Uma série de monografias sobre a obra de artistas que iniciaram o seu percurso a partir da década de 1960, no âmbito da joalharia. “J” é a nova coleção lançada esta terça-feira pela Imprensa Nacional Casa da Moeda. Ao ritmo de “uma a duas” por ano, Cristina Filipe (Lisboa, 1965), investigadora especializada na história da joalharia contemporânea, assina a coordenação científica do projeto, cujo ensaio de arranque é dedicado a Tereza Seabra. “A Joalharia como Proteção e Poder” enceta este conjunto de análises críticas que acompanha as transformações do segmento e analisa os múltiplos formatos assumidos até hoje.

A acompanhar os textos, espaço para uma narrativa visual que visa aproximar o leitor dos artistas e respetivas obras, neste caso com enfoque na joalharia indiana tribal e ritualística que Seabra tem vindo a estudar. “Optei por fazer um exercício de confronto entre o trabalho artístico da Tereza e o seu trabalho como pesquisadora.”, define Cristina.

© Fábio Cunha

O volume em questão considera as correlações que as joias contemporâneas de Tereza Seabra estabelecem com as culturas que vivenciou e os artefactos e a joalharia que investigou na Índia, alguns dos quais integram a sua extensa coleção, apresentada na exposição The Dance of the Peacock, na Fundação Oriente, em 2015.

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Para tal, Cristina Filipe introduz mudanças na estrutura original e ignora linhas cronológicas, abrindo margem para uma leitura mais ampla a partir da organização proposta. “Gosto de dar espaço ao leitor para tentar criar as suas próprias imagens, as suas próprias expectativas.” Sem pretensão biográfica ou retrospetiva, a coleção contrói-se antes a partir das afinidades simbólicas e formais entre as obras, cruzando fases distintas. No caso particular de Seabra, a narrativa vai sendo interpelada pela documentação visual e escrita que a joalheira reuniu durante as suas investigações, apresentando-se diferentes peças decisivas na sua trajetória, simbólicas dos tempos e modos que acompanham cada povo.

© Fábio Cunha

O trabalho conceptual desenvolvido pela designer Sílvia Prudêncio permitiu uma paginação coerente “com esse confronto entre dois mundos, as obras da Teresa e a pesquisa na Índia.”

Com a grande maioria dos artistas destacados ainda vivos, a curadora sublinha que a sua participação é “fundamental”, bem como o “diálogo contínuo” com o objeto de ensaio. “Partilhei o meu conceito com a Tereza, perguntei se se sentia confortável, depois facilitou-me toda a documentação que tinha, eu fiz uma escolha, pedi-lhe uma opinião, acertámos tudo, escrevi o texto, mostrei-lho, ela leu. Houve sempre um entendimento”.

© Fábio Cunha

A coleção retoma o fio do longo trabalho concentrado na tese “Trajetórias da joalharia contemporânea em Portugal : artistas e contextos : 1963-2004”. No seio da Universidade Católica, Cristina Filipe viajou por quatro décadas de história, entre muitas entrevistas, imagens, artistas consultados e informação variada. No rescaldo da empreitada, mesmo depois de ver a investigação publicada em livro, e de ter conhecido uma segunda edição, foi “frustrante” imaginar que boa parte deste acervo e matéria-prima permaneceria na sombra. “Logo nessa altura surgiu o contacto com a Imprensa Nacional, no sentido de publicar as entrevistas, foi até uma ideia do meu orientador, Gonçalo Vasconcelos de Sousa, que me apresentou e falou na possibilidade. Houve interesse.”, enquadra a curadora, que já conhecia bem a coleção D, a coleção Ph (sobre fotografia), e que propôs lançar-se na J.

© Fábio Cunha

Pioneira nesta área de criação, Tereza Seabra (Alcobaça, 1944) será seguida por Alexandra Serpa Pimentel (Lisboa, 1954) também precursora da joalharia contemporânea em Portugal e que dará o ritmo para o segundo volume da coleção. “Ambas inauguram a escola e discípulos nesta disciplina no contexto artístico”, recorda Cristina Filipe, recuando a 1978, quando Seabra fundou o Departamento de Joalharia do AR.CO (Centro de Arte e Comunicação Visual), pelo qual foi responsável até 2004. Há mais nomes em cima da mesa, a descortinar de futuro.

“Falamos de um nicho, não só em Portugal, também internacionalmente, mas com tendência para derrubar essas barreiras. É fundamental que se compreenda que o setor da joalharia está completamente integrado no campo das artes contemporâneas e que sofre as mesmas transformações que a escultura, que a pintura, que outras disciplinas.”

Com 144 páginas, e incluindo 103 ilustrações, o volume surge num formato bilingue (português/inglês). De capa mole, a cor da ardósia marcará este conjunto de publicações, com um J em baixo relevo. Cada artista escolherá ainda a sua cor de referência, que surge em alguns elementos — neste caso o fuchsia. O livro custa 22 euros (esta terça-feira, dia de lançamento, tem desconto de 20%). Está à venda nas lojas da Imprensa Nacional.