Os jovens são hoje mais abertos e liberais no que toca à vivência da sexualidade, mas normas sociais conservadoras continuam a influenciar os seus comportamentos, conclui doutoramento realizado na Universidade de Coimbra, em colaboração com a Universidade de Lisboa.

A tese debruçou-se sobre o “duplo padrão sexual”, um conceito há muito estudado pela academia e que se baseia nos tradicionais papéis e estereótipos sexuais de género, definindo a norma (heterossexual) segundo a qual um homem, quando tem muitas relações e parceiras, “é sempre bem visto”, já a mulher que adota o mesmo comportamento é “sempre mal vista”, afirmou à agência Lusa a investigadora Helena Amaro, que procurou perceber se este padrão se mantém entre jovens universitários portugueses e de que forma se manifesta nas suas relações sexuais e na sua saúde sexual.

Na sua tese de doutoramento em psicologia, defendida em janeiro, a investigadora desenvolveu grupos focais constituídos por estudantes de duas cidades, com o objetivo de analisar a perceção dos jovens sobre “diferenças entre homens e mulheres” na forma como vivem a sua sexualidade.

“Eu nunca tive de perguntar sobre normas. Elas vieram quase automaticamente”, contou à Lusa Helena Amaro, sublinhando que “a sexualidade é vivida de maneira diferente, porque há uma norma implícita que sugere que uns e outros devem vivê-la de maneira diferente”.

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A ideia de que as mulheres procuram relações mais estáveis e são mais afetivas ou emocionais, enquanto o homem é mais sexual e não deve manifestar a sua emocionalidade, mantém-se, referiu.

Apesar de notar que “há papéis a cair” e que “há uma feminilidade mais ativa, que toma iniciativa”, os estereótipos resistem, tal como resiste o duplo padrão sexual, constatou.

A investigadora recordou que num dos grupos focais foi referido algo como: “Se soubermos que uma colega é muito rodada, não nos quereremos relacionar com ela, sob pena de sermos também vistas como ‘bad girls'”.

Segundo Helena Amaro, o duplo padrão observa-se também na forma como as mulheres exprimem a sua sexualidade dentro da relação, podendo “ficar mais inibidas, pelo receio da imagem que possam passar para o parceiro”.

“Há receio de que o próprio parceiro as possa ver como menos respeitáveis”, acrescentou.

A repressão daquilo que lhe poderá dar satisfação por medo do impacto negativo para a sua imagem leva à possibilidade de ausência de negociação daquilo que dá prazer à mulher, sobretudo em contexto de relações ocasionais, sublinhou.

De acordo com a investigadora, a mulher parece continuar a sentir a pressão para adotar uma posição mais subordinada, dando o exemplo do sexo oral, que é assumido como “uma obrigatoriedade, goste-se ou não”.

E “se há obrigatoriedade, não há prazer”, salientou.

Já os homens, podem sentir-se pressionados a assumir uma sexualidade hiperativa, com o objetivo de proteger uma reputação masculina tradicional, constatou.

Apesar disso, o poder do género e do duplo padrão tem diminuído, afirmou.

As atitudes mais liberais do que conservadoras acabam por ser corroboradas através do inquérito realizado a 481 indivíduos para a mesma tese, em que os jovens “manifestaram abertura a falar de relações sexuais”.

No entanto, e apesar da crescente preferência por padrões sexuais liberais e igualitários, os jovens “temem a regra” e esse medo “faz com que se conformem com determinados padrões de conduta que não são saudáveis”, sublinhou.

“O medo das consequências sociais e reputacionais faz com que estes jovens, ainda que sejam liberais e tolerantes, se conformem, em determinados momentos”, acrescentou, vincando que essa resignação condiciona o acesso de mulheres e homens a uma sexualidade livre, segura e satisfatória.

Para Helena Amaro, podia-se pensar que o conceito do duplo padrão sexual, desenvolvido nos anos 1950 nos Estados Unidos da América, estaria ultrapassado, “mas não está” continuando a interferir na sexualidade e saúde sexual dos jovens.