Os movimentos Porta a Porta e Vida Justa consideram que a Estratégia para a Habitação anunciada pelo novo Governo trata o tema “como mercadoria” e realçam que a intensificação da construção não resolverá a crise.

Em comunicado, o Porta a Porta, movimento pelo direito à habitação, refere que a Estratégia para a Habitação anunciada pelo Governo (PSD-CDS/PP) na sexta-feira revela “ausência de respostas estruturais” para resolver a crise no setor.

Na perspetiva do movimento, o executivo olha para “a habitação como mercadoria, visando o lucro e não a resolução dos problemas que se vivem”.

O Governo “não parece ter […] como intenção resolver o problema da habitação, mas antes responder aos interesses do setor da construção e do imobiliário”, concorda o Vida Justa, movimento que contesta o aumento de preços na habitação e nos transportes e reivindica melhores salários.

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“O programa do Governo não responde à maioria da classe trabalhadora, que, no nosso país, tem salários abaixo dos mil euros, mas antes aos setores sociais que têm mais dinheiro e que podem comprar casa e ter incentivos fiscais para isso”, explicita Rita Silva, em nome do Vida Justa, numa resposta escrita à Lusa.

“O acesso à habitação, para ser efetivo desde já, necessita de forte regulação do mercado, adequando-o ao rendimento do trabalho em Portugal e parando o investimento estrangeiro na habitação”, sustenta o movimento.

Também o Porta a Porta lamenta a não regulação do preço das rendas, recordando que “o arrendamento significa cerca de 20% do mercado imobiliário nacional e é determinante na vida dos que menos têm e menos podem”.

Sobre as despesas com os créditos à habitação, o Porta a Porta realça que o problema não é o pagamento do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) no ato da compra, “é o pagamento mensal da prestação ao banco”, pelo que reivindica “medidas que visem pôr os lucros da banca a suportar a redução das prestações”.

O movimento, que tem em curso a Petição Pelo Direito à Habitação em Portugal, contesta ainda a reversão da Contribuição Extraordinária sobre o Alojamento Local e da caducidade das licenças (sendo que a atribuição de novas passa a voltar a estar na competência dos municípios). No seu entendimento, as medidas favorecem “os interesses da especulação privada […], abrindo a porta a mais alojamento turístico”.

Simultaneamente, o Porta a Porta critica o Governo por nada dizer “sobre a calamidade dos despejos” e exige a proibição dessas ações, no que é acompanhado pelo Vida Justa, que refere que os despejos “têm aumentado fortemente desde a pandemia” e exige “uma moratória”.

O Porta a Porta destaca como positivas, na estratégia do Governo, “as intenções anunciadas no plano do alojamento estudantil”, esperando que se concretizem antes do próximo ano letivo.

Já o Vida Justa concorda com o objetivo de acelerar a construção de habitação social, ainda que com dúvidas, por antecipar um “risco elevado” de a medida resultar em “habitação social de má qualidade”.

O movimento defende que a habitação social e cooperativa que venha a ser desenvolvida deve estar integrada na malha urbana da cidade e incluir infraestruturas, serviços e equipamentos fundamentais.

“Recusamos que a população trabalhadora seja cada vez mais afastada da cidade, encafuada em bairros sem qualidade construtiva, periferizada, com longas distâncias entre casa e trabalho”, assinala.

O Governo quer facilitar a construção “sem a condicionar à obrigatoriedade de ser, de facto, habitação acessível e enquadrada no ordenamento do território”, concorda o Porta a Porta, recordando que “Portugal não tem um problema de falta de habitação”, mas sim de “casas vazias”.

O movimento lamenta, por isso, o recuo do Governo ao reverter a medida do arrendamento coercivo, incluída no pacote Mais Habitação, aprovado pelo anterior Governo socialista e em vigor desde 7 de outubro.