O presidente executivo (CEO) da NOS considera que o 5G é um desafio do “ponto de vista do negócio” e que a expetativa era de que atualmente “já existissem muito mais serviços” potenciados pela tecnologia.
“Hoje, temos o país completamente coberto com 5G, temos a rede mais rápida da Europa de 5G”, no que diz respeito à tecnologia “já atingimos as metas que a União Europeia definiu para 2030, penso que somos o único país”, ou seja, “falta zero vírgula não sei quantos por cento”, diz Miguel Almeida, em entrevista à agência Lusa.
Do ponto de vista da disponibilidade dos serviços e do acesso que os portugueses têm aos serviços de quinta geração, “mais do que recuperamos o atraso, estamos claramente à frente do resto Europa”, salienta.
Não estarei a faltar a verdade se disser que somos claramente líderes no que diz respeito ao 5G”, pois “mesmo números publicados pelas entidades oficiais confirmam”, acrescenta. Portanto, “estamos muito satisfeitos com aquilo que temos vindo a desenvolver”, sublinha o CEO da NOS.
Mas, “do ponto de vista de negócio, é um desafio”, admite. “Acho que temos que ser realistas, transparentes e sinceros, a nossa expetativa era que, neste momento da fase da vida do 5G, já existissem muito mais serviços potenciados pelo 5G, uma adoção desses serviços já com alguma materialidade e a verdade é que isso não acontece”, admite. E tal não acontece em Portugal como também “não acontece em sítio nenhum”.
Na perspetiva dos “serviços específicos potenciados, permitidos pelo 5G, é um bocadinho uma desilusão”, mas do ponto de vista de que “este investimento contribuiu para NOS, estamos muito satisfeitos”, prossegue. Porque isso permite “que os nossos clientes tenham uma experiência muito melhor na utilização dos serviços no que diz respeito àquilo que tinham antes com as tecnologias anteriores e também comparativamente com os nossos concorrentes e isso tem-se materializado no crescimento que nós temos de quota e no crescimento que temos de receitas que vêm desse crescimento de quota”, argumenta.
Na realidade, “o ecossistema que potenciaria isso não se desenvolveu ao ritmo que se acreditava, que toda a gente acreditava, nós também, que se ia desenvolver, o facto de não ter acontecido não quer dizer que não venha a acontecer”, considera Miguel Almeida.
Atualmente, há já desenvolvimento noutros países, nomeadamente na Ásia, “que estão à frente na adoção” do 5G. Mas “estamos a falar de países que, nomeadamente, têm um tecido industrial completamente diferente do nosso e empresas de uma dimensão completamente diferente e estamos sempre a falar de investimentos”, acrescenta.
E, portanto, “o problema, não é português, é um problema europeu – mas Portugal, dada dimensão das empresas e, em particular, no setor industrial, onde o 5G mais potencia, não é um mercado muito significativo”, conclui.
“Basta que políticas de concorrência” permitam empresas europeias competitivas
O presidente executivo (CEO) da NOS defende que “basta que as políticas de concorrência” permitam que as empresas europeias cresçam e se consolidem para que o setor das comunicações possa ser competitivo.
Questionado se é preciso haver uma nova lei europeia das comunicações (‘Telecom Act’) para que o setor volte a ser competitivo, Miguel Almeida refere que “essencialmente” é preciso rever as políticas de concorrência.
A capacidade das empresas europeias crescerem nas comunicações, ganharem em escala, terem capacidade de investimento e de inovação, “está a ser bloqueado pelas políticas de concorrência”, afirma o gestor, referindo que para isso nem é preciso um ‘Telecom Act’.
Basta que as políticas de concorrência, e não é só mais uma vez só o setor das comunicações, mas aqui é crítico, permita que as empresas cresçam, se consolidem e ganhem escala para poderem ser competitivas com os operadores chineses e americanos e coreanos e por aí fora”, salienta.
Miguel Almeida até aponta um exemplo em que a concorrência foi uma barreira: “Em Portugal, o operador que é o terceiro em termos de dimensão e quota de mercado estava num processo de aquisição de uma coisa pequena, que nem sequer 2% de quota de mercado tinha” e a “entidade fundida continuaria a ser número três, portanto não há aqui concentração sob nenhuma perspetiva de análise de outros mercados”.
E o que é que a Concorrência fez em Portugal? “Chumbou a operação”, mas “isto é o que tem acontecido um pouco por toda a Europa”, embora menos agora, com Espanha a tentar corrigir.
Questionado sobre se a consolidação é inevitável para ganhar escala, remata: “Claro que é, mas (…) os reguladores nacionais e europeus não perceberam isso, porque mais uma vez estamos a privilegiar” a variável concorrência e, assim, a pôr em causa a competitividade das economias, sejam do país como da Europa.
