Nas redes sociais os vídeos de cães a pressionar com as patas botões de caixas de sons, desencadeando palavras pré-gravadas, tornam-se rapidamente populares. Uma equipa de cientistas decidiu explorar esse mundo, mas inverteu a lógica. Em vez de serem os animais a clicar nos botões, foram os investigadores e os seus donos. O objetivo: perceber se humanos e caninos conseguem realmente comunicar através destes aparelhos.

Um estudo publicado na quarta-feira na revista Plos one concluiu que os cães treinados com caixas de sons conseguem compreender palavras específicas, como “brincar” ou “sair”. Quer fossem ditas pelos seus donos ou transmitidas quando alguém pressionava um botão, os animais foram capazes de entender e produzir uma resposta adequada ao contexto, refere a equipa de cientistas, liderada por Federico Rossano, professor da Universidade de Califórnia San Diego. Isso aconteceu tanto quando os botões foram pressionados pelos cientistas como pelos donos dos cães.

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Os autores dizem que a reação dos animais sugere que estes “não estão meramente a ‘ler’ a linguagem corporal dos donos ou a sua presença, mas estão na verdade a processar as palavras“. “As nossas descobertas são importantes porque mostram que as palavras importam para os cães, e que eles respondem às palavras em si”, sublinhou Rossano, que aparece no documentário da Netflix “Inside the mind of a dog” (2024) e é citado pela universidade em comunicado.

Ao longo da investigação foram conduzidas duas experiências, em 2022. Na primeira, vários investigadores visitaram as casas de 30 pessoas com cães em diferentes pontos dos Estados Unidos para testar a sua resposta aos botões das caixas de sons. Na segunda experiência, 29 pessoas conduziram elas próprias os testes com as caixas a partir de suas casas, mas com acompanhamento remoto da equipa de investigação.

Investigadores da Universidade de Califórnia San Diego num estudo sobre cães

Comparative Cognition Lab/Universidade de Califórnia San Diego

Os cães eram mais propensos a exibir comportamentos “relacionados com a brincadeira” ou “relacionados com idas ao exterior” depois de ouvir palavras como “brincar” e “sair”, quer fossem ditas por um humano ou emitidas pela caixa de sons. “Isso demonstra que os cães são, no mínimo, capazes de aprender uma associação entre essas palavras ou botões e as suas consequências”, escreveram os investigadores.

Por outro lado, os animais não apresentaram comportamentos “relacionados com comida” em resposta a palavras sobre alimentação, sugerindo que os cães não estavam com fome ou não esperavam receber comida fora dos horários habituais.

“Os resultados demonstram, em primeiro lugar, a importância de estudar os animais de estimação no ambiente doméstico para melhor compreender as suas capacidades e, em segundo lugar, que os cães respondem às palavras em si e não apenas aos sinais corporais a elas associados”, disse ainda Federico Rossano.

O estudo publicado na quarta-feira é apenas o ponto de partida para uma investigação mais ampla. “Investigações futuras vão explorar como os cães usam ativamente estes botões, incluindo o significado e a sistematicidade por trás das sequências para pressionar os botões”, disse ainda o professor norte-americano.

Para Clive Wynne, director do Canine Science Collaboratory, da Universidade de Arizona, não há nada de muito relevante no novo estudo. Em declarações ao Guardian, destacou que a equipa de cientistas só estudou a resposta a três palavras e que os cães apenas reagiram a duas delas. Ao mesmo jornal, Mélissa Berthet, da Universidade de Zurique, considera que o estudo lançou as bases para investigações futuras e mostrou — ao contrário de algumas sugestões — que os cães estavam de facto a responder ao som produzido pelos botões em vez do ambiente e das reações dos seus donos. “Penso que a comunidade de cientistas está à espera para ver o resto e vai ser emocionante”, antecipou.