Jornalistas de vários títulos da Global Media, apontaram esta quinta-feira, em Lisboa, ataques, ingerência e casos de “terrorismo” por parte da Comissão Executiva do grupo e pediram aos governantes que olhem pelo setor.
Os profissionais falavam no 5.º Congresso dos Jornalistas, num painel, moderado por Filipe Santa Bárbara (TSF), dedicado a órgãos de comunicação social em situação vulnerável. “Nunca vivi uma situação em que a ameaça viesse de dentro”, relatou Alexandre Panda do Jornal de Notícias (JN), lembrando que já antes de setembro do ano passado se ouvia falar nos corredores que o jornal estava “na iminência de ser comprado por um fundo sem rosto”, referindo-se ao World Opportunity Fund (WOF).
Ainda assim, “como a esperança é a última a morrer”, os jornalistas aguardaram “para ver o que aí vinha”, até receberem um comunicado no qual a Comissão Executiva da Global Media disse querer criar condições para um novo projeto estratégico “garantindo pleno respeito” pela identidade histórica das marcas.
“O objetivo era ótimo. Dias depois começou a instabilidade, a incerteza e as ingerências que todos conhecemos. Isto é terrorismo. É diário”, assinalou.
Por sua vez, Mário Fernando, jornalista da TSF, disse que este é o “maior ataque à comunicação social” dos últimos anos e lamentou que a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) tenha olhado para este caso tanto tempo depois.
“Porque é que um fundo mais ou menos obscuro quer uma coisa com a qual não vai ganhar dinheiro?”, questionou, lembrando que os jornalistas da TSF “não vão recuar na sua missão”.
Para o jornalista, o que está em marcha é o fim de um projeto editorial, exemplificando que era o mesmo que uma equipa de futebol entrasse em campo com seis dos 11 jogadores, o que não é possível, uma vez que são precisos, no mínimo, sete. “O que a Comissão Executiva pretende é que a TSF não se apresente a jogo”, acusou.
Frederico Bardón do jornal O Jogo descreveu a realidade da publicação como “muito difícil”, falando de uma “sobrecarga tremenda”. Os jornalistas desta marca têm 32 páginas diárias para fazer, o que seria impossível sem os colaboradores, disse. “Temos muita dificuldade em entender como se procede a um despedimento coletivo sem terem perguntado a qualquer jornalista se quer mudar de meio de comunicação. Estranhamos que tenham sido contratados jornalistas para outras publicações e que não haja dinheiro para pagar aos jornalistas da casa“, lamentou.
A representar os trabalhadores do Dinheiro Vivo, Luís Reis Ribeiro referiu ser impossível acompanhar uma “economia em mutação” com apenas 10 jornalistas dedicados a esta área. “Parece que há interesse na inteligência artificial, mas vai ser sem mais inteligência natural, que é a nossa”, referiu.
Luís Reis Ribeiro terminou a sua intervenção sublinhando não trabalhar “para um acionista ou empresa”, mas para leitores, ouvintes e telespetadores.
João Pedro Henriques do Diário de Notícias (DN) lançou o repto à classe política, lembrando que “a bola” está também desse lado. “O jornalismo é ou não um bem essencial? Sem jornalismo a democracia morre na escuridão. Poderá a classe política fazer a gentileza de pensar numa nova lei de mecenato? […] Que nenhum [partido] se atreva a fazer da nossa situação arma de arremesso na campanha. Mantenham a compostura. Este é o combate das nossas vidas. Respeitem”, vincou.
Trabalhadores do Jornal de Notícias e O Jogo vão suspender contratos de trabalho
Os plenários dos trabalhadores do Jornal de Notícias e do desportivo O Jogo resolveram ativar a suspensão de contratos de trabalho, por falta de pagamento de salários, segundo dois comunicados hoje divulgados.
O World Opportunity Fund (WOF), que controla a Global Media, transmitiu a sua indisponibilidade em transferir dinheiro para pagar os salários em atraso até uma decisão da ERC — Entidade Reguladora para a Comunicação Social e de um “alegado procedimento cautelar”, disse esta quinta-feira o presidente do Global Media Group (GMG), em comunicado.
Fundo que controla Global Media não paga salários até decisão judicial e da ERC
Entretanto, depois, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) disse que a questão do pagamento de salários no Global Media Group (GMG) “não tem absolutamente nada a ver” com o regulador.
Em declarações à Lusa, a presidente do Conselho Regulador da ERC, Helena Sousa, disse que “a ERC está a desenvolver dois procedimentos”, um relativo “ao regime da transparência e um outro conjunto de averiguações” e que “vai continuar a fazer o seu trabalho de acordo com os prazos que estão a decorrer”.
Pagamento de salários da Global Media “não tem nada a ver” com a ERC, diz presidente
O 5.º Congresso dos jornalistas, que decorre sete anos após a última edição, vai abordar temas como ética, condições de trabalho, ensino, memória e financiamento dos media.
Este evento, que termina no domingo, é promovido pelo Sindicato dos Jornalistas (SJ), Casa da Imprensa e Clube dos Jornalistas.