Especialistas de Medicina Interna de 29 países de língua portuguesa e espanhola apelaram esta quinta-feira para o envolvimento dos médicos e de todos os profissionais de saúde na luta global contra as causas das alterações climáticas e da degradação ambiental.
O apelo feito por 32 sociedades médicas, colégios e associações da especialidade de Medicina Interna de 29 países, que totalizam uma população de cerca de 785 milhões de pessoas, foi tornado público num documento de consenso intitulado “Recomendações dos Serviços de Medicina Interna Luso-Espanhóis no Combate às Alterações Climáticas e à Degradação Ambiental”.
A Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (SPMI) salienta em comunicado que “este é o primeiro consenso na área científica que reúne as duas comunidades de língua espanhola e portuguesa“.
No documento, publicado em simultâneo na “Revista Clínica Española” da Sociedade Espanhola de Medicina Interna e na revista “Medicina Interna”, órgão oficial da SPMI, os médicos alertam para “o impacto negativo na saúde das alterações climáticas e da degradação ambiental”.
Apelam também para a “cooperação das organizações de saúde para intervir conjuntamente nestas questões” e para a implementação de boas práticas de sustentabilidade ambiental no exercício das atividades de saúde.
Esse compromisso envolve também a sensibilização dos profissionais de saúde e da população, a promoção da educação e da investigação nesta área e “a resiliência dos sistemas de saúde para responder à transição epidemiológica em curso e ao maior risco de eventos inesperados”.
O combate às desigualdades, a proteção das populações mais vulneráveis e a adoção de comportamentos que protejam o ambiente são outros desafios lançados no documento, que tem como primeiro autor o médico internista português Luís Campos, presidente do Conselho Português para a Saúde e Ambiente (CPSA) e da Comissão de Qualidade e Assuntos Profissionais da Federação Europeia de Medicina Interna.
As organizações apelam também para o reforço da capacidade dos serviços de Medicina Interna, que consideram “uma especialidade nuclear para capacitar o sistema de saúde para responder a estes desafios”.
Os fatores ambientais são atualmente responsáveis pela morte de 13 milhões de pessoas por ano – cerca de 20% do total de mortes em todo o mundo, contribuindo para o aumento das doenças cérebro-cardiovasculares, do cancro do pulmão, da doença pulmonar obstrutiva crónica, asma e alergias.
“Com as mudanças na ecologia dos vetores, as doenças transmitidas por esses agentes estão a aumentar, causando mais de 700 mil mortes anuais“, lê-se no documento, que sublinha que as zoonoses (doenças transmitidas por animais) estão em crescimento, sendo responsáveis por quase 100% das pandemias.
As doenças relacionadas com a água causam mais de 3,4 milhões de mortes por ano e as doenças transmitidas pelos alimentos causam 420.000 mortes no mundo, adianta, acrescentando que os “perigos climáticos, meteorológicos e hídricos foram responsáveis por 50% de todas as catástrofes e 45% das mortes notificadas desde 1970”.
“Mais de 10 milhões de pessoas perderam a vida devido às graves secas do século passado e, em cada ano, mais de cinco milhões de mortes podem ser atribuídas a temperaturas extremas”, destaca o artigo, alertando para o facto de estes problemas afetarem particularmente as populações mais vulneráveis.
Para os especialistas, este é “o desafio mais complexo que a humanidade enfrenta”, exigindo uma nova governação à escala global, mas também a colaboração de todos, a todos os níveis, enquadrados pelo conceito de one health, em que a saúde humana, dos animais e das plantas são interdependentes.
“Os profissionais de saúde, como defensores dos doentes, mas também como cidadãos, têm a obrigação ética de se envolver nesta luta global, da qual depende o futuro das próximas gerações”, defendem.