A Bélgica retirou um pedido de detenção emitido contra um ministro do Qatar no âmbito da investigação anticorrupção conhecida como Qatargate, para facilitar uma negociação sobre a libertação de reféns europeus no Irão, noticiaram sexta-feira vários meios de comunicação.
Fonte ligada ao processo confirmou à agência France-Presse (AFP) esta intervenção a favor do ministro do Trabalho do Qatar, Ali bin Samikh al-Marri, revelada sexta-feira pelo canal RTBF e pelo diário Le Soir.
“Houve um gesto da Bélgica em relação ao Qatar, foi uma carta a jogar para tentar remover os preconceitos que corriam o risco de impedir a libertação de reféns europeus pelo Irão”, sublinhou esta fonte, sem especificar qual o papel que Doha acabou por desempenhar nestas libertações.
Até agora apenas tinha sido mencionada a intervenção do Omã como “facilitador” entre Bruxelas e Teerão.
O gesto belga a favor do ministro do Qatar remonta a maio, quando o governo negociou em segredo com o Irão a libertação de Olivier Vandecasteele, um trabalhador humanitário belga detido sem motivo em fevereiro de 2022 em Teerão, cuja situação comoveu todo o país.
A libertação ocorreu em 26 de maio, após quinze meses de detenção, em troca da entrega ao Irão de um diplomata iraniano condenado na Bélgica por terrorismo, Assadollah Assadi.
Uma semana depois, em 2 de junho, a Bélgica acolheu no seu território três outros reféns europeus repatriados do Irão, tendo as autoridades belgas revelado que o muito controverso regresso de Assadi incluía outras considerações, para além da simples libertação de Vandecasteele.
O Ministério Público Federal belga conduz há vários meses uma investigação em larga escala sobre alegadas tentativas do Qatar de influenciar as decisões económicas e políticas do Parlamento Europeu, pagando grandes quantias de dinheiro ou oferecendo presentes a pessoas que ocupam uma posição política ou estratégica dentro e perto do hemiciclo europeu.
Marrocos também surge nesta investigação, com uma possível tentativa de corrupção liderada pela sua agência de inteligência — DGED — e pelo seu embaixador na Polónia, Abderrahim Atmoun.
Qatar e Marrocos negaram veementemente nos últimos meses que estivessem na origem de qualquer esquema de corrupção.
Esta investigação conduziu em dezembro de 2022 a uma onda de detenções e à apreensão em Bruxelas de malas e sacos contendo 1,5 milhões de euros em dinheiro, sendo que o nome do ministro do Trabalho do Catar foi rapidamente citado.
Ali bin Samikh al-Marri é uma das personalidades do Qatar ao lado da qual a grega Eva Kaili e vários outros eurodeputados apareceram no outono passado, durante o Campeonato do Mundo de Futebol no Qatar, para elogiar os desenvolvimentos neste país do Golfo em termos de direitos dos trabalhadores.
Kaili está entre meia dúzia de acusados no Qatargate depois que grandes somas de dinheiro terem sido descobertas em sua casa.
Segundo o Le Soir, um mandado de prisão internacional foi emitido contra o ministro do Qatar em março e suspenso dois meses depois. A RTBF, por sua vez, menciona o levantamento, em maio, de um “aviso vermelho” da Interpol, que lhe permite viajar para o estrangeiro sem risco de ser preso.
“Pareceu claro que este mandado de detenção representava um problema entre a Bélgica e o Qatar, colocando em risco a possibilidade de o Qatar interceder no caso dos reféns”, acrescentou a fonte ligada ao processo.
O Qatar e o Irão, que há muito que têm a Arábia Saudita como rival comum, mantêm uma estreita relação económica e diplomática.
No passado, Doha já interveio como mediador com Teerão para a libertação de reféns ocidentais.