O novo diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal disse, esta segunda-feira, que ninguém “está imune” à justiça, “por mais importante que julgue o seu privilégio”, e que respeitar a separação de poderes é “aplicar a lei a todos”.
No discurso de tomada de posse, que decorreu, esta segunda-feira, na Procuradoria-Geral da República, o novo líder do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), Rui Cardoso, disse que “a sempre inacabada construção de um verdadeiro Estado de Direito também passa pela justiça criminal”, protegendo os direitos fundamentais de todos, “mas assegurando que ninguém a ela está imune, por mais importante que julgue o seu privilégio”.
“Não nos cabe fazer a lei, apenas aplicá-la. Respeitar a separação de poderes é, sem temer ou sequer hesitar, aplicar a lei a todos: também aos que as aprovam, também aos que a aplicam. Não é violar a lei, deixando de a aplicar àqueles que, de forma mais assumida ou mais dissimulada, querem controlar a justiça para continuar acima dela; àqueles que não gostam que a justiça recuse ser instrumental e submissa à política, à economia, à finança; àqueles que julgam que o voto popular tudo legitima e tudo amnistia”, disse Rui Cardoso.
O procurador-geral adjunto que agora lidera o DCIAP defendeu que neste propósito “não deve haver qualquer temerária coragem, mas antes convicção” e que “não se trata de missão, mas de obrigação”, imposta pela Constituição e que o Ministério Público assume “com convicção e tranquilidade”.
“Não é justicialismo, é só Justiça”, disse o diretor do DCIAP.
Rui Cardoso afirmou que a legitimidade dos procuradores decorre da lei e da Constituição, “não depende do voto, de ter de agradar a maiorias impotentes ou minorias poderosas”, mas advém também do exercício de funções e “como isso gera ou não gera confiança em todos e cada um dos cidadãos”, apelando a que se faça melhor e se comunique melhor, “de forma atempada e clara”.
“Não devemos ser escravos das perceções públicas, mas não as podemos ignorar. Quem não conhece e não compreende não pode confiar. E nós devemos querer que em nós confiem. E para isso é importante que conheçam o que fazemos, como fazemos e porque fazemos; que tenham a certeza de que para nós cada caso é único, que cada decisão é ponderada, que é aquela que julgamos a correta. Mas também que podemos errar”, disse.
Rui Cardoso apelou ainda a uma utilização mais eficiente “dos meios e do tempo”, afirmando que o Ministério Público deve “ambicionar a celeridade, sem nunca prejudicar a qualidade”, e pediu uma atualização dos meios informáticos ao dispor dos procuradores, sublinhando que “em tempos de vulgarização da utilização da inteligência artificial” os magistrados não podem “continuar amarrados a programas obsoletos, que não estão ao seu serviço, antes exigem o seu esforço, desnecessário e muitas vezes estéril”, acrescentando que “é tempo de mudar”.
Afirmou ainda que o DCIAP “nunca temerá prestar contas pelo resultado do seu trabalho, desde que o trabalho seja efetivamente seu”, enfatizando que o departamento “não poderá ser responsabilizado pelo que não domina, pelo que na verdade está no controlo de outros: outros órgãos do Estado, outros Estados”.
Na sua intervenção na cerimónia, o procurador-geral da República, Amadeu Guerra, criticou também um método de funcionamento do DCIAP que “não é compaginável com os tempos atuais”, referindo-se à necessidade de ainda introduzir manualmente no sistema informático as comunicações recebidas relativas a situações de branqueamento, “mais de 18.000 em 2023”, “um dispêndio enorme de recursos humanos, que podem ser afetos a tarefas de investigação”.
Amadeu Guerra referiu ainda estudos em curso para aprovar “uma estratégia do Ministério Público em relação à recuperação de ativos, devendo assumir o DCIAP um papel de liderança” e apelou a uma compatibilização da “celeridade dos inquéritos mais recentes e prioritários com a elaboração de despacho final nos inquéritos mais antigos”, considerando fundamental “enunciar as razões determinantes dos atrasos” dos inquéritos para ultrapassar dificuldades com “uma atuação pragmática e decisiva do diretor do DCIAP”.
Ao antecessor de Rui Cardoso, o procurador-geral adjunto Francisco Narciso, que irá agora exercer funções no Tribunal Constitucional, e em relação a quem o procurador-geral disse nada ter “a apontar à sua qualidade e experiência profissionais, à sua competência e à sua dedicação ao serviço público”, Amadeu Guerra agradeceu ter colocado o lugar à disposição: “(…) demonstra que estava ciente de que, com este gesto simples, pretendia facilitar a minha opção em relação à direção deste departamento”.
Rui Cardoso é o novo diretor do DCIAP. Francisco Narciso demitiu-se