Cerca de 1,3 milhões de postos de trabalho vão ter de ser requalificados em Portugal com a adoção célere da automação e da inteligência artificial generativa (GenAI), refere um estudo da McKinsey divulgado esta segunda-feira.

“São 1,3 milhões postos de trabalho em que as pessoas vão ter de fazer as coisas de forma diferente”, explica Duarte Begonha, sócio da McKinsey & Company, defendendo que é preciso haver uma “agenda bastante clara e definida, envolvendo os diferentes ‘stakeholders’ da sociedade – setor privado, setor público e a parte da educação – na requalificação laboral”. Ou seja, vai exigir um conjunto de novas competências.

A adoção célere da automação e GenAI vai libertar horas de trabalho equivalentes a estes 1,3 milhões de empregos e “estas horas poderão ser dedicadas a outras tarefas de maior valor acrescentado que conduzirá ao aumento da produtividade“, lê-se no estudo “Future of Work: Automação com GenAI: Oportunidade única para melhorar a produtividade em Portugal”, elaborado pelo McKinsey Global Institute (MGI), em colaboração com a Nova School of Business and Economics (SBE).

O aumento da produtividade “resultará na compensação das horas libertadas e na criação de mais horas de procura laboral, resultando num salto positivo de horas de trabalho equivalentes a +0,3 milhões de empregos“. O potencial impacto no aumento da produtividade “está dependente de um esforço estrutural que garanta a realocação da força de trabalho às novas tarefas resultantes da adoção da tecnologia”, o que inclui o esforço de reskilling e upskilling, segundo o estudo.

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O relatório aponta que cerca de 30% do mercado de trabalho será impactado com adoção rápida das tecnologias referidas, exigindo novas capacidades tecnológicas e sociais equivalentes a novas tarefas, e que mais ou menos 320 mil pessoas deverão ser realocadas, sobretudo as que estão em tarefas mais previsíveis, repetitivas e com exposição direta a cliente (atendimento a cliente e apoio administrativo).

“É preciso criar no contexto da formação profissional uma componente educativa para as pessoas que já estão hoje em dia no mercado de trabalho”, defende Duarte Begonha. A ausência de uma agenda nacional de requalificação de realocação “impedirá a captura total da oportunidade com risco de desemprego”, alerta o estudo. Por exemplo, “um atraso na recolocação de pessoas de -20% terá um impacto no crescimento do PIB (-0,5-0,7 pontos percentuais) e ainda o risco de aumento de desemprego (250 mil pessoas por realocar)”.

No cenário de adoção mais rápida, até 2030, as ocupações que dependem, na sua maioria, de competências cognitivas básicas serão as que irão sofrer a maior diminuição e, por isto, reduzem a necessidade destas competências, refere o documento.

Em sentido inverso, “haverá um aumento significativo de competências tecnológicas, com o número de empregos que exigem estas competências, como principais, a aumentar 38%“. As competências sociais também “serão mais necessárias”, com um aumento de 17% no número de empregos. Já o aumento das competências tecnológicas, sociais e emocionais “será transversal a todos os níveis de rendimento” e as cognitivas básicas “serão muito menos relevantes do que são hoje nos rendimentos mais baixos”.

Singapura e Estónia são referência “de boas práticas na implementação de desígnios estratégicos com esta escala”, segundo o estudo.

Portugal tem “oportunidade única” para dar salto de produtividade com adoção de IA – estudo McKinsey

O mesmo estudo concluiu igualmente que Portugal tem “oportunidade única” para dar um “salto de produtividade” e encurtar o fosso para média da UE e dos EUA até 2030 com adoção célere de automação e inteligência artificial (IA).

“A adoção desta tecnologia pode ser uma grande oportunidade para Portugal”, sublinha Duarte Begonha, sócio da McKinsey & Company. O país “apresenta níveis de produtividade na contribuição para o PIB aquém dos da média da UE e dos EUA desde 2010 (0,6% vs 1,3% UE vs 2,1% EUA)”, segundo dados da análise da McKinsey.

Para encurtar a distância do PIB em relação à media europeia, a contribuição do emprego e da produtividade “são relevantes”, aponta o estudo. Contudo, a contribuição do emprego para o crescimento “está mais relacionada com fatores demográficos, que não se espera que variem drasticamente na próxima década, segundo as estimativas oficiais”, lê-se no documento.

Agora, “a contribuição da produtividade, com a adoção célere de tecnologias de automação e de IA, pode dar um salto de 2,7 pontos percentuais anuais de crescimento do PIB por aumento da produtividade até 2030, alinhando com a média da UE”. Se Portugal aproveitar esta disrupção tecnológica poderá atingir um PIB de 3,8% em 2030, defende.

Em resumo, a automação e a GenAI [IA generativa] podem aumentar a produtividade em quase três pontos percentuais, face aos 0,4% registados na última década, “alterando significativamente a tendência económica portuguesa”. De acordo com o estudo, a GenAI contribui de duas formas para o crescimento: maior potencial de automação, especialmente para atividades/trabalhos de escritório (por exemplo, recolha de dados), e maior facilidade de adoção, uma vez que interage em forma de conversação.

“O potencial de aumento da produtividade não será uma oportunidade única exclusiva de Portugal, com a UE e os EUA a apresentarem saltos semelhantes de produtividade com adoção da automação e GenAI”, pelo que se Lisboa não der este salto, o fosso face aos pares europeus “será ainda maior”, refere o estudo.

Aliás, “a adoção rápida de automação e GenAI no mercado de trabalho deve ser vista como uma oportunidade única para passar a competir diretamente com as economias desenvolvidas do mundo em matéria de crescimento”. Agora, se a adoção não for tão rápida, por exemplo devido a restrições regulatórias, “tal terá um impacto negativo no crescimento do PIB (0,2% com uma adoção lenta vs 3,1% com uma adoção mais rápida), o que, a acontecer, agravará o fosso da economia portuguesa” face à Europa, conclui.

Adoção de novas tecnologias é “inevitável” e vai ter impacto na economia portuguesa

O estudo refere também que “a automação e GenAI [inteligência artificial generativa] é inevitável e está a acontecer e vai ter um impacto significativo na nossa economia em Portugal”, acrescenta Duarte Begonha.

Apurou-se que o investimento nas novas tecnologias, incluindo a GenAI, “é uma realidade já atual com diferentes níveis de adoção à escala” e o seu impacto na transformação de atividades existentes é inevitável. Áreas como inteligência artificial (IA) generativa, IA aplicada, a conectividade avançada ou a cloud e edge computing já apresentam um nível de maior maturidade, ou seja, “a tecnologia já existe e já está a ser aplicada” na sociedade e no mundo empresarial, explica Begonha.

Depois há outras menos maduras, mas onde está “a ser investido a nível global muito dinheiro”, acrescenta. “Há muito investimento na tecnologia, muitas das tecnologias já estão na fase da maturidade bastante significativa e isto vai acontecer e vai ter impacto em Portugal”, prossegue o responsável.

Há uma série de atividades “que são feitas nos diferentes empregos em Portugal em que o impacto da tecnologia vai ser bastante alto – e isto é geral”, salienta Duarte Begonha. “Na parte da tomada de decisão, por exemplo na aplicação de conhecimento especializado que (…) agora com o GenAI, em particular, vai ter um impacto enorme no desempenho de tarefas”, explica. “Hoje em dia ainda há muitas tarefas manuais, nomeadamente na parte do processamento de informação, de tratamento e mesmo na recolha de dados que com automação vai ser feito de uma forma muito diferente”, aponta.