A ausência de uma política nacional para o acolhimento dos alunos migrantes é um dos principais entraves à integração dessas crianças em Espanha, segundo especialistas que relatam também a falta de recursos, uma dificuldade partilhada em Portugal.

Em 2023, Espanha recebeu mais de 160 mil pedidos de asilo e, todos os meses, continuam a chegar ao país milhares de migrantes. Os desafios associados à imigração, sobretudo ilegal, têm mais de uma década, mas intensificaram-se nos últimos anos e a escola pública não está a conseguir dar resposta do ponto de vista do acolhimento e integração dos mais novos.

O relato foi feito por representantes da Federação de Ensino das Comissões de Trabalhadores (FE-CCOO, ‘Federación de Enseñanza de Comisiones Obreras’ em espanhol), que estiveram esta terça-feira em Lisboa para um encontro das organizações sindicais que integram um projeto promovido pelo Comité Sindical Europeu de Educação no âmbito da inclusão de migrantes e refugiados.

“Estamos a viver uma situação muito complexa e o Governo não leva a cabo políticas de inclusão com êxito”, disse à Lusa Cuqui Vera Belmonte, secretária de Política Internacional da FE-CCOO.

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Segundo a dirigente sindical, as escolas não têm recursos suficientes para dar uma resposta adequada aos alunos migrantes e, por outro lado, não existe uma política nacional que permita ultrapassar a falta de diálogo que diz existir entre o governo central e as comunidades autónomas.

Ceuta enfrenta uma das situações mais complexas, enquanto ponto de passagem do norte de África para o continente europeu, e entre os cerca de 520 menores não acompanhados atualmente na cidade, a maioria tem entre 16 e 17 anos, já fora da educação secundária obrigatória.

“A única possibilidade é a formação profissional básica e é através dessa formação que, por exemplo, o nosso sindicato disponibiliza aulas para ajudar as escolas”, refere Lorena Diaz, secretária-geral da FE-CCOO de Ceuta, referindo que a esmagadora maioria acaba por não concluir os estudos.

Dependentes do Governo central, nas escolas públicas de Ceuta faltam também recursos e Lorena Diaz queixa-se da ausência de um plano de ação nacional. “São tudo medidas excecionais, não é algo que o Ministério da Educação tenha estabelecido e regularizado”, acrescenta.

Nas Ilhas Canárias, onde já chegaram perto de 40 mil migrantes em embarcações precárias, desde o início do ano, a autonomia também não dá resposta.

“Há municípios com 122 nacionalidades. É impossível dar soluções a todas estas crianças e o Governo não ajuda. Falta investimento, faltam professores, e não há formação suficiente dos professores para ajudar”, relatou o secretário-geral da FE-CCOO das Canárias.

Os principais problemas estão associados à imigração ilegal e aos milhares de menores não acompanhados, refere Ramón Barroso, que sublinha que essas crianças e jovens não encontram resposta no ensino privado.

Em Portugal, organizações sindicais como a Federação Nacional dos Professores, que integra o projeto, têm alertado para dificuldades semelhantes na integração de alunos migrantes e refugiados.

Algumas medidas surgem da iniciativa das autarquias, como é o caso da Câmara Municipal do Seixal, que lançou uma iniciativa dirigida às escolas do pré-escolar ao secundário no âmbito da qual será feito um diagnóstico da população migrante no concelho e das principais dificuldades.

A vereadora Maria João Macau defendeu, no entanto, a necessidade de uma resposta a nível nacional, justificando que o aumento do número de alunos migrantes e refugiados não tem sido acompanhado por um reforço suficiente de meios.

“É necessário um apoio especializado, formação do pessoal não docente e alterar os rácios para que correspondam às necessidades efetivas das escolas”, afirmou.

Em setembro, o Conselho de Ministros aprovou um conjunto de medidas para melhorar as aprendizagens e apoiar os alunos estrangeiros que, desde 2018, aumentaram 160% nas escolas portuguesas.

Nesse âmbito, o Governo prevê contratar mediadores linguísticos e culturais e rever a disciplina de Português Língua Não Materna, com a criação de um nível zero, para os alunos estrangeiros não oriundos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.