O então Presidente Aníbal Cavaco Silva ficou retido em Praga, na República Checa, não tendo tido alternativa senão percorrer os 1.738 quilómetros de asfalto até Barcelona de autocarro. Já a então chanceler da Alemanha, Angela Merkel, sofreu um ligeiro desvio no regresso dos Estados Unidos da América (EUA), tendo acabado por aterrar em Lisboa e sido recebida por José Sócrates, na altura primeiro-ministro. A erupção do vulcão Eyjafjallajokull, em 2010, causou um verdadeiro pesadelo no espaço aéreo europeu, provocando o maior cancelamento de voos desde a Segunda Guerra Mundial, com cerca de 900 mil suspensos. Poderá o cenário repetir-se se acontecer o mesmo com o Fagradalsfjall, situado na península de Reykjanes?

É essa a questão que paira na cabeça de muitos especialistas, no seguimento da atividade vulcânica dos últimos dias entre Sundhnúkur e Grindavík, no sudoeste da Islândia, a continuar perto da capital, Reiquiavique, que obrigou a acionar o estado de emergência na sexta-feira e a prever o pior.

No sábado, o Gabinete Meteorológico Islandês alertou para um risco “considerável de erupção“, dizendo que tal “pode acontecer a qualquer momento nos próximos dias”. Isso porque os milhares de sismos sentidos desde então — tendo só esta segunda-feira ocorrido cerca de 900 — são decorrentes do rio subterrâneo de magma, com cerca de 15 quilómetros, que se dirige para a superfície, estando apenas a 800 metros de romper o solo.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Vulcão na Islândia em erupção iminente. Centenas de sismos por dia, cidade evacuada, estradas e terra abriram fendas

Tal levou à retirada dos cerca de 4.000 habitantes da cidade piscatória, tendo esta já sofrido diversos danos, com a abertura de fendas nas estradas e terras. No entanto, as autoridades permitiram que os habitantes regressassem às suas casas para ir buscar alguns pertences e os animais de estimação.

Enquanto isto, cresce na população a preocupação sobre se a atividade deste vulcão já atingiu o pior cenário ou se será, de alguma forma semelhante, ao que entrou em erupção em 2010 ou até mesmo ao de 1738, que dizimou um quinto da população islandesa.

Quanto à primeira opção, o professor Bill McGuire, da University College London, acha pouco provável que o impacto seja tão elevado como o da extensa nuvem de cinzas que causou o cancelamento de milhares de voos e prejuízos entre 1,5 e 2,5 mil milhões de euros. Isto porque tal só acontece quando o vulcão entra em erupção ao largo da costa e depois desagua no mar. Já, neste caso, “tudo depende do local onde o magma atingir a superfície”, apontou à BBC.

Grindavík está muito próxima da posição da nova fratura e a sua sobrevivência está longe de estar assegurada. A situação não parece boa para os habitantes da cidade”, revelou.

Da mesma opinião é o vulcanólogo Dave McGarvie, da Universidade de Lancaster. À Sky News, disse que as consequências do vulcão Eyjafjallajokull foram uma “combinação rara, se não única, de fatores”, não tendo esta erupção “a capacidade de produzir nuvens de cinzas” dessa dimensão. Por outro lado, garantiu que, se tal cenário se repetisse, as aprendizagens que ficaram do anterior levariam a que apenas cerca de um terço dos voos em comparação aos de 2010 fossem cancelados.

Já no que diz respeito ao vulcão de 1783, que durou oito meses e produziu extensas nuvens de enxofre que pairaram durante cinco meses sobre o norte da Europa — que, segundo a BBC, causou um arrefecimento de 1,3ºC nos dois anos seguintes —, “não é algo provável neste momento”.

Quem o diz à BBC é Evgenia Ilyinskaya, investigadora que costuma estar em contacto com geólogos no terreno. “Na sexta-feira e no sábado, parecia preocupante que pudéssemos ter algo dessa escala. Nesses raros, mas grandes eventos, é claro que isso teria enormes implicações para a qualidade do ar no hemisfério norte”, explicou, acrescentando que os dados que surgiram no domingo e na segunda-feira mostraram que a erupção deverá ser “mais pequena do que se pensava”.

Islândia prepara-se para erupção vulcânica após série de abalos e um tubo de magma de 10 km

Apesar de já ter sido descartada a grandeza da erupção, o mesmo não acontece com o perigo que os gases libertados pela mesma podem trazer para a Islândia. Tal como Mike Burton, vulcanólogo da Universidade de Manchester, explicou ao National Geographic, uma erupção no mar “geraria muitas cinzas e gases tóxicos, bem como vapor e mais atividade explosiva”, o que não seria um risco internacional, mas sim para o próprio país.

Nos últimos três anos, houve três erupções na península de Reykjanes, perto do vulcão Fagradalsfjall, tendo a mais recente ocorrido em julho deste ano, como explica o The Guardian. No entanto, todas elas aconteceram longe de infraestruturas importantes ou de zonas habituadas, sendo que até ao primeiro incidente, em 2021, a localidade estava adormecida há oito séculos.