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A Polícia Judiciária (PJ) está a realizar buscas na Câmara Municipal de Cascais, presidida por Carlos Carreiras. A notícia foi avançada pela revista Sábado e entretanto confirmada pelo presidente da câmara de Cascais. A operação está relacionada com uma fábrica de máscaras cirúrgicas criada na altura da pandemia de Covid-19.

Em declarações aos jornalistas, o autarca admitiu não ter ficado surpreendido com a operação. Lembrou que o Tribunal de Contas tinha questionado a transparência do negócio, que implicou a venda de três imóveis (dois armazéns e um terreno) da câmara a preço de custo a uma empresa chinesa com quem a autarquia tinha uma parceria para fabricar máscaras anti Covid-19. Garantiu ainda que foi o “único responsável” por todo o processo, afastando um eventual envolvimento de Miguel Pinto Luz, à época vice-presidente da autarquia e agora ministro das Infraestruturas e Habitação, que na altura chegou a dar a cara pelo projeto.

O Expresso revelou esta quarta-feira, citando uma fonte da autarquia, que ainda não foram constituídos arguidos no âmbito do processo. “A PJ esteve na Câmara na manhã de quarta-feira e levaram tudo o que entenderam”, disse a mesma fonte.

A fábrica de máscaras para a Covid-19 foi criada em 2020 com equipamento importado da China. Teve um investimento inicial de 500 mil euros. Na altura, o vice-presidente de Cascais, Miguel Pinto Luz, disse que a autarquia queria estar “um passo à frente” da doença e que o investimento pretendia “uma capacidade de produção de mais de cinco milhões de máscaras por mês, com um custo de produção por unidade que é metade do melhor preço praticado pelo mercado”.

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Covid-19: Cascais aposta na produção de máscaras e já vende a outros municípios

Fomos a única câmara a produzir máscaras e a distribui-las gratuitamente pelos munícipes“, recordou fonte da autarquia ao Expresso, acrescentando desconhecer existência de “qualquer denúncia” e quais as “as suspeitas que motivaram as buscas”.

No ano passado, o Tribunal de Contas (TdC) divulgou os resultados da auditoria para apuramento de responsabilidades financeiras, concluindo que o negócio não foi devidamente justificado. O relatório, a que o Público teve acesso na altura, apontava que a escolha da empresa ShiningJoy — detida pela Dimalu-KV Investements e ligada à empresária de Macau Emily Kuo Vong — não foi transparente, “desconhecendo-se os fundamentos de facto e de direito que a sustentaram” já que “a mesma não detinha experiência naquela área de negócio.” O preço também era abordado no relatório. Os três imóveis terão sido avaliados em mais de 1,9 milhões e a autarquia conseguiu fechar negócio por 1.750.000 euros.

Carlos Carreiras de “consciência tranquila”

O presidente da Câmara de Cascais explicou que as buscas decorrem em quatro locais do município: nos Paços do Concelho, no edifício São José, no chamado Cascais Center e na empresa municipal que, na altura, geriu o processo da fabricação das máscaras. O autarca revelou também que os agentes da PJ lhe pediram o telemóvel, que entregou “prontamente” e já lhe foi entretanto devolvido.

Questionado sobre o papel de Miguel Pinto Luz, agora ministro das Infraestruturas e Habitação, no processo de compra e fabrico das máscaras, Carlos Carreiras rejeitou o seu envolvimento. Referiu que, devido ao confinamento, era o único que podia circular no cumprimento das suas funções e que acompanhou pessoalmente o processo. “O único responsável sobre esta matéria sou eu”, sublinhou.

Carreiras garantiu estar a colaborar com as autoridades e que não está preocupado com a operação da PJ em curso: “Estamos de consciência tranquila porque não cometemos nenhuma ilegalidade.”

Leitão Amaro recusa comentar caso Pinto Luz. “A Justiça deve funcionar e fazer o seu trabalho”

O ministro da Presidência recusa ainda comentar as buscas conduzidas na Câmara Municipal de Cascais que envolvem, alegadamente, Miguel Pinto Luz, novo ministro das Infraestruturas e Habitação.

“Não temos qualquer informação sobre diligências que estejam a decorrer para além daquilo que é veiculado pela comunicação social. Temos de aguardar por esclarecimentos. A Justiça deve funcionar e fazer o seu trabalho”, afirmou esta quarta-feira durante a conferência de imprensa de apresentação do Programa de Governo.

“Não é de todo compreensível” a argumentação apresentada, acusa a Iniciativa Liberal de Cascais

A Iniciativa Liberal (IL) de Cascais considerou, entretanto, “preocupantes as buscas” na autarquia, referindo que podem estar relacionadas com a venda dos armazéns onde funcionava a fábrica à empresa que instalou e produziu as máscaras. “Não sendo possível neste momento ter certezas em relação às razões que levaram às buscas nesta Câmara, a Iniciativa Liberal Cascais relembra que, após a pandemia, o processo de venda dos armazéns onde funcionava a Fábrica das Máscaras não acautelou o interesse dos munícipes”, pode ler-se numa nota enviada às redações.

A IL de Cascais refere ter votado contra a deliberação da câmara que aprovou a venda dos armazéns à mesma empresa que instalou e produziu as máscaras, “sem nenhuma avaliação de mercado desses imóveis, nem nenhuma fundamentação dos motivos pelos quais não são os mesmos alienados em hasta pública”.

“Na realidade, a Câmara Municipal de Cascais (CMC) parece ter escolhido como critério para a determinação do valor de venda em 2021 simplesmente o mesmo valor pelo qual adquiriu os armazéns em 2020, apesar de as condições de mercado serem claramente diferentes”, acusa a IL Cascais.

Segundo o partido, a CMC terá ainda argumentado que, “entre os motivos da venda à sociedade SHININGJOY, se encontrava o facto de esta empresa ter uma parceria com a empresa municipal Cascais Próxima E.M. S.A. para a produção de material de proteção individual devido à pandemia”.

Além de que a empresa SHININGJOY tinha “larga experiência na fabricação deste tipo de material, de ter dotado as instalações com mais quatro máquinas para produção de material de proteção individual e ter criado 30 postos de trabalho”. “Não é de todo compreensível este tipo de argumentação no qual se parece ter dado preferência a um determinado comprador com base apenas na relação de parceria que existe entre o mesmo e uma empresa municipal”, explicou a IL.