“Vidas Passadas”

A primeira longa-metragem da sul-coreana Celine Song é uma séria candidata ao título de filme mais recatado, púdico e anti-melodramático sobre uma relação amorosa frustrada. Os dois protagonistas, Nora e Hae Sung, grandes amigos e colegas de escola em Seul, que se separaram aos 12 anos, quando a família da rapariga emigrou para o Canadá, indo ela depois já adulta para Nova Iorque, só se encontram uma vez em 24 anos de afastamento, e Song não permite que deem um beijo que seja (sexo, nem sombra). Vidas Passadas labuta sobre temas como a possibilidade (ou não) de retomar amores antigos, as consequências de decisões que tomamos ou abdicamos de tomar, ou o confronto entre a predestinação e a escolha livre, e o anseio romântico (representado por Hae Sung) e o realismo pragmático (representado por Nora). Já vimos isto em séries como Normal People ou no quarteto de filmes de Richard Linklater iniciado com Antes do Amanhecer, só que Vidas Passadas, além do uso narrativo que faz das novas tecnologias, é de uma contenção expressiva e um decoro muito asiáticos (tanto, que por vezes roçam o exasperante) e recorre a conceitos budistas para enformar a sua história de amores não concretizados, numa época em que a norma é a sua satisfação. Não admira que a torneira das lágrimas só se abra mesmo no final (leia aqui a crítica e aqui uma entrevista com a realizadora).

“Baan”

Leonor Teles, a realizadora de Baan, ficou sem casa quando estava a rodar o filme, pelo que se poderia esperar que este (cujo título significa, precisamente “casa” em tailandês) iria abordar as dificuldades das pessoas da sua geração em arranjar um lugar para viver. Mas, por um lado, ela já havia feito uma curta-metragem em que toca no assunto, Cães que Ladram aos Pássaros, e pelo outro, L. (Carolina Miragaia), a protagonista, uma jovem arquiteta, tem onde morar. Pelo que ficamos com um filme feito em Lisboa com passagem por Banguecoque, cuja identidade formal parece influenciada por cineastas asiáticos como Wong Kar-Wai ou Hou Hsiao-Hsien, e que recorre à estenografia visual do desconcerto existencial e da confusão íntima para procurar falar das interrogações, dos medos e das contrariedades de uma geração que começa a enfrentar os problemas concretos e complicados da vida, embora as coisas fiquem vagas e inconclusivas e haja mais gesticulação que substância. Existe ainda uma personagem tailandesa deslocada, que corporiza a alienação das raízes e a ânsia de encontrar um lugar no mundo onde encaixemos e nos sintamos bem e inteiros. O filme sente-se também na obrigação de ir picar o ponto das causas em voga do ativismo, dando-lhe um viés ideológico que até era dispensável.

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“O Pior Homem de Londres”

O novo filme de Rodrigo Areias, rodado no Porto e em Viana do Castelo, que fazem as vezes de Londres, conta a história do anglo-lusitano Charles Augustus Howell, nascido no Porto em 1840 de pai inglês e mãe portuguesa. Já adulto, Howell instalou-se em Londres, onde se tornou numa figura importante junto dos artistas do movimento Pré-Rafaelita, tendo sido secretário e agente do influentíssimo autor e crítico e historiador de arte John Ruskin, bem como do pintor e poeta Dante Gabriel Rossetti, e ainda consultor de negócios do escritor homossexual e masoquista Algernon Swinburne. Howell ganhou também reputação de mentiroso, manipulador, falsificador e chantagista, capaz de explorar as necessidades, vícios e fraquezas” das pessoas com quem se envolvia, tendo inspirado Arthur Conan Doyle para criar o vilão do conto de de Sherlock Holmes A Aventura de Charles Augustus Milverton, um negociante de arte inescrupuloso (pode ler a crítica aqui).