O presidente da direção da Madeira do Sindicato dos Jornalistas afirmou, esta quarta-feira, no parlamento regional que as autoridades barraram o acesso da comunicação social em alguns locais durante o incêndio de agosto e que houve “falta de transparência”.
“Em nosso entender, nestes últimos incêndios houve falta de transparência e, em alguns casos, impedimentos à cobertura daquilo que estava a acontecer no terreno. Ainda não conseguimos perceber o porquê”, disse Filipe Alexandre Gonçalves.
O dirigente, que é jornalista da RTP/Madeira e cobriu o incêndio de grandes dimensões que lavrou na região entre os dias 14 e 26 de agosto, sublinhou que “quem andava a fazer cobertura dos incêndios, junto das zonas mais afetadas, falava em duas realidades: a que era dita nas conferências de imprensa e a que realmente estava a acontecer no terreno”.
O presidente da direção regional do Sindicato dos Jornalistas falava na comissão de inquérito de apuramento de responsabilidades políticas no combate ao fogo rural de agosto, numa audição que decorreu no hemiciclo da Assembleia Legislativa da Madeira.
“Em nosso entender, no decorrer dos incêndios, alguns governantes olharam para os jornalistas como um entrave e não como um elemento de extrema importância para informar e esclarecer a população”, afirmou numa declaração inicial, vincando que “esta mentalidade tem de ser alterada”.
O sindicalista disse que os casos mais relevantes ocorreram na freguesia do Curral das Freiras, a partir do dia 17 de agosto, onde o acesso dos jornalistas aos locais mais problemáticos foi barrado pela PSP, simplesmente com indicação de que estava a “cumprir ordens”.
“A situação agudizou-se quando [em 21 de agosto] um órgão de comunicação social regional — o Diário de Notícias da Madeira — avança com uma notícia sobre a vinda dos [aviões] Canadair para auxiliar o combate aos fogos. Pouco depois é desmentida por uma fonte do governo regional, mas aquilo que era mentira poucas horas depois acabou por ser confirmado pelo próprio presidente do governo regional”, disse, considerando esta como uma prova clara da falta de transparência na comunicação.
Filipe Alexandre Gonçalves, que foi ouvido no parlamento a pedido do PS, admitiu que possa ter havido “excesso de zelo” das autoridades, mas sublinhou que houve também falhas na gestão da comunicação e tentativas de controlar a informação.
Em 29 de outubro, o secretário regional da Saúde e Proteção Civil, Pedro Ramos, afirmou na mesma comissão de inquérito que não houve qualquer indicação do governo regional (PSD) nem da Proteção Civil para impedir os jornalistas de aceder aos locais onde o fogo lavrava, contradizendo a denúncia feita já na altura pela direção da Madeira do Sindicato dos Jornalistas.
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A comissão de inquérito de apuramento de responsabilidades políticas no combate aos incêndios ocorridos entre o dia 14 e o dia 26 de agosto foi requerida pelo PS e integra deputados dos sete partidos com representação parlamentar — PSD, PS, JPP, Chega, CDS-PP, IL e PAN —, sendo presidida pela deputada socialista Sancha Campanella.
O incêndio rural deflagrou na ilha da Madeira em 14 de agosto, nas serras do município da Ribeira Brava, propagando-se progressivamente aos concelhos de Câmara de Lobos, Ponta do Sol e Santana. Ao fim de 13 dias, a Proteção Civil regional indicou que o fogo estava “totalmente extinto”.
Dados do Sistema Europeu de Informação sobre Incêndios Florestais apontam para mais de 5.104 hectares de área ardida, embora as autoridades regionais tenham sinalizado 5.116, dos quais 139 de floresta laurissilva, classificada como património natural da humanidade.
Segundo o executivo madeirense, não houve registo de feridos ou destruição de casas e infraestruturas públicas essenciais, mas os estragos ao nível da agricultura, da pecuária e da apicultura afetaram cerca de 200 produtores. Por outro lado, 120 moradores da Fajã das Galinhas, no concelho de Câmara de Lobos, foram retirados do local e continuam impedidos de regressar.