gibbs-White na direita. O cruzamento atrasado encontrou Anthony Gordon (34′) que mexeu no marcador.

Até ao intervalo, Francisco Conceição parecia um jogador que teve o pico da sua carreira aos 19 anos quando era treinado pelo pai no FC Porto. Na segunda parte, ofereceu aos presentes uma amostra de tudo o que ainda tem para dar. Portugal canalizou mais o jogo para a direita, onde o extremo começou a ser agressivo ofensivamente, encontrando até formas de se livrar de situações de dois contra um. A seleção nacional tinha mais bola. Faltava encontrar soluções no último terço que não fossem cruzamentos para os quais Fábio Silva não era o ponta de lança mais talhado, muito menos perante centrais como Garner e Harwood-Bellis.

Portugal viveu um momento de expectativa quando Henrique Araújo caiu na área e pediu penálti. O árbitro mandou jogar. A equipa de Rui Jorge estava melhor. Paulo Bernardo entrou bem e conseguiu receber várias vezes receber a bola entre linhas, virar-se para a defesa contrária e carregar jogo. Nesse fluxo, Henrique Araújo cabeceou à barra e, momentos depois, o próprio Paulo Bernardo rematou para com perigo para a baliza de Trafford.

Começava a restar pouco tempo. Pedro Neto teve um livre em posição muito boa para causar perigo. O remate ficou na barreira e esgotaram mesmo aí as hipóteses que Portugal ainda tinha para chegar à meia-final. A vitória por 1-0 vale à Inglaterra a hipótese de poder disputar diante de Israel um lugar na final e recuperar um titulo que não conquista desde 1984.