A histórica livraria Ferin, em Lisboa, que encerrou recentemente, tem novo inquilino e vai reabrir com outro negócio, após obras de melhoramento que não comprometem as características arquitetónicas e decorativas originais, disse esta quarta-feira o vereador da Cultura de Lisboa.
A 3.ª Comissão Permanente da Assembleia Municipal de Lisboa reuniu-se para ouvir o vereador Diogo Moura, no âmbito da petição “Pela Salvaguarda da Livraria Ferin”.
Sobre o primeiro ponto desta petição, relativo às alterações ao imóvel, o vereador tratou de esclarecer que estando a Livraria Ferin inscrita na categoria de loja histórica e artística, o que pressupõe a conservação das suas características originais, a proteção patrimonial está salvaguardada.
“Já existe um novo contrato de arrendamento e todas as premissas vão ser cumpridas”, garantiu Diogo Moura, adiantando que não pode revelar por enquanto de quem se trata, comunicação essa que será feita pelo próprio ou pelos proprietários daquele espaço, a família Germano Sousa.
O que a autarquia não pode fazer é “salvaguardar os negócios”, porque estes ou são viáveis ou não são, afirmou, esclarecendo que “a distinção dada pela Câmara Municipal de Lisboa [Lojas com História] salva o espaço, mas não salva o negócio”.
Segundo o responsável, o anterior inquilino – o grupo detentor da Ler Devagar — saiu por vontade própria e a Câmara Municipal de Lisboa (CML) tentou “intermediar uma solução que mantivesse a identidade e as características do espaço”, como era interesse do atual proprietário.
Este não é um caso em que houve denúncia do contrato por parte do proprietário. Houve saída por parte dos inquilinos, por dois motivos: porque tinha uma dívida avultada de centenas de milhares de euros e porque abriu uma nova livraria no Bairro Alto e decidiu apostar nesse espaço, que a câmara também está a apoiar”, afirmou.
O grupo ainda tentou encontrar um parceiro que assumisse a totalidade da dívida, mas “era muito elevada e não se conseguiu”. Segundo o vereador, era interesse do proprietário “manter todos os elementos arquitetónicos e decorativos”, da fachada e interiores, e manter o mesmo negócio.
Então, através da RELI — Rede de Livrarias Independentes, foi lançado um convite a vários editores e livreiros para saber se algum grupo estaria interessado no espaço.
Diogo Moura disse que apenas um manifestou interesse e “houve uma tentativa” de concretizar o negócio, mas acabou por se mostrar inviável, por um lado, porque implicava assumir a dívida e, por outro lado, porque está demasiado perto de uma Fnac, o que representa um risco enorme em termos de concorrência.
Foi assim que surgiu a procura para um outro negócio que respeitasse o espaço, e esse contrato já está feito: “O negócio não é de livros, mas terá uma área dedicada a livraria. Haverá também a melhora de alguns elementos”.
Sobre esta intervenção, o que o vereador pôde adiantar foi que há materiais que vão melhorados, mobiliário que não é antigo, que vai ser modificado e melhorado, e um chão tapado com cimento que vai ser recuperado, deixando o soalho original à vista.
Além disso, “vai haver livros”, mas não será o negócio principal, não terá o CAE de livraria. Simplesmente, o novo inquilino “vai aumentar e ampliar para fazer jus à história de livraria deste espaço”.
No dia 21 de dezembro, a Ler Devagar anunciou o encerramento da livraria centenária por incapacidade de fazer face às dificuldades financeiras, contabilísticas e de vendas dos últimos anos. A livraria já enfrentava problemas financeiros quando foi adquirida em 2017 pela Ler Devagar, o projeto livreiro fundado por José Pinho (1953-2023).
Localizada no Chiado, a Ferin tem o selo de “Loja com História”, um programa de salvaguarda do comércio tradicional lançado pelo município de Lisboa, mas que não foi suficiente para a continuidade da livraria.
Para a Ler Devagar, o processo de recuperação não sobreviveu a várias circunstâncias, nomeadamente à pandemia de Covid-19, aos confinamentos e à morte do livreiro José Pinho, em maio passado.
Desde então, além da incapacidade de superar os problemas financeiros e contabilísticos da Ferin, “as suas vendas caíram drasticamente” e a livraria “entrou num ciclo do qual já dificilmente recuperaria, seguindo o exemplo de tantas outras lojas da Baixa que foram obrigadas a fechar portas”.
No texto da petição, o Fórum Cidadania Lx assinalou que desde que a livraria fechou, os milhares de livros que a recheavam “terão já sido removidos”.
“Como é do conhecimento da Câmara Municipal de Lisboa e da Assembleia Municipal de Lisboa, o espaço físico da Ferin (fachada, montras, móveis) é muito bom e por isso está abrangido não só pela Carta Municipal do Património anexa ao PDM [Plano Diretor Municipal] em vigor (item 48.102), como pelo Plano de Pormenor de Salvaguarda da Baixa Pombalina, e pela Baixa Pombalina classificada Conjunto de Interesse Público desde 2012”, sublinha.
Além disso — acrescenta -, a Livraria Ferin é “classificada Loja Com História pela CML, fazendo parte do seu núcleo fundador de 2015, não só pela sua valia histórica e patrimonial (imóvel e móvel) mas também porque uma cidade sem livrarias é algo impensável”.
Por esses motivos, alegam que “importa proteger e incentivar as livrarias a que não desistam ou que não as despejem, como aconteceu no passado recente com as livrarias Portugal e Aillaud & Lellos, por exemplo”.