Ainda faltavam duas horas mas já estavam dezenas e dezenas de adeptos na Praça do Município. Cantavam, tiravam fotografias, davam entrevistas e posicionavam-se o mais à frente possível junto ao gradeamento montado no espaço. Para não variar, havia uma figura vestida de Papa. A uma segunda-feira à tarde onde quando o sol abria até estava calor, ir para ali tanto tempo é mesmo uma questão de fé. A mesma fé no pentacampeonato – o léxico de sábado passou à história, o tetra está feito e deve-se olhar em frente. “E daqui a dois anos é o hexa”, garantiu um adepto. “Com este colinho, que são os adeptos e toda esta massa, tudo é possível para o Benfica”, rematou.

Alguns admitiam que tinham faltado ao trabalho para estar ali. Outros diziam que já estão reformados… mas que se ainda estivessem no ativo iam faltar na mesma. Como uma senhora de idade que esteve três dias em Fátima, arrumou a mala e já marcou presença esta tarde junto à Câmara Municipal de Lisboa. Ali bem ao lado estava um senhor com quatro terços ao pescoço, um por cada Campeonato ganho pelo Benfica. De quando em vez, o grande ecrã que estava na entrada passava uns vídeos. Aí, as pessoas calavam-se. Se houvesse um golo, celebravam como se estivessem no estádio. Depois, acabavam as imagens e lá se iam afinando as gargantas. “O Benfica não cansa. E dia 28 há mais”, dizia-se, em alusão à final da Taça de Portugal, com o V. Guimarães.

Não estavam tantas pessoas como no ano passado a essa hora. Nunca é fácil contabilizar o número exato de presentes, conseguimos apenas ir pelas referências que a Praça do Município tem. Mas eram muitas. E a verdade é que, num ápice, a Praça do Município encheu. O autocarro, esse, acabou por sair depois da hora que tinha sido falada, faltavam 20 minutos para as 18 horas. E, do nada, parecia que estávamos no Cairo em plena hora de ponta.

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(Um parêntesis para explicar o que significa isso. Em 2006, quando o Egito organizou a Taça das Nações Africanas, todos os dias nos deparávamos com o cenário dantesco de tráfego enorme e com uma particularidade: quando um carro passava por outro, dava um toquezito pequeno na buzina. Multiplicando isso por milhares de viaturas numa estrada com quatro ou cinco faixas, é fazer as contas ao Festival da buzinadela que se podia ouvir diariamente…).

Muitas motas acompanhavam o autocarro que transportou os tetracampeões até à Câmara. E nas ruas, nas paragens de autocarro e nas janelas, lá se iam vendo cachecóis, camisolas e bandeiras do Benfica. À falta de melhor, havia o simples aceno – tudo servia para dar os parabéns aos jogadores encarnados.

A partir da Avenida da República, aumentou o trânsito, aumentaram as pessoas. Quando se deu a viragem rumo à Praça do Município, multiplicou-se a loucura: acenderam-se tochas, levantaram-se bandeiras gigantes (uma que tem estado sempre presente, com a imagem de Féher, estava em primeiro plano). Estavam milhares e milhares de adeptos no espaço à hora da chegada, pelas 18h20.

Sem tempo para grandes demoras, começou por fazer-se logo as fotografias da praxe na escadaria do edifício com o presidente da Câmara e demais autarcas. Seguiu-se a viagem para o Salão Nobre. A ferver, de calor e entusiasmo. A começar por José Sá Fernandes, conhecido adepto do Benfica que se apresentou eufórico de cachecol ao pescoço. Fernando Medina, edil lisboeta, fez o primeiro discurso.

