O presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, em Lisboa, exigiu esta terça-feira a demissão do diretor municipal do Património, avisando que o país já não está no Estado Novo, nem em tempos de tutelas políticas totalitárias.
“Não há mais relações com este diretor municipal do Património e exijo mesmo a sua demissão deste cargo que tem”, afirmou o presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, Miguel Coelho (PS), referindo-se à rescisão de um contrato comodato celebrado com a Câmara de Lisboa para a cedência de um edifício municipal na Rua Vítor Cordon.
O autarca de Santa Maria Maior falava no início da reunião da Assembleia Municipal de Lisboa, ressalvando que a sua intervenção só o compromete a si e não ao grupo municipal do PS.
Em causa está o anúncio, na quarta-feira, do presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas (PSD), relativamente à solução encontrada para acolher a Academia de Amadores de Música, nomeadamente um edifício municipal na zona do Chiado, concretamente na Rua Vítor Cordon, onde a Junta de Freguesia de Santa Maria Maior tem um espaço de arquivo.
De acordo com Miguel Coelho, a Junta de Freguesia de Santa Maria Maior recebeu, cerca das 16 horas de quarta-feira, um e-mail assinado pelo diretor municipal do Património, Bernardo Alabaça, em que “rescindia o contrato comodato com uma das instalações da junta de freguesia que lhe foram outorgadas no ato solene de constituição da nova freguesia de Santa Maria Maior”, no âmbito da reforma administrativa de Lisboa de 2012.
“Às 18 horas, fiquei surpreendido com uma intervenção do senhor presidente da câmara, numa reunião pública, em que afirmou ter resolvido a dificuldade, o problema da Academia de Amadores de Música, entregando-lhe as instalações da junta de freguesia no Chiado e contando com a boa vontade do senhor presidente da junta para que isto fosse possível”, relatou o autarca.
Antes disso, o presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior não tinha recebido qualquer informação da Câmara de Lisboa sobre o assunto, nem houve “uma única abordagem” sobre essa possibilidade, interpretando isso como “um ato desrespeitoso para com um outro órgão autárquico”, sem ter em devida conta as relações institucionais.
Miguel Coelho disse ainda que a nota de rescisão de contrato e de anúncio de despejo, com o prazo de três meses para a junta sair deste espaço municipal, e que é assinada pelo diretor municipal do Património “é completamente desrespeitosa da autonomia jurídica política das juntas de freguesia e permite-se fazer considerações como as juntas gerem ou não gerem o património”.
A nota do diretor municipal do Património, no entender do autarca de Santa Maria Maior, não teve em consideração que as juntas têm a mesma legitimidade que a própria câmara municipal tem, porque ambos os órgãos autárquicos foram eleitos democraticamente pelo povo.
O autarca defendeu que juridicamente o diretor municipal do Património “não tem razão nenhuma”, porque estes edifícios foram transferidos para a junta no âmbito do exercício das suas competências e, portanto, nesta perspetiva, “a junta de freguesia, desde que não transforme aquele espaço num espaço comercial ou numa outra coisa qualquer, dá utilidade aos seus edifícios da forma que entender”.
No edifício municipal na Rua Vítor Cordon, a Junta de Freguesia de Santa Maria Maior tem um arquivo histórico, com um espólio de 12 antigas freguesias de Lisboa e com tramitação relacionada com o Estado Novo, inclusive a listagem de todos os colaboradores da Legião Portuguesa e da Polícia Internacional de Defesa do Estado.
“Temos ali documentos históricos num valor incalculável e temos também um arquivo vivo da junta de freguesia”, disse Miguel Coelho, referindo que a autarquia tem também conservados os documentos contabilísticos, que é uma obrigação legal, inclusive já teve uma inspeção do Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
O socialista salientou que não está em causa o problema subjacente à Academia de Amadores de Música, revelando que, depois deste incidente, já teve a oportunidade de transmitir pessoalmente ao presidente da câmara que estava disponível para “uma conversa séria” sobre como a junta pode ajudar a ser parte da solução.
“O que está em causa é um desrespeito para com o órgão autárquico eleito, que tem os seus poderes reconhecidos […], nem a junta manda na câmara, nem a câmara manda na junta. […] Já não estamos no Estado Novo, nem em tempos de tutelas políticas totalitárias, portanto, não posso aceitar isso”, declarou Miguel Coelho relativamente à comunicação do diretor municipal do Património.
Presidentes socialistas de juntas de Lisboa surpresos e preocupados com “intimação” da Câmara