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O presidente da Câmara de Borba escudou-se esta quinta-feira, para justificar a decisão de manter aberta a estrada que ruiu junto a pedreiras, na alegada falta de documentos técnicos produzidos por entidades competentes que alertassem para o perigo concreto de derrocada.

“Se soubesse que havia perigo para as pessoas, é evidente que fechava a estrada imediatamente”, afirmou António Anselmo, no Tribunal de Évora, durante a primeira sessão do julgamento do caso da derrocada de uma estrada para duas pedreiras em Borba, em 2018.

A audiência de julgamento, a que faltou o representante da sociedade arguida ALA de Almeida Limitada, que detinha a licença de exploração de uma das pedreiras, arrancou esta quinta-feira com a identificação de cinco dos seis arguidos.

Além de António Anselmo, o vice-presidente da Câmara de Borba, Joaquim Espanhol, e o responsável técnico da empresa ALA de Almeida, Paulo Alves, aceitaram falar perante o coletivo de juízes que está a julgar o caso.

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Já os funcionários da Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) Bernardino Piteira e José Pereira optaram por ficar em silêncio.

O primeiro a ser ouvido foi o presidente da Câmara de Borba, acusado de cinco crimes de homicídio por omissão, que admitiu que havia conversas sobre os riscos de derrocada, mas frisou, por diversas vezes, que “em termos concretos nunca ninguém disse que a estrada estava em perigo”.

“Falava-se muita coisa, mas ninguém disse que ia cair. Se tivessem dito, eu tinha fechado a estrada”, insistiu.

Em 2014, realizou-se uma reunião com empresários e outros responsáveis sobre as pedreiras, admitiu o autarca, sublinhando, porém, que o tema da segurança na estrada foi abordado mas “de uma forma muito geral”.

António Anselmo foi confrontado, quer pelo coletivo que está a julgar o caso, quer pela procuradora do Ministério Público (MP), com documentos que alertavam para os riscos, como um memorando da Direção Regional de Economia do Alentejo.

O governante respondeu que esses documentos apresentavam “só conversas” e que não apontavam em concreto a necessidade de fechar a estrada.

A procuradora do MP também questionou o presidente do município sobre a declaração “aquela estrada é muito perigosa e é urgente que se encontre uma solução”, que lhe é atribuída na ata de uma reunião de câmara, ao que António Anselmo respondeu que se referia apenas a questões de circulação de trânsito.

Responsável técnico diz que não houve violação de regras de segurança na pedreira

O então responsável técnico da empresa arguida no caso da derrocada de uma estrada em Borba, no distrito de Évora, argumentou esta quinta-feira na mesma sessão de julgamento que não houve violação de regras de segurança na pedreira onde trabalhava.

“Considero que não houve violação das regras de segurança”, disse o engenheiro geológico Paulo Alves, baseando-se no conhecimento que tinha da pedreira, da qual passou a ser responsável técnico em “finais de 2007, inícios de 2008”, e nos seus mais de 20 anos de experiência profissional.

Nas declarações que fez perante o coletivo de juízes que começou esta quinta-feira a julgar o caso, o então responsável técnico da sociedade ALA de Almeida Limitada indicou que o Departamento de Geociências da Universidade de Évora elaborou, a pedido da empresa, diversos estudos técnicos desde 2008.

Os documentos atestaram que “o talude encontrava-se em situação de estabilidade adequada”, frisou Paulo Alves, acusado de 10 crimes de violação de regras de segurança.

Antes, igualmente nas declarações ao coletivo de juízes, o vice-presidente da Câmara de Borba, Joaquim Espanhol, disse ter participado numa única reunião de câmara com a presença de uma especialista, em 2014, em que foi abordada a segurança da Estrada Municipal (EM) 255.

Desse encontro, alegou ter saído “com a convicção de que era uma estrada perigosa, mas não em perigo de ruir”, ou seja, esse perigo estaria relacionado com questões de trânsito e de acidentes de viação e não com uma eventual derrocada.

Ao longo da sua intervenção, Joaquim Espanhol, que está acusado de três crimes de homicídio por omissão, repetiu, por diversas vezes, que a EM255 era uma competência atribuída ao presidente da câmara.

O mesmo já tinha sido dito em tribunal pelo presidente da autarquia, António Anselmo, que chamou a si toda a responsabilidade “quer para o bem, quer para o mal” do que acontece no município.

Já a procuradora do Ministério Público sustentou que o vice-presidente tinha os pelouros que abrangiam competências de fiscalização da estrada e que as câmaras municipais, por lei, têm a competência administrativa de fiscalizar as pedreiras.

O advogado dos autarcas, Silvino Fernandes, questionou-os sobre quando tiveram conhecimento sobre a existência de relatórios técnicos da Universidade de Évora e do Instituto Superior Técnico em relação ao talude da pedreira junto à estrada que ruiu, tendo ambos assegurado que só souberam depois do acidente.

Na tarde de 19 de novembro de 2018, um troço de cerca de 100 metros da Estrada Municipal 255 (EM255), entre Borba e Vila Viçosa, no distrito de Évora, ruiu devido ao deslizamento de um grande volume de rochas, blocos de mármore e terra para o interior de duas pedreiras.

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O acidente causou a morte de dois operários de uma empresa de extração de mármore na pedreira que estava ativa e de outros três homens, ocupantes de duas viaturas que seguiam no troço de estrada e que caíram para o plano de água da pedreira sem atividade.

Em paralelo, o Estado intentou uma ação administrativa no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja para reaver mais de 1,6 milhões de euros pagos em indemnizações às famílias das vítimas.