“Luís Filipe Vieira, Rui Vitória e Luisão, no vosso nome, saúdo toda a direção, equipa técnica e plantel. E todos os adeptos que estiveram na Luz e em todos os campos. Parabéns! Os benfiquistas pediram e a equipa deu-lhes mesmo o 36. Como se escuta no cânticos dos adeptos, o campeão voltou. É pela primeira vez tetracampeão. Várias vezes esteve perto mas só agora superou. É uma conquista histórica, assente na liderança, na organização e que é o espelho da ambição de Lisboa“, comentou Medina, que recordou os seis tetracampeões… juntando a eles Paulo Lopes: o guarda-redes não jogou em 2014/15, mas entrou no lote com Luisão, Jardel, André Almeida,Fejsa e Salvio.

Esta é a vitória da organização e do planeamento. Só é possível [ganhar] quatro vezes se, antes do talento e acima da inspiração, esteja um trabalho metódico e persistente de toda uma organização. A recuperação do Benfica é notável e não se esgota na realização desportiva e no sucesso empresarial, reflete-se na inovação, no ecletismo e na ação social. O Benfica é um clube do Mundo mas é antes demais um clube de Lisboa. Tem o nome da cidade e é um dos nossos grandes orgulhos”, destacou Fernando Medina

“Permitam-me que distinga o capitão Luisão.”, continuou o presidente da Câmara de Lisboa, “No mundo do futebol, onde os jogadores mudam facilmente de camisola, a sua ligação e amor ao emblema prova que se pode conjugar o futebol moderno com o reforço da identidade dos clubes. Mística é isso. Foi uma época inesquecível deste capitão”, concluiu o edil.

“Como ele dizia, nenhuma imagem exprime melhor o Benfica do a águia no seu emblema. Está pousa, como se tivesse chegado à instantes de um longo passado de orgulho, mas já tem as asas abertas porque se prepara para novos e futuros empreendimentos”, concluiu, antes de dar a palavra a Luís Filipe Vieira.

O líder benfiquista começou por agradecer a “receção e as calorosas palavras” de Fernando Medina. “Cá estamos nós a cumprir uma boa tradição, após mais um Campeonato. Reflete a atenção da autarquia pelos clubes da cidade de Lisboa. Não é um campeonato qualquer, é um histórico tetra. A verdade é que futebol e desporto são fundamentais nas cidades e na sociedade. É bom ver a ambição de Lisboa ser «Capital Europeia do Desporto» em 2021. O Benfica, como clube da cidade e do mundo, procura contribuir para essa ambição”, afirmou Vieira.

Foi a vitória de um projeto, de um rumo, de quem olha sobretudo para dentro de si. De quem trabalha todos os dias no que temos de melhorar e a crescer dentro do próprio Benfica e a partir daí procurar as vitórias e as conquistas que honrem a nossa história. O Benfica nasceu grande, cresceu grande e afirma-se cada vez mais”, salientou Luís Filipe Vieira

Fazemos história com memória, com presente e com os olhos no futuro. O Benfica é uma força da natureza. Foi bonita, impressionante, a festa em Lisboa e todo o mundo. Pela alegria e cor que torna o Benfica uma referência global. Quero elogiar todos os nosso adversários pela exigência que colocaram ao longo do Campeonato. O tetra fica-nos bem. Resulta do trabalho profissional mais regular, competente e discreto para construir um ambiente de afirmação no futebol português“, rematou.

Antes da viagem até à varanda, para exibir o troféu aos milhares de adeptos presentes, houve lugar à habitual troca de prendas, com o Benfica a deixar uma camisola assinada por todos os jogadores e uma placa comemorativa do tetra, ao passo que os elementos encarnados a receberem um pequeno Santo António vermelho. À exceção de Eliseu, que teve direito a uma prenda especial: uma vespa em miniatura, como forma de recordar o espetáculo que deu na noite do tetracampeonato. E lá seguiram de novo para o autocarro, fazendo a viagem para o jantar de comemoração do clube. Cedinho, claro. Afinal, a época ainda não está terminada. E, em caso de vitória no Jamor, deverá haver nova deslocação aos Paços do Concelho.