José Sócrates diz ser alvo de uma “campanha mediática e do sistema judiciário” no processo Operação Marquês, recusando ter praticado quaisquer manobras dilatórias para protelar a tramitação dos autos.

“A campanha tem muitos meses. A campanha de uma parte do sistema judiciário segundo a qual sou responsável por atrasos na Operação Marquês é anterior a isto. O direito de recurso é uma garantia constitucional. A verdade é que o processo de inquérito demorou quatro anos. Fui preso e a acusação só foi apresentada três anos depois. Esses quatro anos são da responsabilidade do Ministério Público. Depois, a instrução demorou três anos e a responsabilidade é aí do tribunal. Depois, houve um conflito de competências entre juízes… Nove dos 10 anos são da inteira responsabilidade do estado judiciário. É absolutamente falso o discurso das manobras dilatórias”, afirmou o antigo primeiro-ministro, em entrevista à CNN, no dia em que se cumprem 10 anos da sua detenção no aeroporto de Lisboa, sem que o julgamento do processo Operação Marquês tenha ainda começado.

José Sócrates tem de pagar já mais de 24 mil euros de custas judiciais da Operação Marquês

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Apesar da enorme litigância neste processo, no qual já apresentou perto de 40 recursos, reclamações e incidentes de recusa, Sócrates contrapôs que “só um” recurso teve efeito suspensivo. Confrontado com a acusação do “carrossel de recursos” que consta no Tribunal da Relação de Lisboa, o ex-governante disse que o juiz deve ter “mais paciência com as pessoas que discordam dele”. “Não lhe compete estar a fazer processos de intenções relativamente às ações dos intervenientes processuais e muito menos maltratá-los publicamente”, criticou.

Uma “conspiração” contra o PS e as hipóteses presidenciais

Considerando que já foi “a uma fase de pré-julgamento”, que já foi ilibado na instrução do processo em 2021 e que todas as acusações “são falsas e injustas”, José Sócrates rebateu ainda que tenha de pagar já cerca de 24 mil euros em custas judiciais na Operação Marquês. “Não admito nada, isso é ridículo. Agora teria de pagar antes? Isso é uma maluquice total”, atirou.

O ex-primeiro-ministro sustentou que o Estado português já promoveu “três acusações” contra si neste processo ao longo da última década e defendeu que a acusação da Operação Marquês “sofre metamorfoses consoante as circunstâncias”. “Não é possível, isto viola todas as normas de direito”, frisou Sócrates, que apontou ainda “a vigarice da escolha do juiz” na fase de inquérito e uma suposta invenção do perigo de fuga para a sua detenção.

Como a Relação de Lisboa usou o número mágico 670 para forçar o julgamento da Operação Marquês

“Fizeram buscas, abusos, toda a violência foi usada contra mim”, disse Sócrates, que considerou existir uma conspiração contra o PS e as suas eventuais aspirações a uma candidatura à Presidência da República.

“Eu não pretendia ser, mas eles – a direita – achavam que eu quereria ser candidato. Foi uma conspiração contra o PS e para me impedir de ser candidato à Presidência da República. O anterior Presidente da República [Cavaco Silva] já tinha promovido uma conspiração contra mim, de que eu estaria a escutar a Presidência”, referiu.

Críticas ao PGR e um suposto fim iminente de funções

O atual Procurador-Geral da República (PGR) esteve também na mira das críticas de José Sócrates, que lembrou que a sua detenção teve lugar quando Amadeu Guerra dirigia o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP). “Não tenho esperança nenhuma. No dia 14 de novembro de 2014, o meu advogado ligou a este PGR, explicando que eu estava em Paris e que íamos imediatamente regressar a Lisboa e que eu estaria disponível para responder a qualquer interrogatório, que certamente se tratava de algum equívoco. Esse procurador veio dizer que só recebeu o email do meu advogado João Araújo três dias depois da minha detenção”, indicou.

Sócrates acusou ainda os sistemas mediático, judicial e político de quererem “esconder” que Amadeu Guerra terá de cessar funções quando completar 70 anos. “Que é daqui a pouco tempo, porque está escrito na lei. É só fazer umas consultas no Google… A lei diz que qualquer procurador cessa funções aos 70 anos”, referiu, apesar de o Governo já ter defendido após a sua nomeação que a limitação de idade para a liderança da Procuradoria-Geral da República é “uma falsa questão”.

Operação Marquês deixou de ser urgente, incidentes processuais sucedem-se e início de julgamento de Sócrates continua sem data

O ex-governante viu o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) colocar na quarta-feira um travão no “carrossel de recursos” no processo, com a rejeição de mais uma reclamação apresentada pela sua defesa. Os juízes desembargadores decidiram aplicar o artigo 670.º do Código de Processo Civil contra manobras dilatórias, forçando o início do julgamento do ex-primeiro-ministro e dos restantes arguidos da Operação Marquês pela prática de 118 crimes — pelos quais foram pronunciados a 25 de janeiro deste ano pela 9.ª Secção da Relação de Lisboa.