O romance Revolução, de Hugo Gonçalves, é o vencedor do Prémio Literário Fernando Namora, com o valor pecuniário de 15 mil euros, anunciou esta quinta-feira a Estoril Sol, que promove o galardão.
O júri, ao qual presidiu Guilherme d’Oliveira Martins, sócio correspondente da Academia Brasileira de Letras, em ata, realçou o “estilo direto, fluido e comunicativo” da obra.
“Com um estilo direto, fluído e comunicativo e com uma linguagem que se alia à expressão do tempo e dos seus atores sociais, Revolução é um livro que se impõe literariamente, graças ao modo como liga ‘pontas soltas’ da história portuguesa recente, mantendo sempre, no entanto, o desenho narrativo de personagens contraditórias, heroicas ou trágicas, fortes ou fracas, e cujos perfis interpelam e comentam os leitores atuais do romance e as suas respetivas posições ideológicas”, afirma o júri, citado em comunicado pela Estoril Sol.
Para os jurados este “é um livro que se aproxima do testemunho, mas onde também coexiste um grande fascínio pela riqueza da própria natureza humana”.
Ao prémio candidataram-se “mais de 60 obras”, das quais foram selecionadas cinco finalistas: os romances A Dança dos Loucos, de Sérgio Luis de Carvalho, As Cinco Mães de Serafim, de Rodrigo Guedes de Carvalho, e Leme, de Madalena Sá Fernandes, além de Revolução, de Hugo Gonçalves.
Hugo Gonçalves, 48 anos, natural de Sintra, estreou-se como jornalista fazendo parte da equipa que iniciou a revista Focus, e fez ainda parte das redações do Expresso, Jornal de Notícias, Diário Económico e das revistas Visão e Sábado.
É autor de vários romances, tendo sido já finalista do Prémio Literário Fernando Namora, em 2019, com a obra Filho da Mãe. Guionista da série Rabo de Peixe, da plataforma Netflix, é autor das obras Deus Pátria Família, que foi semifinalista do Prémio Oceanos, e O Coração dos Homens.
Em 2000, recebeu o Prémio Revelação do Clube Português de Imprensa, com a reportagem Esto es el fin del mundo, sobre as cheias na Venezuela, em dezembro de 1999.
Revolução, agora premiado, foi editado pela Companhia das Letras. A obra, centrada numa família que congrega diferentes perspetivas e opções da época, tem início nos últimos tempos do Estado Novo, atravessa o 25 de Abril e termina nos anos 1980, em democracia e com os adventos de uma liberdade recém-adquirida.
Pelo caminho, explora o período do PREC (Processo Revolucionário em Curso) e os movimentos tanto de extrema-esquerda, como as Brigadas Revolucionárias e as FP-25, quanto de extrema-direita, como o Exército de Libertação de Portugal (ELP).
Assente numa investigação exaustiva, Revolução recorda a falta de liberdade, a clandestinidade e a luta contra a ditadura, antes do 25 de Abril, e o processo posterior.
Em entrevista à agência Lusa, no passado mês de fevereiro, Hugo Gonçalves falou sobre o livro, sobre as conquistas que a queda da ditadura trouxe e as derivas extremistas que na atualidade ameaçam pôr em risco a liberdade alcançada. Para escritor, esse é o “paradoxo da democracia”: na era da informação haver tanta desinformação.
Na opinião de Hugo Gonçalves, nunca será possível alcançar uma democracia que agrade a todos, que corresponda àquilo que cada um imagina, mas não é por isso que se deve deixar de trabalhar para ela, porque “demora muito tempo para conseguir o que conseguimos 50 anos depois do 25 de Abril, aquilo que conseguimos hoje, mesmo com todas as coisas que ficaram por fazer”.
A liberdade é hoje um bem dado como garantido, sobre a qual nem se pensa, como quando se bebe água ou se respira o ar, comparou o autor. Mas “a liberdade demora muito a ganhar”, e “perde-se num ápice, e às vezes não temos noção disso”.
“No meio da zanga e do medo, este tipo de escolhas muito emocionais pode depois ter um desfecho que é rebentarem-nos na cara”, alertou Hugo Gonçalves, recordando uma frase que tinha lido recentemente.
“Gosto muito dela e espero que as pessoas se lembrem disto: ‘É mais fácil ser fascista numa sociedade livre, do que ser livre numa sociedade fascista”.
Além de Guilherme d’Oliveira Martins, o júri desta 27.ª edição do Prémio Literário Fernando Namora foi constituído por José Manuel Mendes, pela Associação Portuguesa de Escritores, Manuel Frias Martins, pela Associação Portuguesa dos Críticos Literários, Maria Carlos Gil Loureiro, pela Direção-Geral do Livro, Arquivos e Bibliotecas, Ana Paula Laborinho, Liberto Cruz e José Carlos de Vasconcelos, convidados a título individual, e por Dinis de Abreu, pela Estoril Sol.