O Tribunal Constitucional (TC) validou, esta terça-feira, a constitucionalidade do decreto do parlamento que descriminalizou as drogas sintéticas e fez uma nova distinção entre tráfico e consumo, na sequência do pedido de fiscalização abstrata preventiva apresentado pelo Presidente da República. Logo após ter sido conhecida a decisão, Marcelo Rebelo de Sousa anunciou que vai promulgar a lei sublinhando que o parlamento divergiu do Governo no “ponto sensível da definição da quantidade de droga detida”.

Na leitura pública realizada no Palácio Ratton, em Lisboa, o juiz conselheiro relator Carlos Medeiros Carvalho anunciou que o “TC decidiu por unanimidade não se pronunciar pela inconstitucionalidade” de normas regulamentares do decreto aprovado pela Assembleia da República em 19 de julho.

A partir de agora, a posse de uma quantidade de droga superior ao consumo médio de dez dias não será criminalizada, se ficar comprovado que a sua aquisição e detenção se destina “exclusivamente ao consumo próprio”.

O TC tinha sido chamado a pronunciar-se sobre a lei depois de, a 17 de agosto, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, ter requerido a este tribunal a “fiscalização preventiva de constitucionalidade” do diploma “por falta de consulta aos órgãos de governo próprio daquelas Regiões”.

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Esta terça-feira, o presidente do TC, José João Abrantes explicou a decisão de não declarar a lei inconstitucional “por entender que, para efeitos do dever de audição prévia, a matéria não se apresenta como envolvendo questões respeitantes às regiões autónomas”, uma vez que Marcelo Rebelo de Sousa tinha justificado o envio com a “falta de consulta” dos órgãos de Governo das regiões autónomas da Madeira e Açores.

O diploma foi aprovado pela Assembleia da República em 19 de julho com os votos a favor do PS, IL, BE, PCP, PAN e Livre, contra do Chega e a abstenção do PSD e dos deputados socialistas Maria da Luz Rosinha, Carlos Brás, Rui Lage, Fátima Fonseca, Catarina Lobo, Maria João Castro, Tiago Barbosa Ribeiro, António Faria e Joaquim Barreto.

Marcelo anuncia que irá promulgar a lei

Logo após a decisão do TC ter sido conhecida, Marcelo Rebelo de Sousa anunciou a promulgação da lei, ainda assim, com reparos. “O Presidente da República, depois de o Tribunal Constitucional ter decidido desatender a posição da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, assim esclarecendo uma questão que importava para a aplicação do diploma, procederá à sua promulgação, mal ele lhe seja remetido, o Decreto que clarifica o regime sancionatório relativo à detenção de droga para consumo independentemente da quantidade e estabelece prazos regulares para a atualização das normas regulamentares”, pode ler-se no sítio oficial da Presidência da República.

Apesar da decisão de promulgar, Marcelo Rebelo de Sousa chama a “atenção para o facto de a Assembleia da República ter divergido do Governo no ponto sensível da definição da quantidade de droga detida por quem tenha de ser considerado mero consumidor ou efetivo traficante”.

Em 17 de agosto, quando enviou esta lei para o TC, o chefe de Estado não deixou de manifestar também “reservas sobre uma questão de conteúdo, e na linha do entendimento que já vem dos tempos do Presidente Jorge Sampaio, considerando, agora, em particular, a especial incidência dos novos tipos de drogas nas Regiões Autónomas, o regime sancionatório nelas adotado e a regionalização dos serviços de saúde, fundamentais para a aplicação do novo diploma”.

No requerimento enviado então ao Tribunal Constitucional, Marcelo Rebelo de Sousa reforçou a necessidade de as regiões autónomas serem auscultadas sobre este diploma, porque, para além de possuir uma “relevante dimensão administrativa”, acarreta também “sérias implicações de saúde pública, com reconhecidas especificidades regionais”.

O chefe de Estado argumentou ainda que, na elaboração dos dois diplomas que são alterados por este decreto-lei, e que foram aprovados em 1993 e 2000, se procedeu à audição dos governos das regiões autónomas.

A Madeira tinha solicitado, no início de agosto, ao chefe de Estado que não promulgasse a nova lei da droga, alegando “violação da Constituição da República Portuguesa”.