Cerca de cem professores estão concentrados junto ao Ministério da Educação para exigir o alargamento do apoio financeiro a todos os docentes colocados longe de casa, como Catarina ou Filipe, que esta quinta-feira participam no protesto.

Catarina Gomes começou este ano a dar aulas. Tem 25 anos, é professora de Educação Física numa escola em Sintra e todos os fins de semana faz cerca de 370 quilómetros para estar com a família, em Paços de Ferreira.

Com um salário de cerca de 1.200 euros, disse à Lusa que gasta mensalmente cerca de 900 euros só com as contas do quarto alugado, alimentação e viagens, garantindo não ser “nada gastadora”.

“Não quero deixar de dar aulas, porque gosto e acredito que a situação poderá melhorar, mas está a ser difícil”, desabafou, lamentando ter sido excluída de um apoio de deslocação que é atribuído a colegas que trabalham em escolas perto da sua.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Também Filipe Simões sente que o dinheiro não chega para fazer face às despesas. Tem 43 anos e todas as semanas faz 390 quilómetros para trocar Lisboa, onde dá aulas, pela Trofa, onde vive o filho de três anos.

“Ganho cerca de 1.300 euros por mês, mas gasto cerca de 680 euros aqui em Lisboa, sem contar com os gastos fixos que tenho em Trofa, onde também tenho uma casa e a minha família”, contou à Lusa o docente que há três anos dá aulas em Cascais.

Em Lisboa vive num hostel “para ser mais barato, mas mesmo assim não chega”, desabafou. Também Filipe tem colegas a dar aulas em escolas “mesmo ao lado” da sua, mas que recebem o apoio de deslocação criado pelo Governo.

“Esta era uma medida que poderia ser positiva, mas que o ministério da Educação conseguiu transformar numa medida discriminatória”, acusou Mário Nogueira, secretário-geral da Federação Nacional de Professores (Fenprof).

Para o sindicalista, deveria haver uma distinção entre o apoio dado a quem fica colocado longe de casa e um incentivo a quem quer dar aulas em escolas onde faltam professores.

A manifestação de professores e docentes foi convocada pela Fenprof, que entregou no ministério uma moção a defender o alargamento do apoio a todos os docentes deslocados.

É que o diploma, em vigor desde setembro, aplica-se apenas aos docentes que ficam colocados num dos 234 agrupamentos de escolas identificados pela tutela como tendo falta de professores.

De fora deste diploma ficam todos os colocados nos restantes 574 agrupamentos de escolas, onde nos últimos tempos não houve falta de professores, mesmo quando estão a muitas centenas de quilómetros de casa.

A Fenprof entende que o diploma é discriminatório e por isso vai pedir um parecer aos advogados sobre a sua constitucionalidade, revelou Mário Nogueira, explicando que o objetivo não é revogar o decreto-lei, mas alargar o seu âmbito a todos os docentes deslocados.

Mário Nogueira defendeu a criação de dois apoios distintos: um destinado a todos os docentes deslocados e outros para os que aceitem trabalhar em escolas de “zonas isoladas e desfavorecidas” ou com falta de professores.

Se, em vez de definir zonas com falta de professores, a tutela mantiver o modelo em que define “escola a escola”, correrá o risco de ver os docentes a pedir transferência de um estabelecimento de ensino onde não há apoio para o do lado para conseguir ter apoio financeiro.

Também a líder do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, marcou presença no protesto junto ao ministério, onde criticou o decreto-lei e defendeu o alargamento a todos os docentes que trabalham longe de casa.

Mariana Mortágua ouviu a história de Catarina Gomes que demonstra como o decreto é “injusto e faz uma discriminação por escolas”.

Defendendo que é preciso melhorar as condições de quem está nas escolas e criar medidas para atrair jovens para a profissão, a líder do Bloco alertou que “não há truques que resolvam a falta de professores” e que a atual situação não será resolvida “enquanto tiverem de pagar para trabalhar”.

Mariana Mortágua lembrou ainda que o Orçamento do Estado para 2025 “tem previsto um congelamento do número de trabalhadores do Estado”, o que quer dizer que “não haverá mais” e como tal “irá continuar a haver falta de professores”.

Além disso, a proposta de lei do OE2025 prevê um “nível recorde de cativações”, o que poderá pôr em causa as despesas orçamentadas, alertou.