Lyela Sayarath é estudante do 11º ano da Escola Secundária de Apalachee, no Estado norte-americano da Geórgia. Esta quarta-feira, o seu “tímido” colega de carteira, Colton Gray, abriu fogo dentro da escola, matando dois colegas e dois professores. Sayarath e outros alunos relataram aos media norte-americanos os momentos “no inferno” durante o tiroteio.
Sayarath conta à CNN que estava na aula de Álgebra, por volta das 9h45 (14h45 em Portugal Continental), quando Gray se levantou e saiu da sala, sem justificação. Já depois das 10h, terá tentado entrar novamente, mas deparou-se com uma porta fechada — por motivos de segurança, as portas das salas de aula não podem ser abertas por fora quando estão fechadas.
O atirador, de apenas 14 anos — acusado de quatro crimes de homicídio — seguiu para a sala seguinte, em que a porta estava aberta. Sayarath relata que ouviu “um tiro atrás do outro”, enquanto os estudantes na aula de Álgebra corriam para o fundo da sala, atrás das secretárias.
O mesmo protocolo foi seguido por um aluno na sala em que Gray disparou. Este jovem, que não foi identificado, contou aos media locais que estava sentado junto à porta quando viu Gray com “uma arma grande”. Correu para o fundo da sala, onde ouviu “10 tiros” e sentiu os “ouvidos a tinir”.
Quando a escola entrou em lockdown — outro passo do protocolo em caso de tiroteio — Isabella Albes Cardenas e Jose Inciarte estavam a ter uma aula de espanhol do 11º ano e acharam que era mais uma simulação, frequentes nas escolas norte-americanas. Inciarte partilha com o New York Times que só se apercebeu que era “a sério” quando ouviu “gritos e pessoas a correr no corredor”.”Somos preparados para estas coisas. Mas no momento, comecei a chorar, fiquei nervosa”, partilhou, por sua vez, Cardenas.
Os professores que ajudaram alunos e os alunos que ajudaram professores
A quatro salas de distância do local onde Gray disparou, Stephen Kreyenbuhl, professor de 26 anos, estava a dar uma aula de estudos sociais. Inicialmente, estava igualmente incerto se era uma simulação. Depois ouviu seis tiros. “Os meus estudantes estavam no chão, alguns a chorar, outros a ser consolados e outros a dizer palavrões”, relatou. Quando a polícia conduziu os professores e alunos para fora da escola, Kreyenbuhl diz ter visto no seu corredor “uma mancha de sangue no chão”.
Enquanto este professor tentou consolar os estudantes, a professora de Janice Martinez “estava a tremer”. A aluna relatou que estavam em aula, quando começaram a ouvir gritos, que também desvalorizaram. “O barulho ficou mais alto e eu é que disse ‘não, malta, têm todos de se baixar, não estou a brincar'”, partilhou com os media. Martinez diz que as colegas começaram a chorar e teve de as consolar até a polícia chegar.
Amari teve de ajudar o seu professor, depois de este ter levado um tiro na perna. “Ela disse que ninguém queria levantar-se, por isso ela levantou-se e foi ajudar o professor”, contou Abby Turner, uma amiga de Amari que a encontrou já fora da escola, em lágrimas e com os sapatos cobertos de sangue.
“Adoro-te” e “estamos a caminho”: as mensagens das mães
Antes de tudo ter acabado e ter falado com a amiga, Abby Turner ouviu tiros e viu o lockdown ser ativado. Eram 10h23 quando enviou uma mensagem à mãe a dizer que não era uma simulação. “Não posso explicar estou a tremer imenso”, escreveu, nas mensagens que a mãe, Sonya Turner, mostrou ao Washington Post. No grupo de mensagens da família, a irmã mais nova de Abby, Isabella Faith, perguntou o que devia fazer. “Reza”, respondeu a mãe que enviou uma oração às filhas, logo seguida da mensagem “continuem a rezar, estamos a caminho, eu e o pai estamos a caminho”.
Também Erin Clark largou o trabalho por volta da mesma hora, para se pôr a caminho da escola secundária de Apalachee, onde o filho Ethan é finalista, depois de ter recebido uma série de mensagens seguidas, em que se lia: “tiroteio na escola” “pf” “não estou a brincar”. Em “choque” e “aterrorizada”, Clark disse ao filho que estava a caminho. “Adoro-te”, escreveu Ethan. “Adoro-te mais, amor”, respondeu a mãe.
Christian Scott não mandou mensagens à mãe, ligou-lhe a chorar. O adolescente de 16 anos estava a caminho do posto médico da escola quando foi anunciado o lockdown e, juntamente com a enfermeira e outros estudantes, barricaram as portas com as macas. A sua irmã também é estudante na mesma escola e contou que os momentos antes da polícia chegar foram “um inferno”.
A evacuação e o reencontro com as famílias
Uma outra estudante, Alexandra Romero, relata que a escola esteve em lockdown durante cerca de dez minutos, até a polícia chegar e conduzir alunos e professores até ao ponto de encontro em casos de emergência, o campo de futebol. Passado o pânico inicial, alguns estudantes captaram esta evacuação nas redes sociais
@cnn Law enforcement escorts students out of Apalachee High School in Winder, Georgia, following a shooting that left multiple people dead. According to police, the suspected shooter, now identified as 14-year-old Colt Gray, is "in custody and alive." The deceased victims were two students, and two teachers, according to police. #CNN #News ♬ original sound - CNN
Do lado de fora do perímetro policial, os pais que acorriam ao local foram impedidos de estacionar junto à escola. Os carros foram deixados a mais de 3 quilómetros do campo de futebol e a parte final do percurso foi feita a pé.
Nas primeiras declarações aos jornalistas, o chefe da polícia local relatou que o reencontro entre pais, filhos, irmãos e amigos foi “caótico”. Em poucos minutos, quatro pessoas foram mortas e nove ficaram feridas, precisando de assistência. Outros cinco sobreviventes tiveram de ser assistidos por “sintomas relacionados com ansiedade”, informou a porta-voz do sistema de saúde regional.
Dados do GunViolenceArchive, revelam que este foi o tiroteio nos Estados Unidos que matou mais gente este ano. Mas está longe de ter sido o primeiro: é já o 45º numa escola, só em 2024. Em média este ano, os Estados Unidos tiveram 1,5 tiroteios por dia. Olhando para o seu próprio arquivo, o jornal Washington Post acrescenta que este é o tiroteio com mais vítimas na Geórgia desde 1999.