Da direita à esquerda, nenhum partido concorda com as medidas apresentadas pelo Governo para aliviar o aumento dos encargos das famílias com o crédito à habitação. A crítica em uníssono é de que vêm tarde, mas muitos partidos atiram-se ao facto de não haver qualquer responsabilização da banca.
Luís Montenegro foi um dos primeiros a reagir e criticou o facto de as medidas virem “tarde”, mas foi mais longe para sublinhar que o Governo poderia ter aproveitado as propostas da sociedade civil e dos partidos políticos para melhorar o pacote de medidas. Reconheceu que uma das medidas era parecida com uma proposta do PSD, porém explicou que esta pretendia a suspensão da aplicação do juro na parte excedente por dois a cinco anos e que o intuito era que esse valor fosse pago no final dos empréstimos.
“Esta medida é melhor do que nada, mais vale tarde do que nunca. Mas parece limitativa, dá ajuda para limitar o crescimento da componente dos juros, mas implica a compensação se opere daqui a dois anos”, explicou o presidente do PSD, frisando que “não é expectável que situação seja assim tão mais favorável daqui a dois anos” — a proposta do Governo é para adiar o pagamento por dois anos, sendo que a compensação só será paga daqui a seis.
“Não quero ter um discurso negativista, mas parece-me que isto é pouco e muito limitativo. Parece-me que o Governo devia ter ouvido as forças na sociedade e os partidos políticos”, acrescentou, sublinhando que “o PSD apresentou uma proposta de peito aberto e ofereceu-a ao Parlamento” — um pacote que acabou chumbado pela maioria.
André Ventura, por sua, acusou Governo de “falta de preparação” e, em declarações aos jornalistas, afirmou que as medidas aprovadas no Conselho de Ministros foram “tomadas tardiamente” e “não vão mudar o grosso do aumento que já houve para trás”, além de “não resolverem a questão das rendas”.
Para o presidente do Chega, o “Governo falha em trazer medidas que já deviam ter sido implementadas e ter um caráter retroativo porque deveriam apontar para o futuro e salvar famílias que estão a sofrer efeitos devastadores do aumento dos juros”. E considera também que o Governo devia ter apostado em medidas para as rendas.
O líder do Chega explicou que “o Governo estabelece e define uma moratória que portugueses terão de responder e pagar dentro de dois anos” e defendeu que estabelecer este prazo “é tornar a vida dos portugueses um inferno”. “O Governo está sempre a empurrar os problemas com a barriga”, acusou.
Por fim, reiterou a ideia de que o Governo “não transmite para a banca nenhum dos encargos fundamentais” destas medidas, dizendo que as mesmas são apenas um “paliativo” que “não resolve o problema”.
“Isto não é de esquerda nem de direita. Durante 10 anos os portugueses sustentaram com os seus impostos a sustentabilidade da banca, este era o momento em que não deviam ser os impostos dos portugueses a sustentar o apoio ou a moratória, deviam ser os lucros excedentários da banca a sustentar uma parte desses apoios e o Governo não teve coragem de fazer isso”, argumentou.
Até à publicação deste artigo, não houve qualquer reação de Rui Rocha ou de outro dirigente da Iniciativa Liberal às medidas apresentadas pelo Governo para mitigar os efeitos do aumento dos juros nos créditos à habitação.
Imoral favor à banca, acusa esquerda
À esquerda, Bruno Dias, deputado do PCP, disse ser uma “evidência que quem vai agradecer as decisão são os donos e administradores dos bancos”. Aos olhos do PCP, as opções agora tomadas pelo Governo são “insuficientes e injustas”, mas também “pecam por tardias”.
“A opção foi proteger e defender a banca que já está a ganhar 11 milhões de euros por dia”, atirou, frisando que “pagamentos são adiados e terão de ser pagos integralmente mais tarde”. Bruno Dias reiterou ainda que estas medidas significam “poupança zero para as famílias e lucros por inteiro para os bancos”.
Mariana Mortágua, coordenadora do Bloco de Esquerda, assinou por baixo: “Quem ganha e quem perde com medidas anunciadas?” “A resposta é bastante simples: as pessoas saem a perder e a banca ganha.”
A bloquista argumentou que as pessoas ficam a perder nos juros bonificados porque “os contribuintes estão a ser convocados a subsidiar lucros da banca” e que a proposta de adiamento das prestações “coloca um problema” porque a prestação pode ser mais baixa durante dois anos, mas depois é preciso “pagar a dívida mais tarde”.
“Os devedores vão ter de pagar a sua prestação mais toda a dívida que foi acumulada. Esta proposta não é uma solução, é uma nova dívida para as famílias que a única garantia que tem é que lucra vai continuar a lucrar”, resumiu, argumentando que as propostas “não resolvem problemas, pelo contrário”, e que “o grande objetivo do Governo” parece ser “salvaguardar os lucros da banca”.
Inês Sousa Real, líder do PAN, considera que as medidas do Governo, “para além de tardias, são uma mão cheia de nada, poucochinho”. Também em declarações aos jornalistas, a deputada frisou que “a banca continua intocável” e com “lucros inaceitáveis”.
“É imoral que os portugueses que deram mão à banca vejam medidas do Governo que deixam na mão da banca a possibilidade de negociação em termos que reconhecemos”, realçou, criticando uma “campanha propagandística do Governo”, composta por “medidas insuficientes e [que] não dão resposta à inflação nem ao crescimento galopante das taxas de juro”.
Rui Tavares acredita que as propostas do Governo estão “muito aquém da escala do problema” e ficou com a “sensação” de que o PS e Governo creem que “é só preciso ir vendo, ir fazendo, ir começando a fazer quando o pior do tsunami está aí”.
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“Oposição centrada em criar mais confusões”
Depois da reação dos partidos da oposição, coube a Eurico Brilhante Dias fazer a defesa da honra da bancada socialista. O líder parlamentar do PS elogiou as medidas apresentadas pelo Governo e criticou a oposição por não ter a capacidade de apoiar algumas das decisões.
“É com pena que registo que alguns partidos da oposição em vez de subscreverem algumas destas iniciativas não só não criticam BCE pelas suas decisões, de forma errada, de aumentar as taxas de juro, como atacam o Governo por apoiar os portugueses”, realçou o socialista.
Brilhante Dias reiterou que o Governo apresenta “soluções” e que a “esmagadora maioria dos partidos da oposição continua centrada em criar mais confusões”.
O líder parlamentar do PS sublinhou que o Governo já adotou medidas no passado e justificou que o pacote aprovado no Conselho de Ministros surgiu no âmbito do último aumento das taxas de juros, atirando ainda aos sociais-democratas dizendo que “o BCE voltou a aumentar pela 10.º vez com grande apoio da direita, em particular do PPE de que faz parte o PSD e CDS”.