A Caixa Geral de Depósitos lucrou, no primeiro semestre, 889 milhões de euros, confirmando a entrega de mais 300 milhões de dividendos ao Estado. O que totaliza a entrega, por conta do exercício de 2023, 825 milhões de euros.
Segundo salienta Paulo Macedo, presidente da Caixa, “devolve” o dinheiro da capitalização que a Caixa teve de fazer em 2017 e que levou o Estado a por o dinheiro no banco público. O presidente do banco já tinha admitido esta entrega quando apresentou os resultados no primeiro trimestre.
No primeiro semestre de 2023, os lucros tinham sido de 608 milhões.
Paulo Macedo explica que estes dois anos a pagar dividendos extraordinários liga-se à “situação especial de querer reembolsar os contribuintes” por essa capitalização. À medida da geração de resultados e à medida que são melhores vamos decidir” o pagamento a fazer. Também se relaciona com o facto de em 2023 e 2024 os resultados estarem a ser melhores do que os perspetivados. Mas o futuro reservará, antecipa, “estabilidade na política de dividendos. Dentro de um quadro em que também se adeque aos rácios de capital”.
Os dividendos, concretiza, “dependerão do valor resultados, dos níveis de capitalização, da vontade acionista, dos buffers que a Caixa precise, e da autoridade de supervisão. Ninguém pensa que este tipo de resultados a este nível se vai manter eternamente”. Há ciclos económicos, realça para recordar que o retorno dos capitais no ciclo iniciado em 2017 está em 9,1%, mas num ciclo mais longo, reportando-se desde 2011, o ROE é de 1,2%, avisa. Os dividendos também dependem dos ciclos. “Se houver grande redução de resultados os dividendos tenderão a ser menores, exceto se os rácios forem tão alto que haja distribuição reservas”.
Várias variáveis dependerão. Paulo Macedo garante, no entanto, que a entrega de dividendos estes dois anos foi iniciativa da Caixa e, em particular no final do ano passado, “não foi pedido esforço adicional à Caixa, o esforço que fez no ano passado foi bastante adequado em termos de cash como edifício – que permite uma pequena reforma ou revolução e possibilidade sinergias na administração pública ao mais alto nível”. E realça que em teoria os resultados do segundo semestre serão inferiores aos do primeiro “face ao ciclo da baixa da taxa de juro”, mas “se não houver nada de anormal é natural que se possa ultrapassar os do ano passado”.
Segundo dados da Caixa, o capital gerado e distribuição foi, desde 2019, 2,2 mil milhões de euros, mas o retido atingiu os três mil milhões de euros.
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No final do ano passado, o Estado exigiu a três empresas públicas entregas adicionais de capitais. A Caixa garante que não lhe foi exigido nada, ainda que tenha dado (em dinheiro e em imóveis) 713 milhões de euros. E já este ano pretende entregar mais 300 milhões, adicionando-os aos 525 milhões já entregues.
O mesmo não aconteceu por exemplo com a Águas de Portugal, da qual a Caixa ainda detém uma posição acionista. Paulo Macedo não comentou especificamente essa situação da Caixa, nem o eventual aumento de capital que a empresa se preparava para fazer este ano e que o Governo travou. “Não interferimos, não gerimos e queremos alienar”, assume o presidente da Caixa, dizendo que estes ativos “não ocupam o nosso tempo de gestão, exceto nas decisões obrigatórias”, mas que o objetivo é “deixar de ter ativos [destes] no balanço”. Para o presidente da Caixa, o banco “não deve ter participações não financeiras”, que “não fazem parte da atividade da Caixa”. “Não temos nada a ver com a gestão, não somos consultados. A nossa vontade é não ter participações financeiras e podermos ter a aplicação desse valor na atividade bancária e não neste tipo de atividade”. Lembrou que essas participações já implicaram mais de 500 milhões de prejuízos para a Caixa. “Tinha havido intenção de compra da Parpública [da posição da Águas de Portugal], iremos ver o que vai acontecer”.
E foi no âmbito dessa política de não ter participações não financeiras e não core que a Caixa alienou há uns anos a posição na Inapa. Sobre este processo, Paulo Macedo recusou-se a dizer se o banco ainda tem alguma exposição creditícia na Inapa, realçando que “se houvesse não afetaria o balanço”. E a este propósito voltou a afirmar que “não queremos na gestão da caixa participações em que não temos nada a ver com a gestão, não core, não financeiras, que não nos adiantam nada. A Inapa foi alienada, da mesma maneira que queremos alienar outras participações. Não são tempos dos bancos estarem a adquirir ou manter participações não core”.
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Garantia pública é positiva, mas falta ver condições
Os bancos estão a afinar todos pelo mesmo discurso. A garantia pública que o Governo tenciona disponibilizar para até 15% do valor da casa é positiva, mas falta ver as condições e como isso se enquadra nas obrigações macroprudenciais que a banca tem de cumprir à ordem do Banco de Portugal.
“É positivo por ser mais um incentivo para um grupo de pessoas que não tem acesso poder ter casa”, mas “só vale a pena ter uma opinião definitiva quando se souber como se joga com os 100% de financiamento, até agora só é permitido 90%. Saber se há coisas que se mantêm, como a manutenção da taxa de esforço e maturidade máximas. É preciso clarificar estas questões”. Há conversas entre as autoridades, mas ainda não há a medida estabelecida.
A Caixa fez questão de salientar que não tem apenas retribuído ao acionista, mas também tem respondido aos clientes e trabalhadores (com aumentos médios de 7%). Aos clientes, e numa das primeiras declarações na conferência de imprensa de apresentação de resultados, Paulo Macedo aponta que as comissões em Portugal caíram 2%, porque “não atualizámos o preçário nem em 2023 nem em 2024”. As comissões, a nível consolidado, estabilizaram nos 289 milhões de euros. Mas a margem financeira subiu mais de 8% para 1.426 milhões de euros.
Por outro lado, salientou a administradora financeira, Paula Geada, a “Caixa mantém a aplicação de medidas de apoio às famílias no crédito à habitação”, nomeadamente com uma descida dos spreads. Só este ano corresponde a um custo de 260 milhões.
Paulo Macedo alerta que no futuro isto vai levar a que os clientes tenham um efeito duplo sobre os juros que pagam ao banco — descida das taxas pelo BCE e a descida dos spreads já concretizada.
O presidente do banco realça, por outro lado, que há uma forte concorrência no crédito à habitação. “Não há um mercado tão competitivo na banca como o do crédito à habitação”, salienta, falando em transferências de crédito “ao rubro”, para falar da “concorrência aguerrida” neste segmento, recordando que houve bancos que só dedicaram a este segmento. Isto também para contrarias a ideia de que existiu um cartel na banca com os spreads. “O juiz disse claramente que não é cartel”, cabendo a decisão de saber se a troca de informações prejudicava a concorrência. O Tribunal de Justiça europeu considera que essa troca de informação pode configurar uma postura anticoncorrencial e “sobre isso não vou comentar, está a ser tratado pelos tribunais”. E assume, tal como outros banqueiros já o fizeram: “Acho que a posição dos bancos foi correta, e não me parece que seja por alguns técnicos terem feito questões que haja comportamentos censuráveis. A justiça o dirá. Era bom distinguirmos a coisa. A banca teve coisas muito negativas, não vale a pena dizer que é tudo negativo”.
A carteira da Caixa no crédito à habitação atingiu, no final do primeiro semestre, 24.629 milhões de euros, mais 0,7% em termos homólogos.