A Transtejo já adjudicou o contrato para o fornecimento dos nove sistemas de baterias para equipar a frota de navios elétricos. O vencedor é, sem surpresa, a Astilleros Gondán, a empresa que construiu os navios elétricos e a quem a Transtejo já tinha tentado adjudicar as baterias, mas num procedimento por ajuste direto que mereceu um chumbo do Tribunal de Contas.
A mais recente adjudicação à empresa asturiana foi confirmada ao Observador por fonte oficial da empresa. O contrato foi assinado a 7 de setembro e já foi remetido ao Tribunal de Contas, acrescenta a Transtejo, confirmando o valor de 15,999.750 milhões de euros (praticamente os 16 milhões de euros do preço base do concurso). Este montante equivale a mais quase meio milhão de euros que o contrato chumbado pelo TdC já este ano — 15,5 milhões de euros — e que tinha como contraparte a mesma empresa.
O valor da adjudicação está residualmente abaixo (250 euros) do preço base fixado para o concurso que foi lançado em julho já pela nova administração da empresa, num contexto internacional de subida de preços. Para além da Astilleros Gondán, concorreu a este concurso mais uma empresa, a Oceânia, uma startup portuguesa que surge associada aos autocarros elétricos.
Prevê-se que a entrega dos sistemas ocorra entre o final de outubro e junho de 2024 — há já alguns navios construídos à espera destas baterias nos estaleiros para seguirem rumo a Lisboa onde só chegou o primeiro que foi comprado já com bateria. Mas o calendário final vai depender da concessão de visto prévio pelo Tribunal de Contas, assinala fonte oficial da Transtejo.
A recusa do Tribunal em dar visto ao primeiro contrato feito com a Astilleros Gondán, acompanhada de duras acusações à forma como a administração da empresa geriu o processo de adjudicação — comparando-a à compra de carros sem motor —, levaram a administração da Transtejo a apresentar a sua demissão. A ex-presidente da empresa, Marina Ferreira, vai ser ouvida esta quarta-feira na comissão parlamentar de Economia e Obras Públicas, a pedido de vários partidos, incluindo o PS, sobre a aquisição de navios elétricos e de baterias pela Transtejo. Na quinta-feira será a vez da nova gestão da operadora liderada por Alexandra Carvalho.
Na conferência de imprensa em que justificou a sua saída em março, Marina Ferreira defendeu a legalidade e a fundamentação económica das decisões tomadas sobre o atribulado processo de renovação de frota, que desde 2019 já sofreu vários contratempos e atrasos. Assumindo a responsabilidade por algumas destas situações, a gestora desabafou também que era “muito difícil fazer inovação na administração pública”, numa referência aos procedimentos e exigências de contratação pública.
“Não nos revemos minimamente no que o Tribunal de Contas diz e achamos que o que fizemos foi bem feito, e razoável do ponto de vista da gestão e promoveu o interesse público. Mas assumimos na totalidade a responsabilidade das decisões que tomamos, apresentámos hoje de manhã o nosso pedido de exoneração.”
Marina Ferreira já admitia então que a solução para a compra dos sistemas de baterias, essenciais à operação os novos navios elétricos, passaria por um concurso público, mas avisava que o vencedor seria com toda a probabilidade o mesmo — porque os navios foram concebidos pelos estaleiros para responder aos requisitos específicos pedidos pela Transtejo à Astilleros Gondán, não existindo unidades comparáveis no mercado.
Estações de carregamento são outro contratempo
A Transtejo já tinha tentado comprar diretamente as baterias ao fornecedor da empresa das Astúrias, sem sucesso, tendo por isso optado por realizar um ajuste direto com os estaleiros, classificado como um adicional ao contrato original. Para o Tribunal de Contas, este contrato é nulo por causa de ilegalidades que resultam da alteração do resultado financeiro do contrato inicial, uma vez que o ajuste direto para a compra das baterias é indissociável do contrato original para a compra de 10 navios elétricos com os Astilleros Gondán. O contrato original incluía apenas o fornecimento de um sistema de baterias, deixando para outro procedimento a compra das restantes nove.
No contraditório a este acórdão, a Transtejo invocava o acréscimo de custos das baterias face ao concurso original, a indisponibilidade do fornecedor original e a não existência de alternativas compatíveis para realizar o ajuste direto.
O fornecimento de baterias é um dos contratempos que tem atrasado a chegada dos novos navios à Transtejo, investimento anunciado em 2018, mas que ainda não terá data para o arranque da operação. Mas não é o único. Em agosto, a empresa admitiu ao Observador, quando questionada sobre o processo de instalação das estações de carregamento das baterias nos quatro cais principais de operação fluvial, que os equipamentos não ficarão operacionais antes do próximo ano.
Se os navios elétricos adjudicados sem incluir logo as baterias podem ser comparados a automóveis sem motor, o que está em causa corresponderá na comparação às estações de abastecimento de combustível e a necessidade de obtenção de licenças e certificações de várias entidades, que não foi considerada no concurso para escolha do fornecedor.