Por mais gozões, pseudo-subversivos, “desconstrutores” do género, militantemente “meta” e desbocados que os filmes de super-heróis possam ser, como acontece com os da série Deadpool, com Ryan Reynolds, no final, nunca nos conseguem surpreender ou ser atrevidamente originais. Há sempre um super-vilão (ou super-vilã) que quer tomar conta do universo ou então destruí-lo; e os super-heróis, por mais quezílias que tenham uns com outros ou por mais desavindos que estejam entre si, acabam por unir forças e super-poderes para os enfrentar, destruir e salvar o universo.

É o que volta a acontecer em Deadpool & Wolverine, de Shawn Levy, que promove o encontro entre o sarcástico anti-(super) herói do uniforme vermelho e negro e o mais carismático dos X-Men (ou, para ser mais preciso, um dos muitos Wolverines alternativos do multiverso, já que o “oficial” morreu em Logan, de James Mangold, em 2017), interpretado por Hugh Jackman. Promovendo ao mesmo tempo, no Universo Cinematográfico Marvel (UCM), a fusão entre o filme de super-heróis “sério” e com pretensões a dizer coisas “importantes”, representado pelo mutante com dedos de aço, com a comédia desbragada de super-heróis, representado pelo parodiante das espadas de samurai e da boca de esgoto.

[Veja o “trailer” de “Deadpool & Wolverine”:]

Como mandam as velhíssimas regras do filme sobre o encontro de opostos, seja ele uma comédia romântica, seja ele uma história de ação ou uma super-produção da Marvel ou da DC, os protagonistas vão dar-se mal, discutir e andar às turras (no caso de Deadpool e Wolverine, a espetarem-se um ao outro com as lâminas de que ambos dispõem), antes de se entenderem e começarem a funcionar em conjunto. No caso desta dupla, têm que o fazer para derrotarem a super-vilã de piquete, Cassandra Nova (Emma Corrin), a irmã gémea maléfica do Professor Charles Xavier dos X-Men, que vive no Vácuo entre os vários universos paralelos. Ela quer deitar as mãos a um engenho que interfere no tempo, construído à socapa pelo vilão menor da fita, Paradox (Matthew Macfadyen), para transformar tudo num imenso Vácuo.

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[Veja uma entrevista com Hugh Jackman e Ryan Reynolds:]

A laboriosa e destrambelhada história (isto para quem não está a par das intrincadas jigas-jogas narrativas do UCM) de Deadpool & Wolverine contempla ainda vários subenredos relacionados com a vida pessoal e as angústias íntimas das duas personagens principais. E até tudo ficar resolvido, há combates sangrentos e ribombantes em câmara lenta, acompanhados por canções completamente deslocadas do contexto violento; muita auto-derisão, humor negro, quebra da quarta parede e um sem-parar de obscenidades, incluindo insultos à Disney, à Fox e à Marvel por parte de Deadpool; bastante agonizar interno e remoer de remorsos por parte de Wolverine; um descarado plágio (assumido, vá lá…) de Mad Max, aparições sortidas de outros super-heróis e uma batalha urbana com dezenas de Deadpools alternativos.

Um destes é o Nicepool hipster e woke (também interpretado por Ryan Reynolds), com um cãozinho fofo chamado Dogpool, que é o melhor e mais bem achado componente cómico desta fita, que parece já ter sido escrita e realizada com recurso à Inteligência Artificial e que sem dúvida irá encher as medidas do seu público-alvo e os cofres dos seus produtores. Mas quem tiver uma noção de entretenimento cinematográfico que não se compagine com a de Deadpool & Wolverine, terá que o ir procurar noutro sítio.