No caso das comunicações, os retornos de capital das empresas europeias “são baixíssimos, abaixo do custo de capital”, algo que é “absolutamente transversal na Europa”, mas “não é verdade nos outros países” fora do bloco europeu, aponta.
A sustentabilidade e competitividade das telecomunicações constam tanto do relatório Letta, do antigo primeiro-ministro italiano Enrico Letta, divulgado em abril, como do relatório Draghi, elaborado pelo ex-presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi.
“A Europa foi inovadora e foi líder nas tecnologias anteriores e tem um atraso considerável no que diz respeito ao 5G. Isso é consequência de uma política que privilegiou o curto prazo e sacrificou o longo prazo e as coisas podem demorar algum tempo a perceber-se os resultados, mas eles chegam”, prossegue Miguel Almeida.
Esta política europeia, “que tem origem na primeira década deste século fez que, quando chegou o ciclo de investimento 5G, basicamente a maior parte dos países, ainda bem que não é o caso da NOS, mas mesmo Portugal temos exemplos, os operadores” não tivessem “capacidade de investimento”.
Porquê? “Porque existem operadores a mais em cada um dos mercados”, aponta, referindo que nos Estados Unidos há “três operadores”, um país que é “praticamente o tamanho da Europa toda” refere.
Na China, “há três operadores e, pasme-se, em Portugal há quem achasse (…) e quem criou as condições para isso que deveriam existir seis. Isso provavelmente terá consequências de curto prazo que, do ponto de vista populista, as pessoas vão apreciar, tem consequências dramáticas a médio/longo prazo, porque quando chegar o 6G, garantidamente, e isso posso garantir com toda a certeza (…) que não haverá capacidade de investimento”, enfatiza, e de líder o país poderá passar para a cauda.
“É pena” porque atualmente, em infraestrutura digital, Portugal “é líder na Europa e praticamente atingiu em 2023 os objetivos que a União Europeia fixou para 2030”, e isso não é verdade para a maior parte dos outros países.
Agora, “quando chegar os objetivos para 2040 ou 2035, vamos estar na cauda da Europa. E a Europa como um todo ou inverte caminho – e isso de alguma forma está a acontecer de forma tímida -“, segundo as recomendações de Draghi, “ou se não atuar, se mantiver o ‘status quo’, vai-se atrasar ainda mais em relação aos blocos asiático e americano” e “não é só nas telecomunicações, infelizmente”, alerta.
Já temos um atraso considerável no 5G. Se não criamos as condições de concorrência e para o investimento na Europa em geral, em Portugal em particular, esse atraso vai-se acumular e (…), provavelmente vai pôr em causa a competitividade (…) da economia europeia porque sejamos realistas, a economia do futuro passa pelo digital”, insiste Miguel Almeida.
“Sem infraestruturas digitais modernas (…) não há transição digital, não há competitividade económica e é isso que estamos a condenar a Europa e Portugal, ainda mais que a Europa”, adverte. Agora, “tudo isto é reversível ainda? É, mas é preciso ação”, remata o presidente executivo da NOS.
Regulação europeia sobre o digital “é claramente a mais restritiva do mundo”
O presidente executivo (CEO) da NOS considera, em declarações à Lusa, que a regulação europeia do digital “é claramente a mais restritiva do mundo” e que a transposição da diretiva sobre cibersegurança “impõe uma carga terrível adicional” para as empresas.
“A Europa não tem nenhuma empresa com dimensão, com relevância, com impacto na inteligência artificial [IA]. No entanto, fomos os primeiros a regular”, começa por dizer Miguel Almeida, quando questionado sobre o tema. Em suma, “somos muito rápidos a regular, mas não sei muito bem o que é que estamos a regular”, afirma.
Até porque “a regulação sobre o digital da Europa é claramente a mais restritiva do mundo e nós não temos empresas de dimensão na esfera digital, incluindo na inteligência artificial. Porque é que será”, questiona o gestor. Não é “certamente” por incapacidade ou falta de empreendedorismo dos europeus, “porque muitas das empresas, nomeadamente nos Estados Unidos”, até são europeias, acrescenta.
Agora, “enquanto a Europa achar que deve regular, em vez de estimular o crescimento, nomeadamente nas novas tecnologias, que são decisivas para a competitividade das economias do futuro, qual é a nossa preocupação enquanto europeus? Regular”, reforça.
Ou seja, “já temos uma regulação para a inteligência artificial, não temos a inteligência artificial”, prossegue. Tal afeta “essencialmente as empresas que fazem o desenvolvimento dos modelos” de IA, mas “não existem empresas na Europa, nem existirão com este tipo de regulação no que diz respeito à adoção por parte das empresas de todos os setores”, diz.