A vigília à luz de velas no Parque Victoria de Hong Kong para assinalar a repressão de Tiananmen em 1989 foi substituída este sábado, pelo segundo ano consecutivo, por uma festa patriótica organizada por grupos pró-Pequim.
A vigília, realizada durante vários anos, assinalava a intervenção sangrenta do Exército de Libertação Popular chinês na praça icónica de Pequim, em 4 de junho de 1989, para pôr termo a manifestações pró-democracia.
Em junho do ano passado, 26 grupos pró-Pequim organizaram um carnaval patriótico no local para assinalar o aniversário da entrega da antiga colónia britânica à República Popular da China, em 1 de julho de 1997.
O evento deste ano, inaugurado no sábado à tarde (hora local), tem a Federação das Organizações Comunitárias de Hong Kong-Cantão como um dos 28 coorganizadores.
Numa reflexão publicada na sexta-feira no semanário diocesano Sunday Examiner, o cardeal Stephen Chow recordou o “acontecimento que despedaçou vidas há mais de três décadas”. Chow convidou “a olhar para ele com os olhos do amor incondicional de Deus, que perdoa mesmo àqueles que não têm a coragem de o pedir”.
Exortou ainda os habitantes de Hong Kong a ultrapassarem a “tristeza e o ressentimento” causados pelo acontecimento em prol da “reconciliação e da cura”.
O massacre de Tiananmen, que vitimou pelo menos centenas de jovens, é conhecido como o “Incidente de 4 de junho” na China, onde a discussão sobre o acontecimento é fortemente censurada. Na sua coluna, o cardeal Chow não utilizou as palavras “Praça de Tiananmen” ou “massacre”, referindo-se apenas ao “acontecimento” de há 35 anos, segundo a agência espanhola EFE.
Depois da entrega à China, Hong Kong tornou-se o único território chinês onde o aniversário do massacre era assinalado publicamente, mas a cada ano as autoridades chinesas redobraram esforços para silenciar qualquer memória do dia sangrento.
A Aliança de Hong Kong em Apoio aos Movimentos Patrióticos Democráticos da China realizou vigílias anuais à luz de velas no Parque Victoria para recordar as vítimas da repressão, até serem suspensas em 2020, devido à pandemia de Covid-19.
Após a detenção dos seus líderes Chow Hang-tung, Albert Ho e Lee Cheuk-yan por suspeita de incitamento à subversão, o grupo pró-democracia dissolveu-se em setembro de 2021 e, desde então, as autoridades não autorizaram as tradicionais celebrações.
A polícia de Hong Kong deteve na terça-feira seis pessoas, incluindo um antigo organizador da vigília, por alegadamente terem publicado mensagens sediciosas nas redes sociais. As detenções foram as primeiras conhecidas ao abrigo da nova lei de segurança nacional, aprovada em março pelo executivo de Hong Kong.
A nova legislação é complementar à lei imposta por Pequim em 2020, na sequência dos grandes protestos e motins pró-democracia que ocorreram na cidade em 2019.
O texto inclui penas até à prisão perpétua para os crimes de traição, insurreição, espionagem, sabotagem e interferência externa, e alarga a definição do crime de sedição para incluir o ódio às autoridades comunistas.
A reforma gerou um intenso debate e críticas por parte dos governos democráticos e das organizações ocidentais, que temem uma “nova era de autoritarismo” no território.
Hong Kong foi integrado na China com o estatuto de região administrativa especial ao abrigo do princípio “um país, dois sistemas”, que deveria garantir um elevado grau de autonomia e de liberdade durante 50 anos.
O território vizinho de Macau, administrado por Portugal durante vários séculos, foi integrado na China em 1999, também como uma região administrativa especial.