O Fundo de Reabilitação e Conservação Patrimonial do Estado (FRCP) executou 758 mil euros em dois contratos e celebrou três novos contratos em 2022. Uma auditoria da Inspeção-Geral de Finanças (IGF) relativa às contas de 2022 deste fundo destaca a “quase inexpressiva atividade” do FRCP que, por sua vez, “resulta na acumulação de um volume crescente de disponibilidades que totalizam 137,8 milhões de euros, aplicados integralmente em certificados especiais de dívida de curto prazo (CEDIC) — instrumento de dívida pública onde os organismos do Estado aplicam os excedentes de tesouraria.

Criado em 2009 — durante o primeiro Governo de José Sócrates — o Fundo de Reabilitação e Conservação Patrimonial do Estado (FRCPE) tinha como finalidade financiar operações de recuperação, reconstrução e reabilitação e conservação dos imóveis da propriedade do Estado. Para beneficiarem de financiamento, os serviços públicos apresentavam a candidatura, devendo o projeto estar enquadrado por planos de conservação e reabilitação de edifícios afetos a serviços públicos.

A síntese desta auditoria e parecer foi publicada no site da IGF após homologação do ministro das Finanças em julho de 2024. Mas as conclusões que constam deste relatório têm-se repetido ao longo das várias auditorias realizadas a este fundo público que, ao longo de mais de dez anos, apontam para um reduzido grau de execução. O que vai mudando é o valor do saldo acumulado por usar, que continua a crescer e a ser aplicado em dívida pública. As fontes de financiamento do FRCPE incluem receitas de propriedade e transferências de capital da administração central relativas à venda de imóveis do Estado.

No resumo da auditoria às contas de 2022, a IGF refere 38 candidaturas apresentadas para financiamento num montante de 39 milhões de euros, que estavam até ao final desse ano sem decisão. Entre estas, havia 21 candidaturas do Ministério da Saúde “que, apesar de serem de 2010, não foram formalmente reapreciadas, muito embora a titularidade de bens imóveis de três entidades públicas empresariais estar registada no SIIE (Sistema de Informação dos Imóveis do Estado) como imóveis próprios e não do Estado (diferentemente dos imóveis de outros hospitais que estão registados como propriedade do Estado)”.

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No parecer às contas de 2o20 e 2021, a IGF já destacava a “pouco expressiva atividade” do Fundo e o volume crescente de disponibilidades de 122 milhões de euros que estavam aplicadas em dívida pública. Nesse ano, o número acumulado de candidaturas entradas sem decisão era de 51,7 milhões de euros, onde se incluíam as já referidas do Ministério da Saúde.

Gestão do Fundo saiu do Tesouro para a Parpública em 2023

A gestão do fundo ficou entregue aos dirigentes da Direção-Geral do Tesouro, organismo que funciona na dependência do Ministério das Finanças e que gere e controla o património e participações empresariais do Estado. Mas os gestores acumulavam estas funções com os cargos de diretor e subdiretores-gerais da referida direção-geral.

Apesar dos alertas sobre o fraco desempenho do fundo, só em 2023 o anterior Governo resolveu mudar o modelo de gestão, transferindo-a para a Estamo, a empresa de imobiliário detida pela Parpública.

Ao longo das auditorias, a IGF tem alertado para o facto de não estar previsto “um período para submissão de candidaturas; prazos adequados a cada uma das etapas das candidaturas; ou penalizações a aplicar aos beneficiários que não entregam, de forma célere, os documentos essenciais ao prosseguimento dos processos de candidatura.”

Outra auditoria do Tribunal de Contas publicada em 2014 já apontava para o “contributo diminuto do Fundo para a reabilitação e conservação dos imóveis do Estado, objeto que presidiu à sua criação em 2009”. Nesta auditoria, que se debruça sobre a atividade do FRCPE entre 2010 e 2012, o Tribunal sinalizou: “Com receitas acumuladas de 46 milhões de euros, o Fundo tinha disponíveis 44 milhões de euros no final de 2012, tendo apenas gasto 1,3 milhões de euros em obras de reabilitação e conservação”. Eram ainda apontadas insuficiências e falta de rigor na prestação das contas.

Serviços do Estado beneficiários não entregaram informação essencial

O último relatório de atividades publicado por este fundo é de 2017 e dá algumas pistas sobre os motivos que terão contribuído para que, ao longo de mais dez anos, o FRCPE tenha falhado os seus objetivos. Apesar de terem sido recebidas muitas candidaturas — 12 novas naquele ano para um investimento de 7,2 milhões de euros, foram devolvidas 10. Até 2017, o Fundo tinha recusado 141 candidaturas para um investimento de mais de 100 milhões de euros.

Isto porque, “o financiamento do Fundo não abrange serviços, organismos e demais entidades que possam beneficiar de outros fundos, públicos ou privados, destinados a operações de reabilitação, conservação ou restauro de imóveis, ou de outros programas decorrentes de regimes e legislação especiais de rentabilização de imóveis”. A gestão do Fundo reconhecia que “persistiam as dificuldades de execução que se traduzem tanto no arrastamento da contratualização, como na ausência de execução de candidaturas contratualizadas, bem como nos atrasos de execução”.

No origem das candidaturas pendentes ou em análise — à data 48 com investimento de 31 milhões de euros — estavam os esclarecimento pedidos aos serviços beneficiários considerados essenciais à análise, como a apresentação de uma memória descritiva e justificativa que descreva as patologias dos imóveis e as intervenções a implementar, acompanhadas de uma estimativa de custos de todos os trabalhos. Havia candidaturas de 2010 e 2011 às quais ainda faltavam elementos necessários sobre a situação dos imóveis.

Já os contratos de financiamento dependiam da apresentação de projeto de execução, declaração em como não havia apoios financeiros de outros instrumentos e o comprovativo de que o serviço beneficiário dispunha da dotação orçamental para assegurar a parcela que não era comparticipada pelo Fundo.

Até 2017, o Ministério da Saúde foi de longe o que apresentou mais candidaturas (67 para mais de 80,8 milhões de euros), seguido da Agricultura, Defesa e Trabalho e Segurança Social. Até àquele ano e desde a criação do Fundo foram celebrados 86 contratos de financiamento, o que envolvia um montante total contratualizado de 15 milhões de euros.