Quase um ano depois de ter atuado na Altice Arena, Harry Styles regressou a Portugal para voltar a abrir as portas da sua casa, apresentando pela segunda vez o álbum Harry’s House, mas desta vez com o público a triplicar — na noite desta terça-feira, 18 de julho, estiveram cerca de 60 mil pessoas no Passeio Marítimo de Algés, lotação esgotada para receber uma das maiores estrelas do planeta da música pop contemporânea.
A enumeração que se esperava voltou a acontecer: gritos, energia, muita excitação. Era assim o ambiente em Algés muito antes do início do concerto, com enormes filas e fãs a acampar nas redondezas desde segunda-feira. Harry Styles, que começou a carreira nos One Direction e tem conseguido construir um notável percurso a solo, distanciando-se da boyband e criando uma pop sofisticada que o fez conquistar novos públicos, está em estado de graças e numa profunda relação de amor com o público português.
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Para Styles, era o regresso a uma cidade onde já tinha sido feliz, para o penúltimo concerto da sua longa digressão “Love On Tour”. Começou em setembro de 2021 nos Estados Unidos da América e termina no sábado, 22 de julho, em Itália. Naturalmente, houve algumas pausas pelo meio, mas o ritmo tem sido bastante intenso, mesmo para um artista com 29 anos. E isso notou-se neste concerto, com Harry Styles a não conseguir esconder o desgaste provocado pela digressão, visivelmente menos enérgico e interativo do que quando atuou no Parque das Nações.
Depois de as Wet Leg fazerem o concerto de abertura, o ecrã gigante (realmente gigante) acendeu-se para dar as boas-vindas a Harry Styles. E, tecnicamente falando, não podia ser de outra maneira. Com 60 mil pessoas no Passeio Marítimo de Algés, uma grande parte da plateia não terá conseguido vislumbrar o cantor e a sua banda sem ser através do ecrã. As filmagens foram, então, parte essencial da performance — sendo que a tela também se preencheu de animações nalguns segmentos do espetáculo, adornando visualmente as canções do britânico.
“Golden” — do seu segundo álbum a solo, Fine Line (2019) — foi o primeiro momento alto do alinhamento. Com os anos, Styles conseguiu afastar-se da pop mais juvenil e formatada dos One Direction para construir canções aprimoradas. O seu mais recente disco, Harry’s House, vencedor do Grammy de Melhor Álbum do Ano, reflete isso mesmo ao inspirar-se na pop japonesa dos anos 70 e 80, com elementos de funk ou synthpop pelo meio. Falamos de música popular mais madura e requintada, que comprova bem o estatuto do seu autor nesta fase: Harry Styles superou o teste do tempo. Não é apenas um artista fugaz do momento, uma estrela que agora está na berra e que daqui a cinco anos será uma incógnita. O artista já conseguiu renovar gerações no seu público (como bem se confirmou em Algés) e tem tudo para ser uma estrela pop com longevidade.
Embora o som não estivesse perfeito e o cansaço fosse notório, quem comprou bilhete tinha tudo para dar a Harry Styles — e o britânico retribuiu sempre, de forma simpática e acolhedora. “O meu nome é Harry e obrigado por escolherem passar a vossa noite connosco. O nosso trabalho esta noite é entreter-vos, o vosso é divertirem-se, façam por se sentirem exatamente como sempre quiseram”, atirou o artista numa fase precoce do concerto, definindo as regras do jogo logo à partida. “Vamos divertir-nos esta noite, Lisboa.”
Explicando que pretendia fazer algo especial, já que a digressão está prestes a terminar, convocou de novo ao palco Rhian Teasdale e Hester Chambers, as Wet Leg, para uma versão de “Wet Dream” e para interpretar “Daylight”. Em “She”, um tema mais rock, mostrou os seus dotes ao tocar guitarra sobre a cabeça. Já na balada “Matilda”, o refrão envolvente foi cantado enquanto balões em formato de coração voavam pelo Passeio Marítimo de Algés — numa noite onde também não faltaram plumas um pouco por todo o lado. “Vocês têm sido incrivelmente simpáticos, muito obrigado. Tivemos um fim de semana maravilhoso em Lisboa.”
Mesmo que alguma coisa falhe, mesmo que nem tudo esteja a 100%, nada nem ninguém parece conseguir roubar a Harry Styles uma das armas maiores de uma estrela pop, um das características mais notáveis desta em particular: o carisma. Bastava pentear os cabelos para trás ou fazer um olhar para a câmara para que milhares de gritos se fizessem ouvir junto do Tejo. Não era necessário ostentar um figurino tão brilhante para ser evidente que é ele o grande astro, no presente do indicativo, naquela festa, depois dela, hoje, amanhã e assim deverá continuar. O foco de todas as atenções, embora mantivesse sempre uma postura humilde e genuína, distante de qualquer tipo de narcisismo.
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Depois de uma “Satellite” recebida com entusiasmo e de uma calorosa “Late Night Talking”, Harry Styles dirigiu-se às filas da frente. Leu alguns cartazes, deu os parabéns a uma rapariga e deparou-se com um pedido de uma fã, que requeria a sua ajuda para se assumir publicamente. Empunhando uma bandeira LGBTQIA+, Styles pediu à banda uma “música rápida e cintilante”. “Vamos sair do armário, Lisboa! Liberdade para a Júlia, parabéns!”, gritou, perante um enorme entusiasmo da multidão.
Antes de cantar temas como “Watermelon Sugar” e “Grapejuice”, ainda voltou aos tempos dos One Direction para interpretar a célebre “What Makes You Beautiful”, entoada a pulmões cheios por milhares de pessoas. “Fine Line” foi um momento mais contemplativo, mas igualmente precioso. Após uma breve saída do palco, regressou para um encore de quatro canções, já que no alinhamento dificilmente poderiam faltar “Sign of the Times”, “Medicine” e, claro, o seu maior hit neste momento, “As It Was”.
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Antes de encerrar o espetáculo com “Kiwi”, agradeceu mais uma vez o carinho do público. “Vou só cantar mais uma e depois estão livres para ir, podem ir fazer o que quiserem”, atirou para a plateia. A reação foi imediata: um gigantesco, desiludido e prolongado “não”, entoado em uníssono por muitos dos que queriam uma atuação que superasse a hora e 40 minutos que terá durado o concerto. “Vocês mudaram a minha vida e esta tour não foi exceção. Nunca estive tão feliz, quero muito voltar a Portugal e a Lisboa em breve. Vocês foram incríveis esta noite, absolutamente perfeitos.” Pronto, Harry. Obrigado.
Enquanto Styles se despedia, muitos dos que estavam nas filas de trás iam abandonando o recinto já há largos minutos. Os acessos no Passeio Marítimo de Algés tornaram-se tão difíceis (sobretudo em concertos com 60 mil pessoas) que o confrangedor fenómeno de abandonar o estádio minutos antes de o jogo terminar também aqui se tornou um hábito — precisamente no espaço que acolhe tours de estádio, embora não tenha propriamente as condições para isso, sobretudo de visibilidade. Seja como for, a multidão estava a sair da casa de Harry e naquele momento pouco mais importava.